É preciso “vontade” para Teatro Oficina ser prioridade - Sara Barros Leitão
Com os 30 anos no horizonte – celebra-os em 2024 -, o Teatro Oficina atravessou 2022 num contexto inédito: trabalhar com uma direção artística convidada para um prazo de um ano. Coube a Sara Barros Leitão, atriz, encenadora e dramaturga, assumir pela primeira vez esse papel: fê-lo de 03 de janeiro a 14 de dezembro, dia da última sessão das anti-leituras, uma das iniciativas promovidas pela companhia nesse intervalo.
Concluída a jornada, a criadora de Monólogo de uma mulher chamada Maria com a sua patroa (2021) vê na companhia vimaranense “todas as capacidades” para um futuro a “produzir os seus próprios espetáculos, o seu próprio pensamento, o seu próprio projeto artístico”, sem se limitar a ser “estrutura de coprodução”.
“Não há dúvida de que há muito caminho para fazer, mas existem todas as capacidades: temos o espaço, temos as equipas, temos o financiamento. Só precisa mesmo de vontade. E essa vontade precisa de ser institucional para que o Teatro Oficina possa ser prioridade dentro da Oficina”, disse ao Jornal de Guimarães, no balanço a uma experiência que foi novidade na sua carreira.
Além dos eventos de leitura informal, em que reuniu quinzenalmente dezenas de pessoas no Espaço Oficina (EO), junto ao tardoz do centro comercial Villa, Sara Barros Leitão promoveu, em maio, a iniciativa Assalto ao Arquivo, onde reuniu materiais relativos às dezenas de espetáculos da companhia nos seus 28 anos de vida – adereços ou guiões -, avançou com a anti-biblioteca, para possibilitar que o EO seja um espaço onde as pessoas podem ler e estudar teatro, orientou sessões de formação para pessoas de várias faixas etárias - Oficinas do Teatro Oficina (OTO) – e encenou Há ir e voltar, a peça de 50 minutos ali exibida entre 22 de setembro e 09 de outubro.
Em retrospetiva, Sara Barros Leitão vê 2022 como “um ano muito feliz e de enorme aprendizagem”, no qual deu “o máximo que podia”, mas, ao mesmo tempo, “muita coisa ficou por fazer”. “Sei que não consegui fazer tudo o que sonhei”, confessa.
Ao mostrar-lhe o que é “estar dentro de uma instituição”, a experiência também ajudou a artista a perceber que o trabalho como diretora artística, de “levar para a frente uma instituição” que é “maior do que o seu projeto artístico”, com “uma história que veio antes”, “não é o lugar” para si.
“Compreendi melhor muitas coisas que, como cidadã, como ativista, como pessoa que trabalha na cultura, criticava logo à partida e agora compreendi de onde é que elas vêm. Percebi o outro lado da coisa. Isso, para mim, foi uma grande aprendizagem pessoal”, realçou.
A “reconstrução” do Espaço Oficina também a marcou. Quando assumiu a direção artística da companhia, aquele lugar estava “deserto, inabitado, inabitável”, o que levou a “muito trabalho invisível” para o “reerguer”. Mesmo com o ruído de fundo das obras, que dificultou “os acessos”, Sara Barros Leitão frisa que a reativação daquele lugar é também um contributo para a “reconstrução da ideia” de uma companhia que deve, no seu entender, ser a “companhia profissional” de Guimarães.
“Espero que continue a lógica de Teatro Oficina como companhia da cidade, como companhia que serve a cidade, que faz projetos para servir a cidade, que se projeta também a nível nacional, mas é a companhia profissional de Guimarães”, realçou.
Na quinta-feira, a autora escreveu uma nota de despedida na rede social Instagram, recordando várias das peripécias que marcaram o 2022 do Teatro Oficina.
“Um dia criámos relações com três lares de idosos e demos aulas de teatro, um dia cantámos a Grândola à meia noite do 25 de abril, um dia fomos a Fafe em visita de estudo para começar o novo espetáculo, um dia fomos ao armazém d'A Oficina recuperar antigos cenários da companhia e catalogámos, um dia organizámos em dossiers todos os documentos, fotografias, bilhetes e cartazes, um dia esgotámos em poucas horas as inscrições para a aulas de teatro”, escreveu, entre menções a vários outros momentos.