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Albano Jerónimo: “Vivemos tempos bizarros que deveriam ser de aceitação”

Tiago Mendes Dias
Cultura \ sexta-feira, novembro 26, 2021
© Direitos reservados
“Orlando” reflete sobre “as questões de género e as ondas de violência que estas originam”, diz o encenador da peça com estreia absoluta marcada para 04 de dezembro, em Guimarães.

O palco do Grande Auditório do Centro Cultural Vila Flor (CCVF) acolhe, daqui a oito dias, um “drama cénico” com 11 atores que interpretam 20 personagens. A partir de Orlando: uma biografia, romance modernista de Virgínia Woolf, publicado em 1928, e do atentado que, a 12 de junho de 2016, causou 49 mortes num espaço de diversão noturna frequentado por pessoas LGBTQIA+ na cidade norte-americana de Orlando, as performances querem projetar-se como “tratado sobre dignidade humana” num tempo em que nem todos gozam dessa condição. É assim que o encenador Albano Jerónimo vê Orlando, drama que sobe aos palcos pela primeira vez a 04 de dezembro, às 19:30.

“O espetáculo divide-se em prólogo e em três atos. E surge porque vivemos tempos bizarros numa época que deveria ser de tolerância e aceitação”, afirma ao Jornal de Guimarães. Ao contrário disso, passámos para um período de violência extrema, muitas vezes centrado na discriminação. Essa discriminação, para nós, passa por um desconhecimento”.

Com o apoio de Albano Jerónimo, António Baião-Pinto e André Tecedeiro, Cláudia Lucas Chéu, “uma das dramaturgas de excelência” em Portugal para o encenador, pelo “trabalho coerente” que desenvolve, escreveu um drama com novas personagens, mas fiel “em praticamente 90%” à obra de Virgínia Woolf, que narra a viagem de um poeta pela história da literatura inglesa, mudando do sexo masculino para o feminino no percurso.

Esse material, adaptado para uma linguagem contemporânea, visa a “provocação” e o despertar da “reflexão” no espetador para as “ondas de violência” geradas pelas questões de género e para o uso do conceito de género enquanto afirmação de uma certa forma de poder. “Queremos refletir também sobre o facto de o género não ser uma essência, nem uma construção social, mas uma produção do poder. É uma crítica dessas categorias de identidade, especificamente da identidade enquanto fundamento da ação política”, fundamenta o encenador.

E se há “poder”, há “resistência” e uma “força de combate” que daí nasce. Sustentado em “abordagens críticas” com raízes na psicanálise, na fenomenologia, no feminismo e nos teóricos queer, esse esforço projetar-se-á para um espetáculo que visa realçar “as qualidades intelectuais e abstratas da pluralidade do homem”, centrado num protagonista “nobre, sofisticado, sensível”.

“A encenação remete-nos para uma perversidade poliforma sonhada, quer na recusa, quer na paixão angustiada, quer na transformação da beleza, nas representações singulares da radicalidade corpórea. Portanto, este Orlando é uma biografia ficcionada sobre a corrente da consciência no palco do tempo”, refere ainda Albano Jerónimo.

Apoiado pela Direção-Geral das Artes e coproduzido pelo CCVF, pela Casa das Artes (Vila Nova de Famalicão, pelo Teatro Municipal do Porto (Rivoli), pelo Teatro Nacional D. Maria II (Lisboa), pelo Teatro do Noroeste (Viana do Castelo) e pelo Centro de Artes de Águeda, Orlando terá interpretação de André Tecedeiro, Aurora Pinho, Cláudia Lucas Chéu, Diego Bragà, Eduardo Madeira, Luís Puto, Madalena Massano, Maria Ladeira, Pedro Lacerda, Rita Loureiro e Solange Freitas.

 

Grande Auditório do CCVF acolhe estreia absoluta, a 04 de dezembro

Grande Auditório do CCVF acolhe estreia absoluta, a 04 de dezembro

 

Uma proposta de “travessia” em comunidade

Inserida no “reportório humanista” seguido pela companhia Teatro Nacional 21, Orlando tenta-se “colocar no papel do outro” e aflorar o conceito de “travessia”. Essa “travessia”, enquanto “alusão metafórica a temas não consensuais e a barreiras morais”, é aprofundada num programa paralelo, desenvolvido com a comunidade, cuja primeira apresentação está marcada para 30 de novembro.  

“Disponibilizamo-nos a realizar uma travessia conjunta com uma comunidade envolvente, retirando-lhes o papel de meros espetadores e envolvendo-os no próprio processo. Essas ações estão já em pleno gás”, indica o encenador, também reconhecido no meio artístico como ator.

Esse conjunto de ações arranca com o filme-documentário “Travessia”, sobre a comunidade LGBTQIA+ em Portugal nos últimos 20 anos, agendado para as 21h00 de 30 de novembro, no Pequeno Auditório do CCVF. Para 02 de dezembro, às 21h30, está marcada a apresentação dos trabalhos produzidos por alunos da Universidade do Minho (UMinho) em oficinas conjuntas, no café-concerto do CCVF. De 01 e 04 de dezembro, o Espaço Escuta, também no CCVF, vai exibir permanentemente o documentário, os trabalhos em parceria com a UMinho e o vox populi realizado em Guimarães.

Com alusões a tópicos de género, que incluem transexualidade, e às questões da “deficiência física e mental”, esse programa paralelo tenta “contextualizar a comunidade envolvente” para se assumir como ferramenta de “inclusão”. “Temos de proporcionar reflexões capazes de desafiar, sem violentar”, esclarece Albano Jerónimo.

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