Desmistificar “taxar os ricos”
Qualquer pessoa que tenha o seu próprio negócio, para o qual também trabalha, ou que, mesmo trabalhando por conta de outrem, receba um ordenado acima dos 1500 euros líquidos mensais fica assustado ao ouvir “vamos taxar os ricos”. Mas o que é que significa “taxar os ricos”? Será o nosso país um país de ricos?
A verdade é que as fortunas em Portugal estão acumuladas nas mãos de poucos - os oligarcas, aqueles que detêm o poderio dos setores base da economia, importantes para a sobrevivência, como o setor da distribuição alimentar, o setor dos combustíveis e o setor tecnológico. Ao deter estes setores, os oligarcas portugueses detêm, também o poder sobre o preço cobrado, por exemplo, nos supermercados, ou, ao pensar no setor tecnológico, o poder sobre os nossos dados, que estão expostos a fáceis vendas.
Estes oligarcas, os 10% dos mais ricos, detêm cerca de 60% da riqueza nacional - um valor exorbitante concentrado em tão poucos. Mas quem são estas famílias? São, por exemplo, a família Amorim, detentora da Galp, de empresas do imobiliário e da indústria Amorim, com uma fortuna de 4.800 milhões de euros. Outra família, a Soares dos Santos, detém o grupo Jerónimo Martins, e uma fortuna de 3.374 milhões de euros. A família Mello e a família Azevedo, detentoras do grupo Brisa e da Sonae, respetivamente, são, também, exemplos de famílias milionárias em Portugal.
Taxar os ricos não é sinónimo de taxar aqueles que trabalham para viver uma vida digna; é taxar aqueles que vivem com muito em comparação aos que vivem com pouco ou com pouco mais para a sua sobrevivência. Ao pensarmos na importância de taxar os ricos, estamos a pensar na discrepância salarial entre Pedro Soares dos Santos, que ganha cerca de 2615 euros por hora, e um funcionário da caixa do Pingo Doce, que recebe pelo seu trabalho apenas 6 euros por hora. É pensar que o que Pedro Soares dos Santos recebe num ano, esse mesmo trabalhador do Pingo Doce necessitaria de 400 anos de trabalho para receber. Assim, desmistificar o “taxar os ricos” significa pensar nos trabalhadores, e pensar que em Portugal as taxas sobre o dinheiro do trabalho são superiores às taxas sobre as grandes fortunas, que as famílias oligarcas detêm ao longo de gerações.
Então, como combater esta desigualdade? A solução passa pela justiça fiscal, ou seja, criar impostos que sejam justos para aqueles que trabalham; aplicar taxas de imposto superiores àqueles que geram a sua riqueza com base nas heranças e não fruto do seu trabalho - como é o caso das famílias anteriormente mencionadas. Na prática, isto traduz-se na taxação das fortunas: 1,7% sobre as fortunas acima dos 3 milhões de euros, 2,5% sobre fortunas superiores a 5 milhões e 3,5% sobre fortunas acima dos 10 milhões de euros. Nas empresas podem, do mesmo modo, ser aplicados leques salariais, o que garante que um administrador não possa gerar no período de um mês mais do que um trabalhador que trabalhe para si gere num ano. “Taxar os ricos” é, então, defender quem trabalha e procura uma vida digna.