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“Uma empresa com investimento de centenas de milhões paga a via do Avepark”

Tiago Mendes Dias
Política \ sexta-feira, janeiro 06, 2023
© Direitos reservados
Presidente da Câmara crê que via “estratégica”, de 45 milhões de euros, vai elevar parque tecnológico para outro patamar na atração de investimento. Crescimento do transporte público é objetivo.

Domingos Bragança chegou ao executivo municipal em 1993 para trabalhar como vereador a tempo parcial, nas áreas das finanças e dos fundos comunitários. Assim se manteve até 2005, quando se tornou o número dois do poder socialista em Guimarães. Rosto do município desde 2013, o político crê que a nova estrada pode impulsionar o Avepark para outro patamar. Apregoa também o crescente uso do transporte público e sublinha a “entrega ao trabalho” como a característica que melhor o define, sem esquecer Pinheiro, o lugar onde começou a cultivar a “proximidade aos cidadãos”.

 

A passagem pela Universidade de Coimbra influenciou a sua participação política. Como é que se apercebeu da sua sensibilidade para o interesse público e de que, ideologicamente, se encaixava no PS?

Antes da academia de Coimbra, nos estudos do liceu, participava muito nas tertúlias e nos debates entre estudantes, muito informais. A vida política é ainda anterior. O meu pai foi presidente da Junta de Freguesia de Pinheiro. Com 12, 13 ou 14 anos, levava à casa das pessoas os documentos que o meu pai preparava. Nessa altura, já o ajudava a redigir cartas e a preparar documentação. Já fazia trabalho político sem saber, de proximidade ao cidadão. A nível autárquico, comecei como vereador a tempo parcial e assim me mantive por dois ou três mandatos.

 

São nove anos a liderar os destinos de Guimarães, depois de 20 anos a vereador. Que transformações se operaram num autarca com bagagem prévia de Câmara Municipal? Há alguma digna de nota?

A minha vida de vereador a tempo parcial foi quase a de um técnico. Fazia muito trabalho na área financeira, na área dos fundos comunitários, na área complementar da fiscalização e da contraordenação. Nos últimos dois mandatos de António Magalhães, fui vice-presidente. A diferença entre presidente e vereador é muito grande. Um presidente tem, por condição, a liderança. O rosto da Câmara é sempre o do presidente para o bem e para o mal. E não é só da Câmara, é de toda a comunidade. Mesmo que o presidente da Câmara não tenha competências diretas sobre o que se está a passar, é a ele que os cidadãos se dirigem para saberem o que se passa. O presidente da Câmara não tem competências diretas na saúde, no Hospital Senhora da Oliveira, mas as pessoas, e bem, querem saber o que é que o presidente da Câmara pode fazer para melhorar o hospital.

 

Logo que foi eleito, em 2013, colocou o ambiente no centro da sua ação e comunicação política. Seguiu-se a ambição de ver Guimarães Capital Verde Europeia (CVE), algo que não foi possível concretizar em 2020. O território obteve o quinto lugar entre as 12 candidaturas, mas a gestão dos solos, a mobilidade e a água foram lacunas identificadas pelos peritos. Como melhorar esses desempenhos?

A próxima candidatura a Capital Verde Europeia far-se-á em condições diferentes. Há um processo evolutivo da própria União Europeia (UE) de acrescentar novas exigências, que aprecia as dinâmicas, as iniciativas e as práticas dos governos locais. Estamos a preparar a candidatura para CVE em 2025. A vereadora e vice-presidente Adelina Pinto é responsável por liderar este processo…

 

No anterior mandato autárquico, Sofia Ferreira conjugava os pelouros operacionais do ambiente com a candidatura a CVE. Neste, a candidatura está a cargo de Adelina Paula Pinto. Qual o porquê da alteração?

É a pessoa imediatamente a seguir a mim que pode fazer a coordenação entre as diversas áreas e cumprir melhor este objetivo da CVE. Temos parques, jardins, espaços verdes, limpeza de resíduos entregues à vereadora Sofia Ferreira, mas o fundamental numa candidatura a CVE é a capacidade de mudar atitude e comportamentos. Mudar atitudes e comportamentos no âmbito do património natural e do ambiente tem a ver com educação e cultura ambiental. A educação está entregue à senhora vereadora Adelina Paula Pinto, daí uma grande razão para que seja a responsável por esta coliderança na candidatura a CVE.

 

O perito que analisou a questão da mobilidade sublinhou a parca utilização do transporte ciclável, aliada à falta de informação para a projetar no futuro. Há uma ecovia em redor da cidade, mas não há vias dedicadas a transporte descarbonizado nas ruas mais movimentadas. Veem-se mais bicicletas e trotinetes, mas o carro ainda reina. O que falta para se ver maior paridade no uso dos vários transportes?

Uma das prioridades da candidatura a CVE é a inversão das prioridades nas infraestruturas e na utilização de equipamentos. Para toda a UE, a prioridade nas cidades é sempre dada à pedonalização, depois à bicicleta, depois ao transporte público, rodoviário e ferroviário. Depois vem o automóvel particular. Quem quiser estar alinhado nas políticas da UE tem de seguir essa pirâmide de prioridades, mas isso não significa que, só porque queremos, toda a gente ande a pé, de bicicleta ou de transporte público. Para isso é preciso alterar as infraestruturas. É preciso fazer com que os cidadãos, em distâncias de cinco a 10 minutos, prefiram andar a pé, acima de 10 minutos, usem a bicicleta, e acima de 30 sirvam-se dos transportes públicos. E o que leva a uma boa utilização do transporte público? É as pessoas saberem que o transporte, a determinada hora, passa em determinado sítio. É a fiabilidade, é saberem que podem usar esse transporte, porque é seguro nos horários e frequências. As pessoas têm de sentir comodidade para se deslocarem, sabendo que, àquela hora, estarão no trabalho.

 

Então o caminho da Guimabus e do sistema de mobilidade da CIM do Ave é oferecer cada vez mais horários?

Mais horários e a certeza desses horários.

 

“O que leva a uma boa utilização do transporte público? É as pessoas saberem que o transporte, a determinada hora, passa em determinado sítio. (…) As pessoas têm de sentir comodidade para se deslocarem, sabendo que, àquela hora, estarão no trabalho”

 

Na questão dos solos, o relatório menciona como fraqueza a propriedade privada das margens dos rios, ao falar da recuperação dos cursos de água e da participação pública para esse fim. Crê que as ecovias, ao removerem barreiras entre os cidadãos e os rios, depois de anos de poluição pelas indústrias e de difícil acesso às margens vão incentivar um maior cuidado perante essas áreas?

As ecovias ao longo dos rios vão aumentar a nossa sensibilidade para a fauna e para a flora riquíssimas, bem como para as levadas e para os moinhos. Queremos que esse património seja reabilitado. E depois queremos ligá-as à ecovia da cidade. Se não houver essa ligação à ecovia da cidade, a ecovia do Ave ou a ecovia do Selho perdem-se. Ardão, em Silvares, ligar-se-á facilmente à ecovia da cidade desportiva. A ecovia de Pevidém também fará essa ligação à cidade desportiva. E estamos a trabalhar com a Câmara Municipal de Famalicão numa ciclovia ao longo da EN 206. A IP tem uma dotação de sete a oito milhões de euros para intervir na estrada. Entregará esse valor às câmaras para depois intervirem num processo mais avultado ao longo da EN 206.

 

A aquisição de terrenos junto aos rios tem sido morosa? Como têm reagido os proprietários?

Em 80% dos casos, está a ser simples convencer os proprietários. Outros têm mais receio e tornam as coisas mais difíceis, mas depois de conversarem aceitam que estamos todos a ganhar. Ganha o concelho de Guimarães, mas também os proprietários, porque depois fazemos vedações. No fundo, estamos também a proteger as propriedades. Não foi precisa qualquer expropriação até agora. As juntas de freguesia estão a ajudar muito, com muita proximidade.

 

A propósito de solos, está projetada a nova via do Avepark. Ainda vê a obra como premente? A maior rapidez de acesso ao Avepark vai compensar perdas de solos agrícolas, por exemplo, ainda para mais quando se fala nas cadeias de alimentação locais?

O projeto está concluído. Só com projetos concluídos sabemos o valor-base da obra. É de 39,7 milhões de euros. São dados concretos. Ao início, fizemos estimativas sem projeto. Isso inclui a rotunda em Ponte, a ciclovia segregada e a via segregada para passeio e saídas em todas as freguesias – União de Freguesias de Prazins Santo Tirso e Corvite, de Santa Eufémia de Prazins e de Barco -, para estabelecer a ligação às Taipas e a todo o norte do concelho. Esta via é estratégica. Quanto à agricultura, é uma coisa muito medida pela pegada ecológica. Incentiva a que os mercados alimentares sejam abastecidos por produções locais, mas Guimarães é um território 60 a 70% industrial, o que lhe tem retirado margem para as produções agrícola. Precisamos que o mercado abastecedor seja não só de Guimarães, mas de terras limítrofes. A pegada ecológica poderia ter um conceito alargado à CIM do Ave. Aí, sim, estaríamos bem. Há territórios da CIM mais agrícolas. Temos uma boa pegada ecológica quanto à agricultura no território da CIM, mas Guimarães tem esta dificuldade nos solos.

 

O que o leva a dizer que a via é estratégica? O projeto enquadra-se na ambição de ver Guimarães Capital Verde Europeia, tendo em conta a quantidade de solo a ser utilizada para rodovia?

O parque de ciência e tecnologia tem de ter esta via estruturante. Quem fala do Avepark, fala também do parque industrial da Gandra, com ligação obviamente à autoestrada. É estruturante porquê? Custa 40 milhões fazer a obra. Até vai custar mais, porque as aquisições de terrenos devem ficar entre os quatro e os cinco milhões. Portanto, estamos a falar de 45 milhões. Obviamente a verba não será da Câmara Municipal. Terá de ser negociada com o Governo, no âmbito do PRR [Plano de Recuperação e Resiliência]. Temos um parque tecnológico desenvolvido que fixa empresas – está a fazê-lo a um ritmo muito bom, mas queremos um ritmo maior. A questão maior é a acessibilidade. Quando as multinacionais biotecnológicas e digitais chegam ao Avepark, ficam um pouco reticentes por causa do que é preciso para lá chegar. Uma empresa com investimentos nas centenas de milhões de euros paga a via do Avepark. Não são precisas duas ou três. Mas isso não é possível se continuarmos com constrangimentos na acessibilidade. Temos de ter uma visão de horizonte, para o céu, não para os pés. 40 milhões é muito dinheiro, mas é para proporcionar o desenvolvimento de um parque de ciência e tecnologia estratégico na área da biomedicina e dos biomateriais, que terá uma nova residência para alojamento de estudantes. Quando as empresas percebem que essas questões vão ser resolvidas fixam-se lá. Se há via que teve uma análise de mais de 40 instituições para o estudo de impacte ambiental foi a via do Avepark. Qual é a via que não tem utilização de solo? Qualquer via ocupa solo, e esta foi a via, em Guimarães, mais escrutinada a nível de impacte ambiental. E a Agência Portuguesa do Ambiente disse-nos: “Construam a via. Não há problemas”.

 

Há mais de 20 anos, esteve em cima da mesa uma ligação do norte do concelho à A11 via Brito. A reabilitação desse processo nunca esteve em cima da mesa como acesso alternativo ao Avepark? Não seria uma solução mais barata?

Este trajeto demole duas casas, em Santa Eufémia de Prazins e em Barco. Na ligação das Taipas a Brito, teria de demolir muitas. Depois há outra questão: precisamos da EN101 para o canal em sítio próprio, dedicado, para o metrobus ou para o metro de superfície. Esses transportes não vão andar por campos. Têm de andar por onde as pessoas moram. Se não tivermos este bypass do Avepark, não podemos tomar conta da EN 101.

 

Fotografia: Pedro C. Esteves

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