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Arte: há novas exposições aí… para se verem bem de perto

Tiago Mendes Dias
Cultura \ sexta-feira, abril 16, 2021
© Direitos reservados
Além do novo ciclo de exposições no CIAJG, o primeiro sob a curadoria de Marta Mestre, também surgem propostas noutros espaços da cidade para serem vistas ao vivo.

Marta Mestre apresentou-se em setembro de 2020 como curadora geral do Centro Internacional de Artes José de Guimarães (CIAJG) e começou a trabalhar no programa artístico desde logo. Intitulado Nas margens da ficção, o seu primeiro ciclo de exposições está pronto para receber os primeiros olhares do público a partir das 17h00 desta sexta-feira, a hora marcada para a inauguração.

O centro de artes só pode acolher um máximo de 20 visitantes de cada vez, estando eles impedidos de tocarem nos objetivos e obrigados a um distanciamento mínimo de dois metros. Assim, preparar o regresso do público após quase três meses de confinamento foi um “desafio”, assume a curadora. “Pensar a retoma dos espaços e da programação dos museus é um desafio, na medida em que o contacto físico com as obras é central na experiência da arte, seja ela contemporânea ou não contemporânea”, afirma ao Jornal de Guimarães.

Até 05 de setembro, o novo ciclo desdobra-se em oito exposições (mais a coleção permanente de José de Guimarães) repartidas por 13 salas. Todas têm a curadoria de Marta Mestre, à exceção de Complexo Colosso, mostra orientada pelo curador convidado Ángel Calvo Ulloa e inspirada no Colosso de Pedralva, a escultura localizada na alameda Doutor Mariano Felgueiras. O percurso reúne linguagens como o cinema, a documentação, a instalação, o vídeo e o desenho. Tem artistas portugueses e até vimaranenses, como Joaquim Salgado Almeida, mas também mexicanos, brasileiros e angolanos. Há “várias artistas mulheres”, realça Marta Mestre.

 

“Vivemos num mundo de polarizações. A coleção permite entender que estamos todos no mesmo mundo, embora neste mundo, existam mundos”, Marta Mestre

 

O CIAJG será assim casa de uma diversidade ancorada de um “modo mais direto ou indireto” na obra de José de Guimarães, vimaranense que procurou a humanidade nos quatro cantos do mundo e que legou parte dela ao centro de artes, segundo a forma de coleções de arte antiga chinesa, africana e pré-colombiana. “A coleção é belíssima”, reconhece Marta Mestre. “Coloca-nos questões sobre o mundo presente. É uma coleção indicativa de caminhos, dialogante, que expressa a sua possibilidade”.

A diversidade cultural deste ciclo, traço “muito contemporâneo”, explora relações que “nem sempre são pacíficas”, admite Marta Mestre, curadora que já passou pelo Instituto Inhotim, em Minas Gerais, e pelo Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro. “Muitas vezes, até são de polaridade. Vivemos num mundo de polarizações. A coleção permite entender que estamos todos no mesmo mundo, embora neste mundo, existam mundos”, indica. Assim, Nas margens da ficção é uma tentativa de sublinhar “várias identidades”, tendo como ponto de partida a “polifonia da coleção do CIAJG”. “Ao invés de uma só voz, temos aqui várias vozes e várias narrações”, resume.

Mas o novo ciclo expositivo encerra ainda uma outra dimensão: o anseio de “ficcionalizar o presente”, sabendo que a arte é um “lugar de transfiguração” no qual se pode ir “além da mera história, do mero facto”. “É um modo de contrariar um excesso de real que é hoje muito presente através, por exemplo, das notícias que nos entram dentro de casa”, aponta.

No primeiro desafio ao serviço do CIAJG, Marta Mestre foi acompanhada de “perto” pela estrutura da Oficina, nomeadamente pela diretora artística, Fátima Alçada. “A Marta estava a chegar a Guimarães. É todo um território novo para ela e estávamos em pandemia. Houve aqui uma tentativa de dar o maior apoio possível a alguém com a responsabilidade de pensar este museu”, recorda. Esse apoio, explica, cingiu-se à “partilha de conhecimento do território e do museu”, para que a nova curadora soubesse que “terreno está a pisar, a sua história, os seus contornos”.

Depois da saída de Nuno Faria, diretor artístico do CIAJG até 2019, Fátima Alçada vê este novo ciclo como o início de “uma nova abordagem ao museu” e à sua relação com a “contemporaneidade e com a cidade”. Confessa, por isso, encarar a inauguração de Nas margens da ficção com “grande expetativa”, também pela “carga simbólica e emocional” do regresso ao espaço físico onde público e obra de arte se veem. “Estamos todos a precisar muito de sair, de regressar aos sítios, de visitar estes espaços. Isto é importante para todos. Os artistas também não vivem se não forem vistos”, sublinha.

 

 

Bruxaria e mau-olhado no Palácio

Um pouco mais a sul, o Palácio Vila Flor abre as suas portas à mesma hora. O seu interior promete um ambiente “contemporâneo”, mas também “popular, obscuro e negro”, realça o curador Ivo Martins sobre a exposição do coletivo Movimentos Bruxos. “Passa pela exploração de alguns ideários populares – a bruxaria, o mau olhado, as adivinhações, toda a simbologia do diabo. Tem muito a ver com o popular”, afirma ao Jornal de Guimarães.

Formado por Carlos Lima, Dora Vieira e João Alves, o coletivo do Porto retira o “contexto popular” a esses fenómenos e dá-lhes um contexto mais contemporâneo, através “da pintura, da instalação ou de máquinas em movimento”. O espaço expositivo do palácio foi até adaptado para funcionar como cenário das obras, criando uma “ambiência em que as peças encaixam e dialogam entre si”, prossegue Ivo Martins. “Há paredes pintadas de cores diferentes, suportes como panos, impressões e fotografia e ainda imagens cinéticas em movimento”, detalha.

A proposta do trio de artistas, em exibição até 31 de julho, tem assim um cariz “bastante simbólico”, extraído de “lendas, fantasias e histórias estranhas de cunho popular”. Apesar do tom “obscuro” da exposição, Ivo Martins vê como “muito mais triste” a “vida metida dentro de quatro paredes” a que a pandemia tem obrigado. “É sempre bom fazer coisas: para nós, para os artistas, para os espaços, para as pessoas”, afirma. Para o curador, as pessoas não devem ver o novo coronavírus como “um bicho papão”, desde que “se comportem com bom senso e em segurança”. O Palácio Vila Flor tem as mesmas regras de segurança do CIAJG, com a exceção de que só pode comportar um máximo de 10 pessoas de cada vez.

 

Olhar na Sociedade Martins Sarmento e no CAAA

As inaugurações de propostas artísticas não se resumem, porém, aos equipamentos municipais. Uma hora depois do CIAJG e do Palácio Vila Flor, a Sociedade Martins Sarmento abre a exposição Na Distância de um Olhar, de Pedro Calapez, artista plástico que, desde os anos 80, explora aquilo que se pode revelar e esconder ao olhar, quer na pintura, quer na escultura. A mostra vai estar patente até 04 de julho.

No sábado, é a vez do Centro para os Assuntos de Arte e Arquitectura (CAAA) inaugurar, às 15:00, duas novas exposições, centradas nas artes visuais. Uma, de desenho, reúne as coleções Toledo, de Tânia Carvalho, e Coisas, de Luís Guerra. A outra, de ilustração, encerra o ciclo Olhar voltar a olhar. Depois do espaço ter reaberto ao público a 05 de abril, a programadora Maria Luís Neiva mostra-se “feliz” por apresentar novas propostas ao vivo. “Espero que as pessoas venham com consciência e sigam as nossas medidas de segurança. A galeria não vive sem o público”, reconhece.

A exposição de desenho de dois profissionais da dança – Tânia é coreógrafa e Luís bailarino – junta dois registos diferentes, explica a programadora. “A Tânia tem um registo muito próprio dela. Olhamos para as coisas dela e percebemos que são dela. E o desenho é a maneira de ela coreografar, o processo dela”, descreve. Já Luís Guerra tem denotado “alguma evolução” face aos seus primeiros desenhos, habitualmente associados às ideias de “mapa e de cidade”. “É uma dupla que vai funcionar muito bem junta”, antecipa Maria Luís Neiva.

Os dois autores integraram a exposição anterior Bailarinos e coreógrafos que dançam, desenham e pintam, patente entre 27 de fevereiro e 10 de abril, quase sempre online. É a primeira vez que o CAAA vai receber os mesmos artistas em “exposições consecutivas”, assume a responsável pela galeria.

A exceção, esclarece, deve-se à “confusão pandémica” que ditou a “suspensão de algumas exposições” marcadas para 2020, entre as quais a de Tânia Carvalho e Luís Guerra. “Passou para este ano e esta era a única vaga que tínhamos. Isto não é intencional, nem desejável para nós. Gostamos de oferecer alguma diversidade programática”, admite.

A outra proposta, Olhar voltar a olhar, trata a relação entre o cinema e a ilustração. Depois de Isabel Baraona ter ilustrado One Week, de Buster Keaton (1920), e Pedro Nora Vai e vem (2003), de João César Monteiro -, é a vez de Ana Biscaia e André Coelho exibirem o seu trabalho. Ana inspirou-se em Feios, porcos e maus, de Ettore Scola (1976) e André em Ao coração das trevas ou o habitualmente designado Apocalypse Now, de Francis Ford Coppola (1979). Ambas as exposições estarão patentes até 29 de maio.

 

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