GUIdance com “impacto emocional e social”. Futuro está na palavra “relação”
De BAqUE, criação de Gaya de Medeiros na qual corpos de pessoas trans ou não binárias, se moviam pela libertação da “narrativa negativa” que os costuma ligar “à dor e ao sofrimento”, até Jungle Book reimagined, uma recomposição da viagem de Mogli – o protagonista do classifico de Rudyard Kipling – sob o olhar de um refugiado climático, a 12.ª edição do GUIdance cumpriu-se de 02 a 11 de fevereiro com 11 coreografias sobre o palco e várias outras iniciativas a acompanhar, desde cinema a debates, passando pelo tempo de partilha entre público e coreógrafos no final de alguns dos espetáculos.
Esse programa paralelo, descreve ao Jornal de Guimarães o diretor artístico do festival afirma a “possibilidade de aumentar a relação entre o público e a dança”. Em tempo de balanço do que se viveu em Guimarães nos primeiros dias de fevereiro, Rui Torrinha enaltece a forma como o festival “impacta a vida” de quem nele participa, de público a artistas. “Surpreendeu-me o impacto emocional e social do festival. Já passou uma semana, mas as coisas ainda estão bem vivas. (…) Surpreendeu-me uma certa consciência”, realça.
Para o diretor da Oficina para as artes performativas, o GUIdance extravasa a sua condição de festival de dança para emergir como “acontecimento que parte do corpo e olha para a sociedade no sentido de a transformar com princípios de bem comum”. “É incrível perceber como um festival pode contribuir para a intervenção e o repensar da sociedade. O festival ativou uma consciência de intervenção social, com muita intensidade”, completa.
Mais do que espetáculos esgotados ou com lotação quase preenchida, Rui Torrinha crê que o GUIdance de 2023 abre portas a outras configurações de programa artístico, a explorar com “muito mais força” em 2024; a chave para essa reconfiguração está, a seu ver, na palavra “relação”: depois de já ter criado relação com os artistas e relação com o público, o festival projeta-se para um “ecossistema de relações para lá da possível condução” de quem o organiza, como se fosse “um corpo que já ganhou vida própria”.
Além de “provocar proximidade” entre quem nele participa, o GUIdance quer afirmar-se por relações que aceitam e celebram a diferença. “Estamos num momento de grande transformação social e civilizacional. Tem de se abrir caminho para a relação com o que não entendemos. O passo não é apenas apresentar um conjunto de propostas, mas sim como elas nos permitem a relação com a evolução do mundo. A alteridade e a diferença são muito importantes”, crê.
O território “olha, escuta, sabe acolher, mas também sabe expressar-se”
“Se aqui nasceu Portugal, que outras coisas novas aqui podem nascer?”, questiona Rui Torrinha, parafraseando Gaya de Medeiros numa das conversas do programa paralelo do GUIdance. Para Rui Torrinha, Guimarães é uma cidade “aberta, diversa e plural”, que “investe desde há muito na sua visão cultural” e que pode fazer da “tolerância com a diferença” uma “grande valência”. Pela frente, há ainda desafios pela frente. “Depois de um grande evento, fica a necessidade de um ímpeto muito próprio, muito informado pela sua própria identidade. A cidade está a levantar-se para determinadas questões. O nosso território olha, escuta, sabe acolher, mas também sabe expressar-se”, declara.