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Em Guimarães, fala-se de ciência com pés, cabeça… e muita lata

Tiago Mendes Dias
Ciência & Tecnologia \ segunda-feira, maio 17, 2021
© Direitos reservados
Biologia, engenharia de tecidos, robótica e gestão dos resíduos são assuntos discutidos na segunda edição do Pint of Science – Guimarães, evento que se volta a realizar online, devido à pandemia.

O Pint of Science nasceu em 2012, no Reino Unido, para aliar o útil – divulgar ciência numa linguagem acessível ao público – ao agradável – “beber” a experiência com outras pessoas num qualquer bar ou espaço público. Em 2021, este festival de comunicação de ciência estende-se a mais de 400 cidades de 30 países do mundo, sendo uma delas Guimarães. Estreante em 2020, a cidade berço só volta a oferecer o útil, já que a pandemia se interpõe no caminho do agradável. “Sem pandemia, isto iria decorrer em diferentes bares do centro histórico. Esse é o conceito. Mas com a pandemia, será online”, explica Cláudia Martins, coordenadora da equipa que organiza o Pint of Science – Guimarães.

Totalmente online e gratuito, o evento decorre na plataforma Nooks, de segunda até quarta-feira, com dois horários diários (19h00 às 21h00 e 20h00 às 22h00) e duas sessões paralelas em cada um deles, alusivas às duas categorias em que se divide o festival: uma delas, “Com pés e cabeça”, aborda biologia humana, medicina e saúde, enquanto a outra, “Ter muita lata”, aborda engenharia, robótica e computadores, explica a investigadora em nanomedicina na Universidade do Porto (UP).

A partir das 12 sessões inscritas no cartaz, vai-se falar, por exemplo, de impressão 3D, de robótica, de indústria 4.0 – envolve automação e troca de dados entre máquinas -, de gestão de resíduos, de medicina regenerativa, de combate ao cancro e do uso da radiação para se encontrarem soluções terapêuticas. Repleto de biologia e de engenharia, áreas de investigação que Cláudia Martins considera das “mais fortes” na região, o evento privilegia oradores que aliem a carreira docente a um “papel ativo na investigação”.

 

Reduzir a experimentação animal

Este Pint of Science – Guimarães privilegia investigadores da Universidade do Minho e de grupos de investigação associados, como o CMEMS (sigla inglesa para Centro para os Sistemas Eletromecânicos) e o 3B’s (Instituto de Pesquisa em Biomateriais, Biomiméticos e Biodegradáveis). O primeiro dia do “Com pés e cabeça” acolhe precisamente um investigador do 3B’s, Miguel Oliveira, para a sessão “Imprimir ou não imprimir: eis a questão?”, mas também um cientista da UP.

Licenciado em Ciências Farmacêuticas e doutorado em Tecnologia Farmacêutica, Bruno Sarmento está no Instituto de Investigação e Inovação em Saúde (i3S), liderando um grupo que inclui Cláudia Martins e Flávia Castro, as duas investigadoras que o convidaram para a versão vimaranense do Pint of Science. Na sessão intitulada “Modelos celulares para melhorar o desenvolvimento de fármacos”, o cientista vai falar sobretudo de tecidos que procuram simular o intestino, o pulmão ou o olho, sempre na ótica de se reduzir as experiências com animais.

“Tem a ver com a perspetiva de reutilização, redução e refinamento do modelo de animais”, explica ao Jornal de Guimarães. “É a chamada regra dos 3 R’s , muito disseminada pela comunidade científica. Cada vez mais existe a sensibilidade para que não se utilize a experimentação animal quando não é necessária”.

Ciente de que a experimentação animal vai permanecer em algumas etapas da investigação, Bruno Sarmento realça que estudar 10 animais em vez de 100 “já é um grande avanço”. E as vantagens da mudança não são apenas éticas; são também económicas. “Se a própria indústria farmacêutica puder substituir modelos animais por modelos celulares, vai reduzir o custo financeiro associado à investigação”, indica.

 

Uma questão de linguagem

O Pint of Science chegou a Portugal em 2018 e, neste ano, estende-se por mais seis cidades, além de Guimarães: Braga, com um painel em que também predomina a UMinho, Lisboa, Porto, Aveiro e as estreantes Coimbra e Viseu. Protagonista de outras ações de divulgação da ciência na comunidade, Bruno Sarmento vai-se estrear como orador neste festival. Para o cientista, “ajustar a linguagem” é a chave para aproximar a investigação e o público. “Se temos uma linguagem muito científica e pouco ajustada à comunidade, estas iniciativas tendem a não dar grande resultado”, avisa.

A pandemia de covid-19 é, para Bruno Sarmento, um “exemplo paradigmático” de comunicação bem sucedida. A seu ver, houve uma “sensibilidade muito grande da comunidade à ciência”, face ao palco dado aos especialistas para explicarem “com algum detalhe” o funcionamento do novo coronavírus e também das vacinas.

No fundo, o propósito deste festival é o de “tornar a ciência descomplicada e acessível a todos”, resume Cláudia Martins. E a investigadora espera continuar a fazê-lo em Guimarães, com um desejo em especial: ver a ciência invadir os bares da cidade. “Ainda não conseguimos uma edição presencial como aquela que gostaríamos”, confessa.

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