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Barato, “sem derrapagens” e o “mais funcional em Portugal”

Bruno José Ferreira
Desporto \ terça-feira, julho 25, 2023
© Direitos reservados
Em Guimarães, um estádio em que “o orçamento não dava para fazer uma bancada dos restantes” foi o primeiro do Euro 2004 a ser inaugurado e é o “mais funcional do país”.

Tem na cobertura o principal calcanhar de Aquiles, mas, volvidas duas décadas, o arquiteto responsável, Eduardo Guimarães, “em estética e funcionalidade não mudava nada”.

Na noite de 25 de julho de 2003, mais de 25 mil pessoas acorreram ao renovado Estádio D. Afonso Henriques. Num espetáculo de luzes, som e pirotecnia, em Guimarães era inaugurado o primeiro recinto do Euro 2004. Um ano e três meses depois do arranque das obras – que obrigaram o Vitória SC a fazer uma época fora de portas, em Felgueiras –, os vitorianos entraram pela primeira vez na nova realidade em que se tornara o estádio: funcional e moderno, eram os principais traços que se apontavam na altura. Na inauguração, o Vitória SC bateu os alemães do Kaiserslautern por quatro bolas a uma. Afonso Martins foi o primeiro a abanar as redes.

Duas décadas volvidas, o arquiteto responsável pela empreitada “não mudava nada em termos de estética e de funcionalidade”. Eduardo Guimarães, atualmente com 63 anos, traçou o projeto de um estádio diferenciado dos outros nove que integraram a candidatura portuguesa a receber o europeu. Projetou-se gastar 620 milhões de euros em estádios, o D. Afonso Henriques custou apenas 25 milhões. “Foi o único que não teve derrapagens no orçamento”, dá conta Eduardo Guimarães. Do bolo total, o palco vimaranense significaria apenas 4,2% do investimento que se previa gastar, e aqui sublinhe-se o previa. “Um orçamento que não daria para fazer uma bancada de cada um dos outros estádios”, acrescenta à conversa.

Eduardo Guimarães conhece a realidade dos outros estádios e, com a devida separação para os três maiores, considera que “o estádio do Vitória não fica atrás de nenhum” dos outros seis - com lotação a rondar os 30 mil espetadores - na “integração com a cidade, em estética e – mais importante – em funcionalidade e acessibilidade”. Diz, aliás, não ver “qualquer diferença” para estes recintos. Voltando um pouco atrás, o arquiteto vimaranense recorda que já estavam a ser feitos estudos, a pedido de António Pimenta Machado, na altura presidente do clube, para se pensar numa intervenção no estádio. O Euro 2004 acelerou o processo, tendo a Câmara como entidade promotora.

 

O “gozo enorme de coser quatro bancadas diferentes”

Vimaranense e vitoriano, “nascido e criado na Rua D. João I”, Eduardo Guimarães recorda em conversa com o Jornal de Guimarães o “desafio” que foi este projeto. “O projeto” da sua carreira. “A câmara impôs um projeto de reformulação, e não de raiz, que tivesse custos controlados”. Foi, portanto, “um desafio”, tal como já foi referido, “coser aquilo”. “O estádio era composto por quatro bancadas, todas elas diferentes, feitas em alturas diferentes e sem qualquer ligação”. “Penso que foi conseguido criar um estádio homogéneo e com as exigências da UEFA”.

Numa avaliação do seu trabalho, o arquiteto encontra mais pontos positivos do que negativos, sendo a cobertura o “grande defeito que se pode apontar”. Já lá vamos. Entre os aspetos positivos destaca a “visibilidade” em todos os setores. “Se o compararmos com o do Boavista, igualmente reformulado, as bancadas ficaram muito inclinadas e em determinados setores a visibilidade é reduzida”, compara. “A própria ligação com a cidade funciona muito bem, a Sul parece um edifício, temos a ponte pedonal a ligar à Alameda Alfredo Pimenta, criando-se uma praça que não existia, dá uma funcionalidade muito boa ao estádio”, opina. A acessibilidade é outro fator que destaca: “Num outro estádio, em Braga, há uma enormidade de patamares a subir ou descer. Aqui praticamente toda a gente entra numa quota intermédia em que rapidamente chega ao seu setor. A exceção é a Sul, mas criaram-se circuitos distintos que se cruzam e tornam a acessibilidade simples”.

A funcionalidade do D. Afonso Henriques, com “tudo próximo”, sustenta Bruno Cabral, é, de resto, quase senso comum. Bruno Cabral é jornalista da Sport TV e da TSF, tendo já percorrido todos os estádios do Euro 2004, e muitos outros para além desse, em Portugal, e não só. Estreou-se enquanto jornalista do canal desportivo em Guimarães, na noite de 4 de agosto de 2011, numa pré-eliminatória da Liga Europa. O Vitória SC sofreu, mas conseguiu ultrapassar os dinamarqueses do Midtjylland. “É o mais funcional em Portugal, não há dúvida sobre isso”, começa por dizer. “Na minha perspetiva de jornalista, enquanto profissional, é dos estádios onde melhor se trabalha, porque as coisas estão todas próximas. A sala de imprensa é muito próxima da tribuna de imprensa, o acesso ao relvado é simples e, mesmo para trabalhar no relvado, a iluminação é boa e proporciona um ambiente espetacular”.

Numa vertente menos positiva, o jornalista natural de Espinho refere que, “como relatador e narrador”, era “preferível trabalhar sem o vidro” da cabine de imprensa, o que permitiria “sentir mais o jogo”. Por outro lado, pelo facto de os jornalistas estarem num patamar inferior – em relação a outros estádios –, “a visibilidade é inferior”. Ainda assim, Bruno Cabral reforça o sentido “prático” do D. Afonso Henriques, sem a “azáfama de elevadores” e grandes deslocações: “Adoro fazer jogos no relvado, pelo ambiente e pelas condições de trabalho que temos”, complementa.

“Vinte anos depois fazem-se sempre coisas diferentes. Hoje talvez fizesse mais pressão para que se colocasse uma cobertura maior”, Eduardo Guimarães – arquiteto que projetou o Estádio D. Afonso Henriques 

Voltando ao “grande defeito”, Eduardo Guimarães diz que “é o que toda a gente fala”: a cobertura não atingir 100 por cento da bancada, prejuízo de se tratar de uma reformulação. “Teriam de se fazer estruturas metálicas novas para todas as bancadas, o que não aconteceu. Embora não pareça, debaixo do material que lá foi colocado para uniformizar o aspeto visual estão as estruturas metálicas antigas, diferentes, que já existiam”, constata. Hoje poderia “pensar em alterar um material ou outro”, mas, na essência do estádio, pouco alteraria, diz. “Vinte anos depois fazem-se sempre coisas diferentes. Hoje talvez fizesse mais pressão para que se colocasse uma cobertura maior”, atira.

Para finalizar, Eduardo Guimarães destaca que várias necessidades atuais dos recintos desportivos, como a necessidade de se criarem zonas corporate, são exequíveis com intervenções no estádio. “A Bancada Nascente foi pensada desde o início para poder ter camarotes. O corredor superior da bancada tem uma largura enorme porque já se previa a possibilidade de instalar boxes e elevadores”, ressalva o arquiteto.

Eduardo Guimarães olha para o Estádio D. Afonso Henriques “como um motivo de orgulho em termos de carreira”. “Sou vimaranense, vitoriano e arquiteto; de coração é o melhor trabalho que fiz”, termina. 

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