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“Os vimaranenses estão cada vez a ganhar menos que a média dos portugueses”

Redação
Sociedade \ terça-feira, maio 13, 2025
© Direitos reservados
“Não quero entrar em frases feitas sobre o poder que corrompe, mas a verdade é que quase quatro décadas do mesmo poder enraízam hábitos”

Sempre na oposição mas nem por isso menos ativo. Aos 37 anos o economista Tiago Laranjeiro continua tão interventor como quando, em 2013, então com 24 anos, juntamente com o colega Ary Ferreira da Cunha venceu o Debate Competitivo Universitário, uma tradição académica com grande relevância nos países anglófonos. Do curriculum traz a liderança da JSD e a liderança da Bancada Parlamentar do PSD na Assembleia Municipal. Atual vogal da Comissão Política do PSD de Guimarães, afirma-se como alguém como “voz própria” cultivando o hábito de intervenção nos jornais locais. Nesta entrevista, enquanto se descola da ideia da cidade dos 100 mil habitantes, Tiago Laranjeiro explica como o a política concelhia esgotada do Partido Socialista está a fazer Guimarães “perder terreno”.       

ENTREVISTA: Esser Jorge Silva e José Luís Ribeiro

 

Campeão do mundo no “Debate Competitivo Universitário” em 2012, e nacional duas vezes, em 2012 e 2015, juntamente com a sua irmã. Vão longe os tempos de vitórias, não é?

Esses foram tempos muito bonitos. Em que fundei, com colegas e amigos, a Sociedade de Debates da Universidade do Porto. Olhe, faz muita falta essa prática nos dias de hoje, de expor as pessoas a opiniões diversas das suas, de colocarmo-nos nos “sapatos” dos outros para defender, por vezes, até posições contrárias às nossas opiniões pessoais, no âmbito de um “desporto”, o debate. Que no Reino Unido, por exemplo, é um hábito instituído nas universidades há séculos – até Churchill nas suas memórias fala do ciúme que tinha de amigos que tinham passado pelo debate competitivo, ele que nunca estudara na universidade.

 

Interessante…

Para além de termos fundado essa associação, que ainda hoje está viva e recomenda-se, e ressuscitado o movimento nacional de debate competitivo universitário, termos integrado Portugal no circuito do debate competitivo internacional. A participação em várias competições internacionais, de Cambridge e Oxford, ao Campeonato do Mundo em Berlim, a formações, até a uma participação em Macau, foram o meu “Erasmus”, como costumo dizer. Já o torneio nacional de 2015, aquele em que participei com a minha irmã, foi “a family thing”. Foi muito giro.

 

Há quem veja em si um conservador envergonhado. Consigo também “não é não!” ou os extremos também têm lugar?

Quando nos tentamos classificar em caixinhas acabamos por estar a limitar, a nós e aos outros. Não me vejo como um conservador, nem como um envergonhado… Agora, em relação à provocação, penso que é preciso ter humildade e respeito pela vontade do povo expressa pelo voto. E dialogar com todos. Se daí resultam soluções ou não, é outra questão. Nesta legislatura, ficou provado que o Chega não quis fazer parte de nenhuma solução, desde a primeira hora, para a eleição da Mesa da Assembleia. Mas esta é uma posição pessoal.

 

Então como se define politicamente?

Sou personalista, defendendo o valor absoluto da dignidade da pessoa humana. Que implica a liberdade, nas suas mais diversas expressões. Sou também fortemente a favor da igualdade de oportunidades como uma condição para a liberdade. Que entendo como a lotaria da família em que nascemos, e, portanto, dos meios económicos e sociais, não pode limitar o acesso a oportunidades e serviços básicos, para que cada pessoa se desenvolva.

 

E qual é o lugar do Estado?

Defendo que o Estado é um “mal necessário”, para proteger o homem de ser presa de outros homens e de outros Estados, e por essa via detém o monopólio da violência, e da administração da justiça e do “estado de Direito”. Mas que o Estado existe só para servir as pessoas, e não o contrário. Portanto, também me oponho fortemente à ideia de que a sociedade se muda por decreto, por isso sou avesso a experimentalismos sociais através de leis. O conjunto destas preferências faz com que a área política em que me sinta mais confortável seja no centro-direita, no PSD.

 

Tem uma vida de atividade política no PSD mas sempre na oposição. Para chegar ao poder o PSD tem de ser igual ou diferente do PS?

Nasci em 1988, o último ano completo de mandato de António Xavier, eleito pelo PSD. Pelo que não me lembro de outra realidade senão o PS na Câmara, realidade que vivemos há 36 anos. Há duas perspetivas possíveis: a dita “pragmática”, que diz que o poder não se ganha, mas perde-se, dirá que para ser poder basta esperar e não cometer erros, portanto postularia que o PSD fosse igual ao PS. E uma outra perspetiva, talvez mais idealista, mais arriscada, mas que me parece mais correta, que definiria que, se for para ser igual, não valeria a pena mudar. Eu defendo que Guimarães precisa mudar.

 

Mudar por mudar não pare ser uma razão… Quais as razões substantivas para mudar?

Os 36 anos de PS fizeram, naturalmente, coisas boas por Guimarães, mas é uma receita que está esgotada. Nos últimos anos, Guimarães perdeu terreno, primeiro para Braga, depois para Famalicão, agora até para Santo Tirso. Guimarães é, a par com Barcelos, o concelho do quadrilátero em que o rendimento médio se afastou da média nacional. Ou seja, os vimaranenses estão cada vez a ganhar menos que a média dos portugueses. Isto, naturalmente, é também reflexo das opções políticas locais.

Fernando Alberto chegou a referir o facto d Guimarães ser um concelho “sociologicamente socialista”. Faz sentido pensar assim nos dias de hoje?

Não acredito nesses determinismos “sociológicos”. Guimarães é “sociologicamente” diferente de Famalicão, para aqui ao lado se ter operado consistentemente essa mudança? Até porque o PSD e o CDS já ganharam por diversas vezes eleições em Guimarães, mesmo em cenários difíceis, como foi o caso das legislativas de 2015, em que, mesmo depois das dificuldades do período da “troika”, Passos Coelho vence aqui as legislativas, com mais quase 6 mil votos que António Costa.

 

É comum escutar-se que as elites económicas próximas do PSD estão muito satisfeitas com o PS. O que falta ao PSD de Guimarães para captar a confiança dessa elite? 

Em Portugal, as elites são sempre próximas do poder. Vê-se isso muito a nível nacional, com a dependência histórica que há de vários segmentos das elites, mesmo as económicas, de rendas do Estado. O mesmo acontece à escala local. Principalmente quando uma fatia tão grande da riqueza das elites portuguesas se concentra no imobiliário. E o imobiliário, a habitação, a construção, estão tão dependentes das veleidades do poder. Muitos interesses económicos de elites locais estão dependentes de decisões das vontades políticas de quem está na Câmara, e atribui licenças de construção de forma mais ou menos sustentada.

 

Há uns anos falou-se na cidade dos 100 mil habitantes como meta. É possível ou tal não passa de uma utopia que o urbanismo dúplice – bonito no centro urbano e feio nas freguesias – não permite?

Essa é uma questão complexa. Tenho dúvidas que seja essa a vontade dos vimaranenses. Se olharmos aos dados dos Censos 2021 e se aceitarmos a definição do INE, que classifica como a cidade o conjunto das freguesias que estão definidas como pertencendo à sua área urbana (que abrange o que normalmente consideramos como o centro urbano e toda a extensão até Pevidém e Gondar), então temos mais de 70 mil pessoas a viverem na cidade. Estamos próximos desse objetivo. Se, por outro lado, olharmos ao crescimento freguesia a freguesia, usando os mesmos dados dos Censos de 2021 por comparação a 2011, então vemos que o conjunto destas freguesias perdeu população. E que as freguesias que mais cresceram foram as que estão mais nas “margens” do concelho. Mas a verdade também é que estes estudos cobrem o grosso do período entre 2001 e 2017, em que praticamente não houve nova construção na cidade. A minha opinião é que se deve dar condições para que todo o concelho cresça, e liberdade às pessoas para se fixarem onde entenderem. Isto implica consolidar áreas de construção onde ela já existe, e oferecer soluções de infraestruturas, mobilidade, transportes públicos, para que todo o concelho esteja mais bem interligado, entre si e com o exterior. E isto não tem sido feito. Ou melhor, tem sido mal feito.

 

Gradualmente parece desaparecer uma massa crítica que se importava com as decisões da terra. O que se deve fazer para recuperar a atenção dos vimaranenses para a coisa pública?

Se o PS ganhar as próximas eleições, serão 40 anos de poder. Não quero entrar em frases feitas sobre o poder que corrompe, mas a verdade é que quase quatro décadas do mesmo poder enraízam hábitos. E a crítica é uma chatice. Quem é alvo de crítica ressente-se, afinal somos todos animais, e um animal acossado contra-ataca. E, quando a massa é pequena, em número de pessoas e em dinheiro, a malta que é contra-atacada, acanha-se. Portanto, há pouca massa, e a crítica é mal recebida, penso que é mais que natural que as pessoas se acomodem. A solução? Olhe, desde logo passa por mudar alguma coisa: se não acredito ser possível mudar os vimaranenses, é possível mudar o poder, para alterar a sua relação com a coisa pública. E termos responsáveis políticos que sejam mais tolerantes com a crítica, com uma outra cultura democrática, mais aberta, como é o caso de Ricardo Araújo.

 

É uma pessoa de fé?

Sim. Embora a fé não seja uma linha reta ou uma constante. Por vezes é centelha, noutras um incêndio descontrolado. No fundo, é uma jornada interior permanente, uma luta constante contra as minhas próprias dúvidas, até contra a soberba interior. Mas persistir no caminho, crendo que há algo maior que me guia, mesmo quando tropeço ou questiono.

Para um católico confesso, hoje é um dia triste…

Estamos a fazer esta entrevista no dia em que soubemos da morte do papa Francisco. É incrível que o papa Francisco tenha falecido na segunda-feira de Páscoa. Depois de semanas internado, e depois de ter feito questão de participar nas celebrações pascais. É como se estivesse à espera de cumprir algo, antes de partir. Uns interpretarão como coincidências. Outros como a força da vontade. Outros como um sinal de Deus para os Seus escolhidos. O papa Francisco foi testemunha viva do Evangelho, de ser católico, no apelo universalista da Igreja, de chegar a todos. Principalmente aos excluídos e marginalizados. De mostrar que a mensagem de salvação, do amor de Cristo, de apelo à conversão interior, é para todos, e que não há escolhidos. E esse testemunho é, ainda em 2025, um testemunho radical e revolucionário, como há dois milénios atrás.

 

Figuras da Igreja que o inspiram?

Esta é fácil, porque são muitas. Desde logo, o papa Francisco. Inspira e desafia, porque muitas vezes a minha predisposição não estava alinhada com algumas das posições que defendia, e, portanto, levava-me a questionar-me. Mas também me inspiram muitas das ideias do papa Bento XVI, como a da necessidade de os católicos fortalecerem a sua fé, para estarem preparados para enfrentar um mundo relativista, conformado e que contemporiza. Ou São Josémaria Escrivá, que conheço através daquele pequenino livro que escreveu, "Caminho", cheio de pérolas de sabedoria cristã, e também um permanente desafio. Ou, mais próximos, inspiram-me muitas vezes atitudes de várias pessoas da Igreja com quem me vou cruzando. O Padre Delfim Afonso, pároco em Vila do Conde, o Padre Henrique Ribeiro, com a sua energia carismática; o Padre Pedro Sousa, que conheço há vários anos, sempre com observações profundas e inteligentes que nos "atacam"; ou o Padre Miguel Rodrigues, que me foi capaz de voltar a mostrar a face misericordiosa de Deus, numa situação difícil. Ou D. José Cordeiro, que numa atitude tão simples, como a que vi ter na celebração do dia da Irmandade dos Santos Passos, quando as crianças do colégio Nossa Senhora da Conceição lhe foram oferecer uma lembrança, e começaram a brincar com as suas vestes e o seu báculo, e o Sr. Arcebispo, numa simplicidade desarmante, alinhou e brincou com as crianças naquele momento. Na verdade, se calhar a inspiração é mesmo o Espírito Santo, que continua presente aqui na terra por meio destes, e de muitos outros, seus intermediários.

 

5 respostas rápidas

- Sugestão gastronómica?

Uma carninha da Quinta do Souto cai sempre bem!

 

- Que livro está a ler?

Neste momento, “Fundação”, de Isaac Asimov. E à espera de “Coisas Ruins”, do meu amigo e vimaranense João Zamith, que é lançado a 12 de maio.

 

- A música que não lhe sai da cabeça?

“Debí tirar más fotos”, de Bad Bunny, porque me alerta para estar sempre mais presente. Se escolher o hino do CDS-PP cantado pela Dina seria politicamente incorreto, não? É que eu e os meus filhos adoramos ouvi-lo...

 

- Um filme de referência?

“Braveheart”.

 

- Passatempo preferido?

Estar próximo da natureza, e da água, a caminhar ou correr.

[Conteúdo produzido pelo Jornal O Conquistador, publicado em parceria com o Jornal de Guimarães. Entrevista da edição de abril de 2025 do Jornal O Conquistador.]

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