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Os Guimarães

Amaro das Neves
Opinião \ sexta-feira, setembro 22, 2023
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Contam-se às centenas de milhares os que por esse mundo fora ostentam Guimarães na carteira de identidade. Não fará sentido valorizar o nome Guimarães como uma das marcas do património vimaranense?

Na tarde de 12 de Agosto de 2023, Joaquim António dos Santos Simões (1923-2004) foi homenageado pelos seus conterrâneos, familiares e amigos, que assinalaram o centenário do seu nascimento na vila do Espinhal, concelho de Penela. A homenagem decorreu numa sala repleta de um solar setecentista, que hoje funciona como museu e espaço de dinamização cultural, a casa do magistrado, jornalista, escritor e dramaturgo Luís de Oliveira Guimarães (1900-1998), fundador e dirigente da Sociedade Portuguesa de Autores, amigo de Santos Simões. Enquanto escutava o breve concerto de guitarra de Joaquim, o neto talentoso do homenageado, e o desfiar das memórias do notável arqueólogo e historiador Jorge de Alarcão sobre Santos Simões, veio-me à memória uma ideia antiga: até hoje, não conheci nenhum Guimarães que não tivesse raízes em Guimarães.

No regresso a casa, procurei nos registos paroquiais os ascendentes dos Oliveira Guimarães do Espinhal. Sem surpresa, encontrei o tronco vimaranense daquela família: Luís, o amigo de Santos Simões, era filho de António, que nasceu em Coimbra em 1858, neto de Domingos, que veio ao mundo em 1826, no lugar de Bugalhós, em Mascotelos, que era filho de João, natural da mesma freguesia vimaranense, onde nasceu em 1784. Por onde se conclui que Luís de Oliveira Guimarães é bisneto de João Alves de Abreu e de D. Josefa Maria Pereira, lavradores proprietários de uma quinta em Mascotelos, no concelho de Guimarães.

Acontece que aquele casal vimaranense tinha uma filha mais velha, Maria, nascida em 1823 e que daria à luz, na mesma casa de Bugalhós, no final de 1853, um outro João, que seguiria a vida eclesiástica. Trata-se de João Gomes de Oliveira Guimarães, mais conhecido como o Abade de Tagilde, o historiador que se distinguiu como uma das figuras mais marcantes na Guimarães do seu tempo. Ou seja, o amigo espinhalense do político e homem de cultura que mais se destacou em Guimarães na segunda metade do século XX, Santos Simões, era familiar do Abade de Tagilde, também ele político, homem de cultura e presidente da Sociedade Martins Sarmento.

Este é mais um exemplo que confirma a relevância do património humano do nome Guimarães, utilizado por centenas de milhares de pessoas espalhadas por todo o planeta. Todos têm raízes vimaranenses e resultam do fenómeno secular da emigração, um dos principais traços do modelo demográfico do Minho. São os herdeiros da “gente inumerável, que não pode sustentar este País, [de que] se tem povoado o Mundo, e com especialidade o Brasil, e as Minas”, de que falava, em meados do século XVIII, o padre João Baptista de Castro. Descendem daqueles que um dia partiram destas terras e por lá deixaram obras, famílias e o nome da terra que os viu nascer, que um dia acrescentaram ao que receberam no batismo. Ajudaram a povoar o mundo e multiplicaram-se, com forte presença na economia, cultura, na literatura, nas artes, na política, no desporto de muitos países, com relevo para o Brasil.

Há muito que tento chamar a atenção para o potencial dos Guimarães deste mundo. Sem sucesso, até hoje. É por isso que me atrevo a transcrever aqui parte de um texto que escrevi em 2007:

Os vimaranenses são cidadãos do Mundo. Ao longo dos séculos, também constituíram a sua diáspora. […] Consta mesmo que no Brasil haverá mais Guimarães do que em Guimarães. Até na política: um notabilíssimo Guimarães, Ulysses, foi presidente, por duas vezes, da Câmara dos Deputados. E ninguém o negará: sem os Guimarães, a literatura brasileira seria bem mais pobre. São Guimarães, por exemplo, o Rosa, que no Brasil renovou o romance, e o Bernardo, que escreveu as aventuras e desventuras da desditosa Escrava Isaura, assim como o poema imoral A Origem do Mênstruo, que basta ser lido para se perceber que só podia ter sido escrito por um dos nossos.

Contam-se às centenas de milhares os que, por esse mundo fora, ostentam Guimarães na sua carteira de identidade. Não fará sentido valorizar o nome Guimarães como uma das marcas do património vimaranense e lançar um desafio para que os Guimarães venham ao encontro das suas raízes na cidade que têm no nome?

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