Para quem lá mora ou labora, Couros quer-se chamativo sem perder “espírito”
O tempo em que aquele lugar fervilhava de vida com o trabalho braçal dos curtumes e os cheiros nauseabundos que emanavam dos tanques já lá vai. Em 1981, era já um lugar diferente: o edificado que cerca o Largo do Trovador era mais jovem, mas o espaço público era mais desordenado, recorda Júlio Novais. Foi nesse ano que abriu o Tio Júlio, um dos mais reconhecidos sítios da cidade para se comer fora de horas.
Nos 42 anos que se seguiram, viu aquele lugar transformar-se, sobretudo no período da Capital Europeia da Cultura. “Se houve uma grande modificação, foi com a Capital Europeia da Cultura. Surgiram hostels que chamaram turistas, e a zona dos tanques ficou muito bonita”, descreve.
O território de Couros é agora parte da área classificada como Património Mundial da UNESCO. Ao centro histórico entre muralhas classificado em 2001, junta-se desde esta terça-feira uma área de 19,4 hectares que engloba bem mais do que os antigos tanques e fábricas de curtumes: na realidade, estende-se desde a rua D. João I, a oeste, até à rua da Ramada, a leste, passando pelas ruas de Camões e da Caldeiroa, pela Avenida D. Afonso Henriques e pela rua de Vila Flor. Espaços públicos como o Toural e a Alameda de São Dâmaso e edifícios como a igreja e o convento de São Francisco também passam a constituir Património Mundial.
Defensor de animação de espaço público que tenha em conta a identidade de cada rua e lugar, Júlio Novais espera que o Trovador continue a ser lugar para eventos como o Vai-m’à Banda, no final de agosto, mas lembra que ruas como a de Camões e a D. João I também merecem o seu espaço na agenda da cidade. “Para a população e para a cidade é muito boa a classificação. Sou contra as grandes festas. Prefiro festas mais pequenas do que festas como a Noite Branca. É importante que todas as ruas da cidade possam ter a sua festa. A rua de Camões, um bocado abandonada, e a rua D. João I também merecem as suas festas”, defende.
Uma oportunidade para a Pousada da Juventude
Convencido de que o usufruto da área de Couros ainda pode melhorar, a nível de esplanadas, por exemplo – “não se pode pôr uma mesa cá fora porque o vizinho não deixa e as forças responsáveis da cidade têm de ver isso”, refere -, Júlio Novais enaltece as transformações da Ilha do Sabão – “está muito bonita” – e a área da Pousada da Juventude. A sua coordenadora acredita que o equipamento integrado na rede nacional de pousadas de juventude pode atrair mais gente depois de atribuído o estatuto de Património Mundial a Couros.
“É sempre muito positivo. Certamente vai-nos trazer mais gente. Também nos traz mais responsabilidade. Tentamos dar o nosso melhor contributo para manter o espírito e a qualidade desta zona”, descreve Júlia Monteiro, ciente de que a procura, até agora, provém sobretudo de escolas portuguesas e de grupos de alunos estrangeiros.
O gestor de projetos das Pousadas de Juventude também espera maior visibilidade para aquele estabelecimento. “Acaba por ser mais um ponto de atração turística, que coloca esta zona no mapa dos roteiros turísticos, e, portanto, atrai mais turistas, o que significa maior visibilidade para esta pousada de juventude. É uma oportunidade para divulgar os nossos serviços, não apenas desta pousada, mas também da rede de pousadas de juventude a nível continental”, vinca.
A umas centenas de metros de distância, a antiga fábrica da Ramada, com os seus fulões expostos acolhe o Bar da Ramada e o Instituto de Design de Guimarães (IDEGUI), casa da licenciatura em Design de Produto da Universidade do Minho (UMinho). Rececionista no IDEGUI, José Costa acredita que a Câmara Municipal vai realizar algum investimento em Couros, a nível cultural e paisagístico, para melhorar a área e também descentralizar o comércio e o turismo em relação às principais praças da área classificada desde 2001. “Isto pode descentralizar a oferta em Guimarães, para além da Praça de Santiago e do Largo da Oliveira. Pode distribuir mais o comércio, a economia, o turismo”, vinca.
Uma candidatura bem sucedida com três dificuldades
Contactado pelo Jornal de Guimarães, o arquiteto responsável pela candidatura da extensão da área classificada pela UNESCO a Couros vincou que o processo ultrapassou três dificuldades. Uma delas foi a de levar o Estado português a apoiar a candidatura de Couros em detrimento de outras, já que cada país só pode propor uma candidatura por ano, no máximo, assume Ricardo Rodrigues.
Uma outra foi demonstrar o seu valor universal excecional, provando que a área de Couros “se distingue e destaca no mundo” por comparação a casos análogos, acrescenta.
Também o estado atual da zona de Couros, ainda longe do ideal no que ao espaço público e ao património edificado diz respeito, foi uma barreira a superar. “Tivemos de assegurar uma candidatura que mitigasse o impacto que o estado atual da zona de Couros apresenta atualmente. Embora já muito trabalhada, ainda há muito a fazer nos Couros, e os avaliadores, melhor do que ninguém, anotam esse facto”, admite.