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Pode o rock ser celebratório em 2024? Com o sumo dos Lemon Twigs

Tiago Mendes Dias
Cultura \ terça-feira, maio 28, 2024
© Direitos reservados
Herdeira da explosão criativa dos anos 60, mas com nuance suficiente para se encaixar no século XXI, a energia genuína da formação de Nova Iorque deixou o CCVF a vibrar na estreia em Portugal.

Até na primeira saudação ao público a banda transpirava entusiasmo: “Boa noite, Guimarães”, proferiu Danny Ayala em português, com um ditongo quase perfeito. Estava de baixo a tiracolo, mas também pronto para fazer soar as teclas. Ser-se multi-instrumentista é o padrão de uma banda que floresce ao vivo enquanto quarteto, embora com veia criativa ancorada nos irmão D’Addario: Michael e Brian, de cabelos longos e lisos, bem seventies.

Os timbres das guitarras que brindaram os cerca de 200 espetadores no palco do Centro Cultural Vila Flor (CCVF) também evocaram a década de 70 do século XX, mas a progressão dos acordes e as harmonias vocais homenageiam o ponto de viragem da música popular ocidental: a década de 60, com o pop e o rock que emergiram pelas vozes dos Beach Boys ou pelas melodias e riffs do contingente britânico, Beatles à cabeça. Foi, aliás, com uma cover de “Hold me tight”, canção do álbum With the Beatles (1963), que os nova-iorquinos se despediram de um concerto que deixou o público contagiado, a sorrir e a agitar o corpo.

A estreia dos The Lemon Twigs em Portugal resume-se então a hora e meia de celebração: celebração da herança musical que os irmãos D’Addario veneram, das peripécias do quotidiano, dos altos e baixos de vidas que seguem rumo a um destino comum. Mas essa celebração é mais do que mera reciclagem desses titãs do pop-rock: as mudanças de ritmo e melodia emergiam subtilmente a meio das canções, até mais do que uma vez, principalmente nas mais longas e enérgicas, como “They don’t know how to fall in place”, uma síntese de influências dos anos 60 e 70, com vários registos vocais, característica que define, aliás, a música da banda e o concerto de sábado à noite.

Outro traço da banda é o pleno domínio de vários instrumentos pelos irmãos D’Addario, por Danny Ayala e por Reza Matin, baterista na maior parte do tempo. A fluidez com que tudo acontecia manifestava-se no humor que ocupava os espaços entre canções: ora com os vários sotaques de Michael, ora com a comparação do CCVF a um cenário de “Inception”: a banda, afinal, estava a tocar num palco dentro de outro palco. Houve até uns poucos que quiseram assistir ao concerto sentado, com vista lateral, desde a plateia do Grande Auditório Francisca Abreu.

De todos os ingredientes que consubstanciam o sumo dos The Lemon Twigs, o power pop, pela potência sonora que se exige ao vivo, é aquele mais sobressai, desde “I wanna prove to you”, do álbum de estreia, Do Hollywood (2016), até “My golden years”, do novo e esperançoso álbum A dream is all we know (2024), passando por “The one”, de Songs for the general public (2020), trabalho em que os nova-iorquinos se entranham no glam rock dos anos 70.

Tecnicamente, pode-se dizer que essa hora e meia de celebração foi interrompida: assim aconteceu quando o quarteto deixou o palco para o encore, e Brian d’Addario regressou de guitarra acústica, para duas interpretações a solo. A de “When winter comes around”, do mais aclamado e introspetivo trabalho dos The Lemon Twigs, Everything Harmony (2023), foi o momento mais tocante de uma noite que nem parecia 2024. Em tempos de crispação e confusão social, quatro músicos despertaram em quem os viu e ouviu o lado mais ingénuo das emoções.

 

Um concerto rock do século XXI à moda antiga, com os The Lemon Twigs ©Paulo Pacheco/A Oficina

Um concerto rock do século XXI à moda antiga, com os The Lemon Twigs ©Paulo Pacheco/A Oficina

 

Música de cantautora… com Allegra Krieger

Na meia hora que antecedeu a performance dos The Lemon Twigs, o palco esteve entregue a Allegra Krieger e à sua guitarra, ora acústica, ora elétrica, consoante o registo que pretendia transmitir. Foi precisamente em Guimarães que a artista de Nova Iorque encerrou a sua primeira digressão europeia, à boleia do quarto álbum de estúdio “I keep my feet on the fragile plane”, lançado em 2023.

Apesar da simplicidade instrumental da sua música, a cantautora tinha detalhes suficientes na manga para captar a atenção do espetador do princípio ao fim: as subtis mudanças de acordes ou de ritmo em canções como “Lingering” ou “Nothing in this world ever stays still” ancoravam a ideia de uma história a desenrolar-se aos ouvidos dos espetadores, pese a quietude da atuação.

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