A crise política instalou-se. Quid iuris?
A 6 de outubro de 2019 o povo português pronunciou-se em eleições legislativas averbando uma continuidade da denominada “geringonça”. Este termo, para designar um nado político saído da resistência aos incumbentes de 2015 em terminar a política da Troika desapertando o cinto dos portugueses, foi uma reação parlamentar à esquerda e ao centro para devolver ao país a esperança de um novo ciclo em que a austeridade virasse, tão só, rigor nas contas públicas, mas não vidas empatadas num elevador social encravado.
O Presidente à época, Cavaco Silva, fez bem em exigir um compromisso escrito dado o cenário inédito da nova solução governativa. Os contraentes cumpriram as cláusulas e no geral os portugueses gostaram da solução mantendo o equilíbrio de forças no parlamento, somente mirrando os partidos da antiga PAF que se perderam no discurso da “batota eleitoral”, sem dar soluções objetivas ao país, abrindo espaço político a duas novas formações do seu espectro com ideias contrariáveis, mas claras.
A síntese política dos resultados eleitorais, fazem-na os protagonistas. E se a construção da geringonça em 2015 foi uma iniciativa do PCP quando Jerónimo afirmou: “o PS só não forma governo se não quiser”, a veleidade do BE em 2019 em dizer que só viabilizaria orçamentos se fosse governo, levou à “expertise” política de António Costa - para os colocar como reféns como ao PCP que nunca irá para o governo a não ser sozinho – formando a panaceia vigente que, se quebrada, traria a fatura política para quem ousasse desfaze-la. A esta interpretação extensiva do mandato dos portugueses, perpetrada por Costa, chama-se pesporrência. O golpe que fez ao BE com perdões fiscais à Galp, as cativações permanentes que o PCP denunciava, são dois de muitos exemplos que evidenciavam o tratamento dado pelo Primeiro-Ministro aos seus parceiros por ocasião orçamental.
O Presidente da República há muito que via a fragilidade desta situação. Daí a sua preocupação, como afirmou no dia da sua segunda eleição, em ser preciso uma alternativa política forte, clara, mobilizadora e democrática ao centro-direita para que o sistema político funcionasse com regularidade e os portugueses tivessem opções. Foi mais longe nesta última ronda da negociação orçamental: quem governou até aqui, tem poderes parlamentares para continuar a governar, isto é, “PS, PCP, BE, entendam-se”! Não se entenderam e criaram um problema político e orçamental ao país. O problema orçamental é importante, porque aqui começa a gestão de mais um pacote de fundos comunitários que podem ser a solução para a recorrente estagnação económica do país e a perda de competitividade face a outros parceiros europeus. O problema político reside no facto de ser essencial nos próximos anos haver essa estabilização para a execução do propalado PRR. Não podemos, pois, viver todos os anos na ansiedade da aprovação do Orçamento. A crise política instalou-se. Quid iuris?
Quem criou o problema não tem soluções; se tivesse aplicaria. Não só porque tem maioria parlamentar, mas também porque o Presidente, em nome do país, pediu estabilidade. É, pois, o fim da Geringonça e da solução política à esquerda. Sobretudo porque – os até aqui parceiros - não coincidem no modelo de desenvolvimento do país: concretamente, onde se aplicará o PRR. Costa, não quer o governo polvilhado de Pedros Nunos, o mesmo é dizer de BE´s. E ao pedir desculpas aos empresários na concertação social, deu o recado ao PCP sobre onde estava.
Quer isto dizer que Costa já perdeu as eleições que se avizinham? De todo. A habilidade de Costa é (re)conhecida pelos portugueses. Mas a situação de instabilidade política e orçamental em que colocou o país, faz com que os portugueses olhem para o centro-direita em busca de soluções.
Começando pela direita mais extrema a proposta é de rutura: quer do “status quo”, quer do sistema. Não há soluções, senão a mudança de regime.
A Iniciativa Liberal, é um partido que comunica bem e tem ideias claras: menos Estado, menos impostos, mais economia.
O CDS, com a turbulência natural das mudanças de ciclo, fez a sua escolha no último Conselho Nacional: renovar a sua classe política. O que pretende, a exemplo de Lisboa e Coimbra é conciliar uma plataforma de centro-direita alternativa ao socialismo afirmando os valores da família política inscrita no Partido Popular Europeu.
Falta saber se o PSD apresentará a mesma solução de 2019 ou se – sabendo ler o momento histórico – propõe ao país o Vice-Presidente do Partido Popular Europeu que já assustou o PS e a sua esquerda querendo todos eleições quanto antes para não dar palco a Paulo Rangel.
Está, pois, nas mãos do Presidente da República dar tempo a Costa para “mudar o chip” e para o PSD dizer ao que vem.