João de Meira encerrada: funcionárias reivindicam formação e valorização
Em curso desde 09 de dezembro, a greve convocada pelo Sindicatos de Todos os Professores (STOP) tem colocado os docentes na linha da frente quanto a reivindicações para a escola pública, mas também se alastra ao pessoal não docente. Nesta sexta-feira, as várias instalações letivas da EB 2 e 3 João de Meira estiveram inativas por ação dos seus funcionários, precisamente: os alunos circulam nos espaços do recreio ou à entrada da escola, mas muitos deram meia volta ao início da manhã. Não há aulas.
Das reivindicações que se ouviram entre as 08h00 e as 08h30, pontuadas pelas buzinas dos carros que ali passavam, algumas das mais expressivas provinham do trio de funcionárias que trabalha no Centro de Apoio à Aprendizagem, uma unidade que acolhe 11 alunos com necessidades especiais. “Lutamos por melhores condições no ensino especial”, “crianças do ensino especial não precisam de pena, mas de atitudes”, “dar o devido peso às reais carências dos alunos com necessidades especiais”: eis as mensagens que se liam nos cartazes exibidos por Isabel Rocha, Glória Almeida e Alice Correia.
“No ensino especial, raramente fazíamos greve, mesmo por causa das crianças. Sabemos que os pais necessitam de trabalhar. Ficar com eles em casa é muito complicado, mas temos de parar para as pessoas perceberem as dificuldades que temos”, vinca Alice Correia, de 36 anos, ao Jornal de Guimarães.
Contratada para a EB 2 e 3 João de Meira há dois anos, a assistente operacional ainda se lembra de como foi colocada à prova no primeiro dia de trabalho, “sem qualquer tipo de formação”. “O meu primeiro dia foi ficar sozinha com aqueles miúdos. O que me disseram foi que tinha o lanche para cada criança e para me desenrascar”, lembra.
Formação especializada é precisamente uma das reivindicações-chave da greve, uma vez que aquele trio tem de lidar todos os dias da semana com crianças que “dependem 100% de um adulto”, que “usam cadeira de rodas, usam fralda, comem por sonda, têm disfagia, não se alimentam sozinhas, têm convulsões”. No caso das convulsões, há pelo menos uma criança que as tem com frequência, o que obriga até à chamadas ocasionais para o INEM.
“Temos receio de que qualquer dia nos possa ficar nas mãos. Temos de lhes dar a medicação. Por essa razão, deveria haver formações específicas. Não temos formação na sala para quem trabalha com estas crianças. Muitas das vezes, deveriam até ser acompanhadas por um enfermeiro”, defende a porta-voz daquele trio.
O trabalho dessas três funcionárias começa às 07h30, com hora e meia de viagem para recolher todas as crianças, antes de chegarem à sala pelas 09h10, para lá ficarem o resto dia, com os alunos e o professor. “Temos de lhes dar o lanche, de mudar fraldas. Não são autónomos. Mesmo aqueles que têm alguma mobilidade não vão à casa de banho sozinhas”, descreve. E se alguma delas tiver de faltar, a substituição é “difícil”. “Há dificuldades em substituir-nos quando faltamos, porque há falta de pessoal. Acabamos por nos revezar”, resume.
O trio lamenta assim que essa função valha o “mesmo salário” de colegas que estão noutros postos da escola e que os funcionários do ensino especial contem para o “rácio da escola” da mesma maneira que os restantes assistentes operacionais.
Com o ensino obrigatório, as crianças com necessidades especiais têm de estar na escola e são cada vez mais, o que leva Alice Correia a pedir medidas, afinal, trata-se de uma área em que nem toda a gente consegue trabalhar. “Há colegas que não conseguem trabalhar numa sala assim. E não somos valorizadas por isso. Há pessoas que dizem que é preciso ter estômago para trabalhar ali. Eu digo que é preciso ter coração”, diz.
Rácio de alunos para funcionários e avaliação desagradam
A Escola EB 2 e 3 João de Meira conta com 735 alunos – esse número sobe para 1170 se se contar todo o Agrupamento de Escolas João de Meira – e os assistentes operacionais são 20. Esse número, que não pode ser maior face ao limite imposto pelo rácio atribuído à escola, desagrada a outras funcionárias, solidárias com as reivindicações do trio do ensino especial. Uma delas, Tânia Henriques, diz fazer greve pela sua profissão, mas também pelos alunos, considerando que o número de assistentes operacionais é escasso, principalmente quando falta alguém.
“Estamos contra o rácio. Não está nada bem. As colegas têm os seus motivos para estar de baixa, de seguro, de ter os direitos que têm como trabalhadores-estudantes, mas deveria vir alguém substituir, porque são baixas de longa duração”, realça, defendendo formação especializada para quem trabalha no ensino especial. Ao lado, Sofia Sousa defende que “o trabalho é demasiado para a quantidade de funcionários” que a escola pode ter.
A forma como os funcionários são avaliados também merece críticas: “Imagine-se o caso de uma colega em falta há quase dois anos, que tem um Excelente. Não faltando, esse Excelente mantém-se, porque não está de serviço para ser avaliada. Nós, que estamos aqui todos os dias, podemos levar com uma nota menos positiva, porque essa nota tem de ir para ela, pelo facto de não estar de serviço”, explica Alice Correia.
Os professores juntaram-se aos assistentes operacionais nas reivindicações que prosseguem há um mês. A cerca de 200 metros, a Escola Secundária Martins Sarmento estava aberta, mas sem aulas, face a mais uma manifestação de professores em frente aos portões.