O Campelos, símbolo de uma comunidade operária e “bairrista”, faz 70 anos
Numa divisão revestida a troféus, retratos dos vários presidentes e símbolos do Clube Operário de Campelos, nas bandeiras, nas paredes, nas cadeiras, sobressai uma inscrição que destaca o bairrismo daquele emblema com 70 anos. Alicerçado na comunidade que se ergueu em redor da antiga Companhia de Fiação e Tecidos de Guimarães, fundada em 1890 por James Lickfold, com muitos trabalhadores oriundos de Cabeceiras de Basto, Celorico de Basto, Felgueiras e, sobretudo, Fafe, o clube extravasa as fronteiras do lugar e atrai gente de comunidades vizinhas, realça o antigo presidente, José Pimenta.
“Temos um leque de associados não só de Campelos. Temos gente de fora que gosta do Campelos pelo bairrismo que sempre houve. Temos gente de Pevidém e de Ronfe. Havia um senhor de Mogege, que não sei se ainda está vivo. Depois da pandemia, nunca mais o vi. Vinha ver todos os jogos em casa e fora. Veio uma vez ver o Campelos, começou a falar com as pessoas, ficou a gostar e entrou para sócio”, vinca ao Jornal de Guimarães aquele que foi o responsável máximo do emblema preto e branco entre 1983 e 1985, e entre 2014 e 2021.
A ligação à fábrica, desde 1973 sob a administração da Têxtil Manuel Gonçalves, continua a alimentar um universo associativo de 415 sócios, atesta o presidente em exercício, Cristiano Silva. “Tenho colegas de direção que trabalham na Têxtil Manuel Gonçalves que falam disso a outros colegas, de Fafe, por exemplo, que entram para sócios do Campelos, só para verem os jogos. Gostam do bairrismo que está incutido nos jogos e nos adeptos”, diz, por sua vez.
O dia a dia daquela comunidade da freguesia de Ponte, com a ponte romana e o rio Ave ao pé, ganhou uma nova dimensão a 01 de março de 1953: a do desporto, com a fundação do Clube Operário de Campelos. “Em 1953, o meu pai colocou-me logo a sócio. Pagava 25 tostões. Era cinco coroas [de escudo]”, recorda José Pimenta. É precisamente essa efeméride que o clube da 1.ª Divisão da Associação de Futebol de Braga decidiu assinalar no sábado, com o hastear da bandeira na sede – antiga escola primária -, um jogo de velhas guardas no Campo José Maria Machado Vaz, uma eucaristia e um jantar.
A sede, na antiga escola primária de Campelos, e o campo onde se vivem as emoções da bola – antigamente pelado, desde 2020 relvado sintético – são os repositórios da memória da filial número dois do Vitória Sport Clube, cujos primeiros jogos se desenrolaram num “campo de milho lavrado, com balizas” onde hoje é o parque industrial de Ponte, em “jogos populares”, antes de se mudar para o campo que hoje detém – à altura o Campo de São José – na então quinta do Miogo, em Vila Nova de Sande, propriedade da família Jordão. Então com 12 anos, José Pimenta ainda se recorda da inauguração, a 07 de setembro de 1958. “Houve uma avioneta no dia da inauguração. Deu duas voltas por cima do campo e largou a bola no meio. O campo estava a abarrotar”, descreve.
A partir desse recinto, o clube operário projetou-se para a década de 60, com “grandes equipas” onde pontificaram nomes como Sebastião, antigo guarda-redes de Estoril, Benfica e Vitória, internacional português por uma vez, ou Silva, outro ex-guardião vitoriano, e foi campeão da 2.ª Divisão da Associação de Futebol de Braga (AF Braga), realça o ex-dirigente.
influenciava o dia a dia do clube, disponibilizando pessoas para arranjarem o campo. E o seu encerramento em 1968, com a consequente emigração, fez o clube parar até 1975, ano da retoma graças ao esforço de “uma rapaziada” intitulada “os restauradores”, que negociou também a posse do campo com o proprietário à época, José Maria Machado Vaz. “Ele deu-nos a possibilidade de o terreno ser do Campelos enquanto o Campelos existisse. O Machado Vaz entretanto vendeu a quinta, mas não o campo. O campo ficou sempre no Campelos e é propriedade do clube”, esclarece José Pimenta.
A partir daí, o clube que é filial n.º 2 do Vitória Sport Clube e sócio n.º 387 da Federação Portuguesa de Futebol caminhou, com altos e baixos, pelos campeonatos da AF Braga. Ao revisitar os seus tempos de presidente, José Pimenta elege a subida à 1.ª Divisão, em 1983/84, e a subida à Divisão de Honra, em 2019/20, também a época da inauguração do relvado sintético.
“O Centro Social de Campelos cede-nos uma carrinha”
Adepto, jogador, capitão de equipa e, desde 2022, presidente, Cristiano Silva recorda os jogos no meio da claque, no “princípio dos anos 2000”, e a primeira ocasião em que envergou a braçadeira, num duelo com o Fórum de Airão, entre 2017 e 2019, como os episódios afetivos que coroam a sua relação com o Campelos.
Ciente de que é “dificílimo” lançar um projeto de formação, até pelos clubes vizinhos que já a têm, Cristiano Silva elege a instalação de luzes LED no campo de jogos, projeto candidatado aos apoios desportivos da Câmara Municipal de Guimarães 2022/23, e a aquisição de um veículo para transporte como prioridades. “Quando vamos fora, temos tido a parceria do Centro Social de Campelos, que nos cede uma carrinha. Temos esse handicap de lhes pedir a carrinha de 15 em 15 dias. Vamos tentar obtê-la através de patrocinadores”, espera.