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Perfil exigível do próximo Presidente de Câmara

Esser Jorge Silva
Opinião \ segunda-feira, abril 29, 2024
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O presidente de Câmara tem de ser culto e possuir qualidades de “banda larga” na vontade de descoberta e ser curioso pelo conhecimento. Deve querer saber muito mais do aparentemente útil.

Um perfil de um presidente de uma Câmara, como a de Guimarães, exige algo mais do que requere a maior parte dos municípios portugueses. À exceção dos concelhos das áreas metropolitanas de Lisboa e Porto, Guimarães é o segundo concelho em Portugal medido pela população, logo atrás de Braga. Além das idiossincrasias históricas, há a considerar uma série de arquétipos instalados na malha mental vimaranense que prefiguram obrigações e exigências especiais que nem todos possuem. O arquétipo da primogenia, por exemplo, exige qualidades de primeira, na medida em que a terra merece sempre o melhor e nunca um segundo, ou terceiro, tornado primeiro por inconfessáveis interesses das oligarquias partidárias. Guimarães paga hoje caro não ter observado esse quesito no passado recente.

Esse primus inter pares deve possuir certas qualidades que o distingam. Além de tecnicamente preparado tem, obrigatoriamente, de conhecer o território nas suas dimensões totais: histórica, económica, social, geográfica, arquitetónica e biológica. Não basta, por isso, ter um curso que faça da pessoa especialista em algo. O presidente de Câmara tem de ser culto e possuir qualidades de “banda larga” na vontade de descoberta e ser curioso pelo conhecimento. Deve querer saber muito mais do aparentemente útil. Tem que ter projeto ambicioso e arte para dar expressão prática à ambição sem prejudicar o futuro. Obriga-se a oferecer o surpreendente, o distinto e o peculiar, de modo a valorizar a terra com a sua ação ao ponto de deixar saudades com a sua partida. Tem de ser performativo: saber usar a oratória para animar e a retórica para agregar.

Não se pode ser presidente de Câmara sem se ter as qualidades psicopolíticas para tal. Estar possuído pela Eleutéria, essa divindade da liberdade, é condição primordial. É certo que, tecnicamente, todos podem ser candidatos, mas desengane-se lá a ideia que qualquer cidadão serve para o ofício. Um ignorante está fora de hipótese. Um simplório também não serve. Um humilde, ainda que boa pessoa, não pode. Um tacticista está preso à sua tática cujos propósitos são particulares e nunca gerais. Um “interesseiro” está apenas interessado nos seus interesses. Um falso esconde os seus intentos. Um vaidoso quer afirma-se e, em certas situações, dar certificação à vida aldrabona granjeada às escondidas, que fez de si uma pessoa rica em dinheiro e pobre em valores. Um bom perfil de edil orienta a pessoa para a verdade, seja ela qual for, doa a quem doer, ainda que seja ao próprio.

O exigível é que um candidato não resulte de uma OPA hostil a um partido, ainda que o partido se ponha a jeito. Um presidente de Câmara não pode ser o resultado da junção de caciques e clientes à volta de um patrão sustentado por filiados “fichistas”, um saco de gatos, cuja “vontade” militante foi comprada por quem lhes pagará as quotas em troca de um emprego para o filho ou a esposa, ou lhe forneceu um serviço público gratuito através de uma instituição municipal, manifestos atos de corrupção a que, infelizmente, não têm merecido a atenção da justiça. Um perfil desses resulta num “patrimonialista”, ou seja, alguém fará do lugar de presidente o de proprietário do concelho. Um bom perfil de presidente de Câmara carrega o traço de empenho desinteressado. Na Antiga Grécia, dizia-se que uma pessoa assim era possuída pela parrésia. Apresenta vida pública dedicada e vida privada clara e conhecida. Límpida! Ama a terra com os suas virtudes e defeitos e luta contra aquele destino que parece ineludível. Oferece não só esperança como faz aparecer soluções. Vê longe e apresenta-se como um farol, projetando o “dom da graça”, essa santidade também conhecida por “carisma”. Acima de tudo, um bom perfil para presidente da Câmara não depende de esquemas de vida ocultos.

Há sempre que ter cuidado com os atores da bondade. É bem verdade que as aparências iludem. As falsidades impõem-se com subtileza, dominam com sorrisos e circulam possuídos pelo mito de Narciso; mostrando-se sempre apaixonados pela sua imagem na qual vão-se afogar, seguramente. Candidatos cuja riqueza não tem proveniência são de desconfiar. Principalmente aqueles que desprezam os ganhos do seu trabalho, oferecendo-o a velhinhos e às instituições porque afirmam não necessitar do rendimento associado. Esses candidatos, geralmente tidos como ricos, sem se saber de onde lhes vem a riqueza, vão, a qualquer momento, ser detidos à saída de um avião para explicar à justiça qual a razão porque pagam, sempre, maquias altas em dinheiro vivo. Cash! El contado!

Por isso, a primeira coisa a perguntar é se determinada pessoa tem condições pessoais para ser candidato. Se alguma vez usou cargos em organizações paramunicipais para corromper, a troco de promessas de votos em seu nome no partido.  Se tal atenção não for tomada, corre-se sempre o risco de se ver um proxeneta, alguém que vive, direta ou indiretamente, dos proventos da prostituição, a candidato a uma Câmara Municipal. Guimarães não corre esse risco. Felizmente ainda há quem o não permita.

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