Não há reforma que (te) valha. A menos que poupes
A aspiração em chegar à idade da reforma é a de poder viajar e desfrutar, sem preocupações, da vida familiar. Todavia, não é a realidade que grande parte dos portugueses encontra. Grande parte dos que chegam a idades entre os 50 e os 62 anos questiona muito como será quando se reformarem. É, a partir desse momento, que as pessoas deixam de trabalhar e passam a receber uma pensão paga pela Segurança Social, que em termos económicos, trata-se da transferência de rendimento conseguido durante a vida ativa dos trabalhadores para o momento em que deixam de trabalhar, permitindo-lhes assim equilibrar o nível de consumo ao longo do ciclo de vida.
A reforma sucede pelo menos ao longo de ¼ da nossa vida
No ano de 2014, a idade da reforma subiu de 65 para 66 anos e de 2016 em diante passou a estar associada à evolução da esperança média de vida. Os anos passam e este indicador ganha uma nova forma, tal como a idade estabelecida para a reforma. Em 2021, passou a ser 66 anos e seis meses. Assim, se os dados provisórios relativos à esperança média de vida aos 65 anos no triénio 2018/2020, divulgados pelo INE em novembro se confirmassem, a idade da reforma em 2022 iria subir para os 66 anos e sete meses. No entanto, a pandemia ascendeu o número de mortes no último ano e nos primeiros meses de 2021, o que pode levar a uma revisão em baixa do indicador, e poderá afetar a fixação das idades de reforma em 2022 e 2023.
Segundo as estatísticas, dados do PORDATA, a pensão média em Portugal é 4.578,30, ou seja, cerca de 330 euros/mês, tendo em conta os montantes adicionais pagos nos meses de julho e dezembro de cada ano, o que corresponde a 35% do salário médio dos portugueses (943,3 euros). Um valor baixo e que, segundo a sondagem do Instituto BBVA de Pensões, de 2019, 92% das pessoas abrangidas pela pensão de reforma não considera o valor adequado. E se esse valor não é satisfatório, suponha-se o das pensões mínimas no regime geral de Segurança Social que variam entre € 275,30 (mais € 1,91), para menos de 15 anos de descontos; € 288,79 (mais € 2,01), para 15 a 20 anos de descontos; € 318,67 (mais € 2,22), para 21 a 30 anos de descontos; € 398,34 (mais € 2,77), para 31 ou mais anos de descontos. Para estas pessoas, são cerca de 25 anos das suas vidas a viver dessas condições.
São cerca de 20 anos, numa fase da vida em que a saúde diminui, a dependência aumenta e, consequentemente, também as despesas. É certo que todos gostariam de receber uma pensão de reforma, pelo menos, equivalente ao que se estava habituado a receber durante a vida ativa, mas é o que menos acontece. Se não fossem os apoios da Segurança Social, das instituições de solidariedade social e das famílias, a maioria não conseguiria sobreviver com o que recebe ao fim do mês. É o que se conclui das conversas com os portugueses reformados e com os voluntários que os assistem.
A Associação de Reformados e Pensionistas de Guimarães é uma entidade que além de espaço de convívio e dos vários eventos gratuitos que desenvolve para entreter os aposentados, apoia no preenchimento de papeladas e até com descontos em consultas e assistência médica. António Lopes é o presidente desta associação e vai ajudando muitos casos e ouvindo muitos desabafos. A palavra que lhe surge para descrever a realidade económica derivada das pensões é “uma miséria”. “Muitos foram vítimas do fator de sustentabilidade, reformas que levaram um corte de cento e tal, estão a receber 300 e tal euros. Ninguém consegue viver com isso”. Uma situação que leva a que muitos recorram à Associação para que os ajude.
Ao ver este tipo de realidade tão próxima de si, António Lopes insiste na ideia de que os mais jovens devem começar a pensar cedo no seu futuro e ter um papel ativo na preparação da sua reforma.
Convencidos de que as pensões de velhice é uma vivência distante, esse é um assunto que ainda não ocorre na mente ou conversas dos mais novos. A mentalidade que vigora é: carpe diem.
Evitam pedir ajuda à família porque não querem ser um “peso”
Lucinda Alves, recorda um momento para si inquietante em que uma senhora, na sua passada à farmácia pede ao farmacêutico que lhe dê apenas os medicamentos “realmente importantes”, porque não tinha dinheiro para os demais, apesar de também necessários. Algo que acontece com alguma frequência, mas que pode ser um choque para quem não está nessa pele. Agora com 76 anos, Lucinda trabalhou em teares ao longo da sua vida e descontou desde os 12 anos, com uma pausa de 15 anos em descontos por ter de cuidar dos filhos e da mãe. Quando se lhe pergunta se acha justa a quantia que recebe, de 375 euros, a reformada não se queixa. “Para os anos que eu descontei, vamos indo. Eu não deixei muitos anos de dinheiro, então não posso dizer que é injusto. Mas há muita gente que desconta vários anos e só se reforma aos 65 e não recebe uma reforma justa”, julga.
Segundo uma sondagem do Instituto BBVA de Pensões, sobre a preparação da reforma da geração do “baby boom” em Portugal, 83% das pessoas entrevistadas consideram que faz sentido poupar para a velhice sendo que, a maioria dos entrevistados revela preocupação com o risco de perda de mobilidade ou da saúde mental durante a velhice. Tal como grande parte dos inquiridos, a mentalidade da reformada sempre foi de se precaver e de que devia poupar para mais tarde. Agora que o “mais tarde” chegou, está tranquila. “Como sempre pensei muito por olhar pela minha vida, poupei e tenho o meu bocadinho que me permite não preocupar os meus filhos. Eu não sei como alguns vivem. Uma pessoa no seu dia a dia gasta muito com a água e luz; ainda agora paguei o IMI que foram 180 euros, seguro da casa perto dos 200 euros, condomínio 25 euros, 150 euros de uma vacina que tenho de tomar, que vem de Lisboa, mais medicação. Felizmente poupei a vida toda até para que, se um dia precisar de ir para um lar, não dê despesa aos meus filhos. Tenho o suficiente”.