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Pelo direito à liberdade de cancelar

Eduardo Fontão
Opinião \ domingo, novembro 19, 2023
© Direitos reservados
O que aconteceu com a Web Summit é um aviso para qualquer líder empresarial, que queira exprimir livremente a sua opinião – tal como eu o faço mensalmente nas páginas desta publicação.

Gostaria, em primeiro lugar, de deixar bem claro que não nutro qualquer simpatia pela tão em voga cultura de cancelamento.

Sempre fui um acérrimo defensor da liberdade de expressão, na acepção lata de que, desde que não sejam violadas quaisquer restrições legais especificamente tipificadas e estabelecidas na Lei para proteger outros direitos ou a segurança pública, não existem quaisquer outros limites a que um individuo possa expressar livremente os seus pensamentos, ideias ou convicções.

Daí a achar que qualquer pessoa que expressa as suas convicções não pode ser criticada ou que não temos o direito individual de nos afastarmos dela ou de não marcarmos presença num evento em que irá está presente ou por ela organizado, vai uma enorme distância.

Só a título de exemplo: embora seja, desde que me conheço, fã do grupo Pink Floyd, não fui ver o recente concerto de Roger Waters em Portugal, única e exclusivamente devido às suas conhecidas posições pró-russas e antissemitas.

Tudo isto a propósito, da recente decisão de várias empresas, nomeadamente a Google, a Meta (Facebook), a Intel, a Siemens, entre outras, terem cancelado a sua presença na Web Summit 2023, alegadamente devido a um post polémico de Paddy Cosgrave, do CEO da empresa, na rede social X a criticar a actuação de Israel em resposta aos ataques terroristas de 7 de outubro.

Na mesma e exacta medida que temos o direito de exprimir o que nos vai na alma, cada um de nós também o direito de não gastar o seu dinheiro para estar presente num congresso, organizado por uma empresa cujo representante (percepcionado pela maioria de nós como a cara do evento), defende uma posição no mínimo polémica sobre o conflito em curso.

Tal como uma pessoa que seja um grande defensor dos direitos das mulheres pode não querer consumir produtos de uma empresa, cujo dono expressa livremente as suas posições antiaborto. Da mesma maneira que eu tive o direito de escolher não ir ver um concerto do Roger Waters! E poderíamos continuar por aí em diante, citando mais algumas dezenas de exemplos do exercício da nossa liberdade de estarmos ou não presentes num evento, de adquirirmos ou não um serviço ou produto de uma determinada empresa!

A liberdade também é isto!

O que aconteceu com a Web Summit é um aviso para qualquer líder empresarial, que queira exprimir livremente a sua opinião – tal como eu o faço mensalmente nas páginas desta publicação: algo que dizemos por vezes até de forma irreflectida no calor de uma discussão online, pode ter consequências negativas imprevisíveis para a nossa empresa e para todos os que lá trabalham.

A sociedade actual tem vindo a polarizar-se, tornando-se cada vez mais exigente com o comportamento de cada um de nós e é cada vez menos sensível a actos de contrição.

De nada valeram a Paddy Cosgrave os pedidos de desculpa que se sucederam ao referido “post”. Não teve outra saída que não a de afastar-se, demitindo-se do cargo que ocupava, para não contaminar ainda mais a reputação da empresa

Mas alguém achava que podíamos ter liberdade de expressão e que não seríamos julgados e avaliados por tudo o que dizemos?

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