Uma equipa sem medo, uma doce serenata à chuva, um fim amargo
À semelhança de tantas outras receções ao Benfica, o final voltou a ser amargo para as cores vitorianas: num lance algo infeliz, o melhor em campo dos encarnados, Di María, encontrou o espaço e o tempo suficientes para colocar a bola na cabeça de Arthur Cabral. O cabeceamento certeiro frustrava a expetativa da maioria das 25 mil almas que povoaram o D. Afonso Henriques num domingo à noite de chuva incessante.
Apesar dos contornos de deja vu, restou muita coisa a saborear deste empate a dois golos com os lisboetas. Ao contrário de outras ocasiões, o Vitória segurou pelo menos um ponto que lhe dá a igualdade na tabela com o vizinho Sporting de Braga à partida para uma reta final de 13 jornadas de luta pelo quarto lugar. Além disso, sobressai a crescente naturalidade com que o Vitória iguala os melhores, sobrepondo-se até a eles nalguns momentos. Dominantes nalgumas fases, contidos noutra, os pupilos de Álvaro Pacheco estiveram sempre presentes na discussão do resultado, batalharam pelo esférico de igual para igual e, mais do que isso, foram a equipa mais perigosa ao longo do desafio.
Essa regra também se aplicou com a equipa reduzida a 10 elementos, num lance em que Borevkovic se deixou ir de carrinho relvado fora e atingiu com violência Florentino. Estavam decorridos 64 minutos, e o Vitória precisava de congregar todas as suas forças para segurar o 2-1. Não o conseguiu, embora tenha sido a equipa com mais ocasiões nessa fase de inferioridade numérica. Não fosse a elasticidade de Trubin, e Jota Silva estaria a comemorar um merecido golo, após uma exibição com uma assistência para a finalização sublime de André Silva, que adiantava de novo os homens de Guimarães, a meia hora do fim. Mas contar a história do jogo exige que se volte atrás.
É impossível pintar o retrato deste embate entre Vitória e Benfica sem o impacto da chuva e do relvado no espetáculo apresentado, apesar de tudo bom: a água caiu em jorros sobre o Estádio D. Afonso Henriques e o tapete verde ressentiu-se, travando inúmeras arrancadas e combinações das equipas. Construir futebol de ataque foi uma permanente adaptação, mas a galhardia e o engenho de muitos dos 22 elementos desbloqueou alternativas para levar perigo a ambas as balizas.
A formação de Lisboa teve mais bola, foi dura nos choques e recuperou várias bolas em terreno adiantado, dificultando as saídas em profundidade e em velocidade do conjunto de Álvaro Pacheco; mas quando a bola caía entre o setor intermédio e o defensivo das águias, o perigo tornava-se iminente para a baliza de Trubin. Esses condimentos resultaram num encontro ora contido, ora vertiginoso, com vitorianos e encarnados a imporem-se à vez.
A diferença viu-se nos lances de perigo; o Benfica dependeu quase sempre de bolas paradas, sobretudo as cobradas por Di María, para colocar a defesa vitoriana em sobressalto; o Vitória gelou a retaguarda encarnada em lances de bola corrida, com os Silvas – André e Jota – em permanente movimento; Nuno Santos tentou por duas vezes o remate em arco, falhando por pouco, e Tomás Händel seguiu-lhe o exemplo. O golo viria de penálti, quando Tomás Ribeiro se antecipou a Kokçu e foi pisado.
Exímio marcador de penáltis, Tiago Silva rematou ao ângulo superior direito e adiantou o Vitória por um intervalo que durou apenas cinco minutos; notória, a reação adversária culminou no desvio certeiro de Rafa, a dar sequência ao passe do melhor jogador encarnado em campo, o ala campeão do mundo pela Argentina.
Foi precisamente dos pés do atacante que surgiram os primeiros lances de perigo dos encarnados na segunda parte, antes de os lançamentos para Jota Silva espalharem o pânico na defesa encarnada e inverterem a tendência do desafio. Esse paradigma de controlo vitoriano perdurou até ao fim, pese a expulsão e o golo em cima do minuto 90; uma demonstração de força à qual os três pontos escaparam por um triz.