skipToMain
ASSINAR
LOJA ONLINE
SIGA-NOS
Guimarães
24 novembro 2024
tempo
18˚C
Nuvens dispersas
Min: 17
Max: 19
20,376 km/h

"Quebrar o medo": os telemóveis não têm que deixar a cabeça feita num OITO

Pedro C. Esteves
Sociedade \ terça-feira, julho 20, 2021
© Direitos reservados
Projeto OITO da Escola de Medicina da UMinho está a capacitar idosos a usar o telemóvel e promover o bem-estar e saúde. Fazer com que “se perca o medo de tocar no telemóvel" é um dos objetivos.

Helena Mourão abriu o Avaliador de Sintomas P5 e começou a elencar alguns problemas: dor de cabeça e formigueiro (que sente há três dias). Indicou também que tomou um analgésico para aliviar o desconforto. Todos os dados vão ser enviados para uma equipa multidisciplinar (médicos, enfermeiros, psicólogos e nutricionistas) que vão dar o melhor seguimento ao pedido. Só que este não vai chegar lá. É que Helena está bem de saúde, está apenas a testar o preenchimento do formulário num espaço amplo em pleno Pavilhão Multiusos. A reformada é uma dos cinco alunos que, com um smartphone à mão, ouvem com atenção a investigadora Anna Quialheiro.

E o que leva Helena e outros quatro vimaranenses ao Multiusos numa segunda-feira à tarde? O projeto OITO (Oficinas de Inclusão Tecnológica Online), uma iniciativa para dar mais competências digitais à comunidade com mais de 55 anos. A missão é simples: capacitar os participantes a usar o telemóvel na promoção do seu bem-estar e saúde. Em Guimarães estão envolvidos neste projeto o ICVS (Investigação em​ Ciências da Vida e Saúde) e o P5, bem como a Escola de Medicina da Universidade do Minho que os aglomera no seu cluster, e o projeto Vida Feliz da Tempo Livre.

A turma de Helena e uma outra em Serzedelo são as primeiras deste projeto no concelho – já passou por Paredes de Coura. São oito oficinas distribuída por quatro semanas onde se quer que “se perca o medo de tocar no telemóvel”. A palavra de ordem é inclusão. “Mostrar que tecnologia pode facilitar compreensão de algumas coisas é o objetivo”, complementa Ana Quialheiro.

Ver vídeos no YouTube, aprender a utilizar o Whatsapp ou monitorizar a atividade física são algumas das valências que os utentes levam para casa no final de cada sessão. Cada “aluno” leva um pequeno livro com dicas e informações acerca das aplicações para poder realizar algumas tarefas em casa. Helena Mourão valoriza as horas passadas na companhia dos colegas e dos formadores; veio “para aprender e ‘sacar’” o que conseguir. O caso da vimaranense é sintomático da importância desta ação. “Sentia que tinha dificuldade em lidar com os telemóveis, com as tecnologias, achava que não era uma pessoa para isto”, explica. E depois “há uma certa “preguicite” que nem sempre ajuda a relação com a tecnologia. Mas com o grupo, num espaço recatado da arena que por estes dias serve de centro de vacinação, é “mais fácil”. “Pelo menos dá para aliviar a cabeça”, atira.

Começar de novo

As aulas não têm um programa rígido. Quando os alunos entram para a aula também trazem problemas, realidades. “A questão do certificado [digital de vacinação] não estava na programação, mas calhou e reservamos tempo para isso”, explica Anna Quialheiro. A investigadora desenvolveu um programa de inclusão digital e utilização da tecnologia no Brasil e adaptou a metodologia para Portugal. Os primeiros passos são semelhantes e o feedback também: “Eles ganham o telemóvel do filho, do neto, emprestado, é pequeno, eles têm receio de tocar”.

Nenhum dos telemóveis usados pelos alunos é destinado a “seniores”. Anna acredita que é importante desmistificar a ideia de que os smartphones só podem ser usados por “nativos digitais”: “Isso exclui e é discriminatório”. O trabalho começa logo por explicar para que serve o botão de “voltar” para o ecrã inicial: é importante que os utentes percebam que se fizerem alguma “asneira” é sempre possível começar de novo.

“Desta porta para dentro é uma maravilha”

João Rocha ainda não perdeu esse medo. O telemóvel que usa nas aulas não tem cartão. “Tenho o outro, o normal, nem tinha muita vontade de pegar nisto, é por medo, receio de fazer asneiras”, confessa. Com 63 anos e ainda no ativo só se sente confortável para navegar na internet da porta do Multiusos para dentro. “Estou a habituar-me”, repete.

Quatro semanas e oito sessões depois, usar o teclado e escrever “já não é problema”. “Vim para cá para aprender, mexer. Todas as aulas foram importantes”. Nesta aula, para além de aprender a utilizar a Avaliador de Sintomas do Centro de Medicina Digital P5, também fez exercício físico e testou a aplicação Google Fit para contar os passos numa curta ingressão pelo Multiusos.

Se houvesse mais aulas, frequentava. “Tenho mesmo interesse em saber trabalhar com isto”, indica. João e Helena vão ter esta quarta-feira a última aula. Mas o trabalho continua. O contacto não cessa aqui. Um grupo de Whatsapp foi criado e a comunicação com Anna está assegurada. As tardes de segunda e quarta é que vão ser menos preenchidas. João tem pena: “Desta porta para dentro é uma maravilha. Avanço muito rápido”.

Podcast Jornal de Guimarães
Episódio mais recente: O Que Faltava #83