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Francisco de Oliveira apresenta livro sobre filosofia de Leonardo Coimbra

Tiago Mendes Dias
Cultura \ sexta-feira, março 03, 2023
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Para o padre, a obra do intelectual nascido em Felgueiras, fundador da Faculdade de Letras da Universidade do Porto, é um testemunho contra o “preconceito” de que Portugal “não sabe filosofar”.

A derradeira obra da vida de Leonardo Coimbra, A Rússia de hoje e o homem de sempre, publicada em 1935, motivou Francisco de Oliveira, sacerdote católico vimaranense que é pároco em Urgezes, a escrever uma tese de doutoramento pela Universidade Católica Portuguesa (UCP), defendida a 22 de julho de 2019, e a lançar, a partir daí, um livro intitulado O humanismo de Leonardo Coimbra: a Rússia de hoje e o homem de sempre, apresentado, na terça-feira à noite, na Biblioteca Municipal Raul Brandão, perante uma sala repleta.

Acompanhado por Carlos Morais, professor auxiliar da Faculdade de Filosofia da UCP, e por Paulo Lopes Silva, vereador da Câmara Municipal de Guimarães com o pelouro da cultura, o padre discursou sobre o percurso filosófico do intelectual nascido na Lixa, concelho de Felgueiras, em 1883, desde o anarquismo, ao “criacionismo”, não “no sentido bíblico”, mas no sentido de que “as cousas são muito mais do que as cousas”, como ele dizia naquele português antigo”, até a um “humanismo personalista” e cristão, fruto da sua reconversão ao catolicismo em 1935, e até “socialista no sentido mais profundo filosófico, muito mais do que político”.

“Nesse livro, ele define o “bom comunista”, quer seja o comunista de Platão ou o comunista da vida monacal do cristianismo, mas denuncia a forma totalitária de expressar o comunismo que o bolchevismo na Rússia estava a criar entre os russos”, realça, explicando que o livro de Coimbra deriva da ideia de que, na Rússia daquela altura, o homem era “o de sempre”: “um homem que deve ser dignificado porque tem uma função fundamental, como criatura à imagem de Deus, e também de pensamento”, “não um homem de cousas, mas um homem de espírito”, “um homem concreto, como o de Unamuno, influência bem presente em Leonardo Coimbra, que está de carne e osso na política, na história, na filosofia, na arte, no trabalho em todos os momentos da vida”, completa.

A propósito desse livro, Francisco de Oliveira vinca as denúncias quer da Rússia bolchevista, quer do fascismo italiano e do nazismo alemão, bem como as “deturpações daquilo que se entende por socialismo ou cristianismo”, ideologias com “coisas muito parecidas”, embora divergentes “naquilo que tem a ver com o transcendente, a que muitos socialistas renunciam”.

O sacerdote lembra também o distanciamento de Salazar, depois de uma expetativa de regresso de “áurea espiritual” ao país com o Estado Novo, tal como Fernando Pessoa. “Ambos partilham uma dimensão espiritual, mas rapidamente quer um, quer outro se apercebem que estão perante fascismos e separam-se imediatamente de Salazar”, diz.

Na sua vida, entre 1883 e 1936, Leonardo Coimbra esteve ligado à fundação da Renascença Portuguesa, movimento cultural surgido em 1912, no Porto, foi, como membro do Partido Republicano Português, ministro da Instrução Pública, em 1919 e 1923, tendo criado as designadas “universidades populares”, fundou a Faculdade de Letras da Universidade do Porto e foi, para Francisco Oliveira, “um filósofo extraordinário e maravilhoso”, que contraria o “preconceito” de Portugal enquanto país que “não sabe filosofar”, até expresso por figuras que admira, como Tolentino de Mendonça, poeta e cardeal da Igreja Católica.

“O cardeal Tolentino de Mendonça, apresentando qualquer coisa sobre a poesia, dizia que Portugal não era um país de filósofos, mas de poetas. Discordo, por mais que tenha admiração pela sua escrita e pela sua poesia, belíssima. Portugal é um país de filósofos em muito marcados pela existência concreta, pela forma lírico-poética de ser e de estar na vida e de profunda reflexão”, vinca.

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