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Alberto Costa, o homem da luta

Tiago Mendes Dias
Desporto \ sábado, março 02, 2024
© Direitos reservados
Encantado pelas coreografias em criança, circulou pelo Norte para conhecer gente e fixou-se de vez na cidade natal para a rechear de títulos. Aos 50 anos, imagina um dos seus pupilos nas Olimpíadas.

Outono adentro, não o de Guimarães, mas o de Berlim, Alberto Costa acompanhava Uisma Lima no combate de acesso ao top 100 mundial; o cenário era o do Verti Music Hall, em frente à mais reconhecida secção do Muro, com a sua galeria de arte urbana. Mas nada nesse evento de 11 combates, realizado em 25 de novembro de 2023, impediu o lutador do Vitória SC de derrubar o arménio Araik Marutjan. Ver o angolano de 31 anos ascender ao 58.º lugar do ranking mundial de peso meio-médio (66,7 a 69,9 quilos), conforme assinala a base de dados Boxrec, foi “uma boa prenda” de 50.º aniversário, confessa o treinador. “Não estive com a minha família: a minha mulher e com a minha filha, mas estar com o Uisma foi um momento marcante. Já tive muitos”, indica ao Jornal de Guimarães, lembrando os títulos mundiais de António Sousa no boxe ou os inúmeros títulos mundiais, europeus e mundiais no kickboxing, coletivos ou individuais, com realce para Fernando Machado, Susana Rosa ou, no presente, Nuno Mendes, Gabriel Freitas, David Matos ou Gonçalo Freitas.

O seu punho está cravado em todos esses sucessos; afinal, leva 40 anos a desferir e a evitar ganchos e uppercuts, golpes cruzados e golpes de joelhos, no ringue ou na rua. E a ensinar como os desferir e como os evitar. Habituado a ganhar como atleta e como técnico, Alberto Costa dirige as secções de boxe e de kickboxing do Vitória, mas não só. É também selecionador nacional de kickboxing e de muaythai há duas décadas, com mais de 100 medalhas conquistadas. Galardoado pela respetiva federação e pelo Instituto Português do Desporto e Juventude, o vimaranense alimenta um sonho: apurar um dos seus lutadores para os Jogos Olímpicos de 2028, em Los Angeles. A cidade de Banguecoque, na Tailândia, ainda vai receber um último torneio de qualificação para os Jogos de 2024, mas o acesso é “muito difícil”. “O Uisma teria de ser medalha de ouro. Então estamos a pensar em Los Angeles. Se vai ser o Uisma, o Rúben Torres ou outro atleta nas camadas jovens a ser trabalhado, vamos ver”, perspetiva.

 

“Comecei a treinar quer seja na escola da Silveira, quer no monte de Azurém, quer no Castelo. Ainda treinei uns quatro ou cinco anos à chuva. Não havia instalações”, Alberto Costa

 

“Nunca fui agressivo na rua, mas era em competição”

De touca na cabeça e luvas para se defender dos golpes dos seus pupilos, Alberto Costa posiciona-se com a maior das naturalidades sobre o tapete, desafiando Uisma Lima a fazer melhor com uma ou outra palavra de incentivo, sempre com o sorriso de quem tem tudo sob controlo. O insistente matraquear é pontuado pelos comentários animados dos que esperam pela sua vez. “Este treino foi trabalho de estratégia. Cada um tem a sua”, realça. Semana após semana, orienta um grupo de lutadores entre as 10h00 e as 13h00 e um outro a partir das 17h00, numa secção do Vitória com cerca de 80 atletas.

Mas treinar num dojo como o do Vitória SC, no Estádio D. Afonso Henriques, é uma realidade que nem sempre foi a do treinador. Nascido e criado na Urbanização de Nossa Senhora da Conceição, Alberto Costa sempre teve “jeito para o desporto” e jogava futebol no Vitória quando, aos 10 anos, despertou para o seu futuro modo de vida. “Dava uma série na RTP 1, que era Os jovens heróis de Shaolin, e vínhamos para a rua andar à porrada uns com os outros, a imitar. Sempre fui um autodidata, e ali fazíamos as coreografias”, recorda.

Sem possibilidades financeiras para frequentar o karaté do Vitória, a única modalidade de combate com prática formal na Guimarães do início dos anos 80, Alberto Costa treina no seu bairro, no monte de Azurém ou no Castelo, à chuva ou ao sol. O treino em instalações apropriadas surge apenas quando deixa de estudar e vai trabalhar. Antigo carateca do Vitória, Roberto Arnone abre uma pioneira academia de kickboxing em Braga, e o vimaranense inicia o seu périplo pela região. O foco em evoluir levou-o a circular por Fafe, por Vila do Conde e pela reconhecida secção do boxe do Boavista, muitas vezes sem companhia. Pelo meio, encontrou pessoas que o marcaram para a vida: o amigo António Ascensão, Joaquim Peixoto, Joaquim Paulo Moreira, que o “levou a vários combates a sério” pela primeira vez, ou Jorge Jeremias, “lenda viva do boxe”, que lhe disse que tinha “raça e velocidade” para ser campeão nacional.

As previsões confirmaram-se. Longe de se considerar uma pessoa agressiva no dia a dia, Alberto mudava de face assim que entrava no ringue: “Era mesmo para destruir”, confessa. “Eu não tinha muita força. Fui trabalhando isso ao longo dos anos. Tinha agilidade e fui sempre rápido. Juntava a isso a agressividade. Nunca fui agressivo na rua, mas era em competição. Tinha muito foco e determinação”, descreve.

Por essa altura, já se fartara de “andar de lado para lado”; conheceu em Fafe a sua esposa, Katy Matos, a quem também agradece, e fixou-se no Desportivo Francisco de Holanda, o primeiro clube pelo qual competiu em Guimarães. Os títulos apareceram naturalmente, muitos deles conquistados por knock-out. “Ganhei vários títulos nacionais em boxe, em kickboxing e em muaythai. Fui vice-campeão do mundo e da Europa”, assinala.

 

Alberto Costa a treinar com Uisma Lima, às portas de combate para entrar no top-20 mundial da sua categoria

Alberto Costa a treinar com Uisma Lima, às portas de combate para entrar no top-20 mundial da sua categoria

 

“Sempre que é preciso isto e aquilo, o Vitória tem”

Há muita informação a captar num plano geral ao dojo do Vitória SC: o ringue eleva-se sobre um tapete amplo, ladeado de espelhos e de sacos com vários pesos e feitios. As faixas, as taças e os cinturões repousam sobre a mesa, enquanto os recortes de jornais que recordam esses mesmos galardões se elevam sobre a porta. Alberto Costa olha para o seu local de trabalho e dá o seu veredicto: “O Vitória tem tudo a nível de infraestruturas. Temos o que qualquer sala tem a nível mundial”, afirma.

Os lutadores também dispõem de médico, fisioterapeuta, nutricionista ou psicólogo sempre que o solicitam, e o dinheiro para viagens, estadias e alimentação nas principais competições não tem faltado; as verbas só escasseiam quando surge a possibilidade de um estágio de uma semana entre os melhores, em Inglaterra. Mas Alberto Costa continua pronto a evoluir e a aprender, demore o tempo que demorar. “Fui colhendo conhecimentos em toda a parte do mundo e formatando o meu treino e o treino dos meus atletas. Levou tempo a criar a minha escola e o meu modelo de treino, mas ganhámos muitos títulos”, avalia.

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