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E tudo a Vitrus levou

José Cunha
Opinião \ sexta-feira, março 21, 2025
© Direitos reservados
É obvio que este novo contrato programa com a Vitrus é um subsídio encapuçado que serve de almofada financeira para os devaneios megalómanos da sua administração.

Sem surpresa, e numa lógica racional de continuidade que me parece acertada, a gestão do estacionamento público em Guimarães foi de novo entregue à Vitrus. A novidade - trágica - é que com este novo contrato programa, toda a receita dos parques e dos parcómetros lhes foi oferecida de mão beijada, num processo revelador de vários sintomas preocupantes, entre os quais, e desde logo, o facto de ninguém se manifestar indignado com os seus contornos.

Em Guimarães, os Parques de Estacionamento municipais e as Zonas de Estacionamento de Duração Limitada estão sob a gestão da Vitrus, por via de contrato programa, desde 2014. À época, o estudo que suportou os termos desse contrato, e que levou em conta as receitas, gastos e investimentos previstos para o período de vigência do contrato (10 anos), concluiu que 230 mil euros por ano “era uma contrapartida razoável (a pagar à câmara) sem colocar em causa a estabilidade financeira da empresa”.

Com o fim da concessão e perante a necessidade de um novo contrato programa, foi realizado um estudo de viabilidade económica e financeira para estabelecer novas condições e contrapartidas. O estudo, tal como o anterior, foi realizado pelo Instituto Politécnico do Cávado e do Ave (IPCA), mas que agora, em vez de suportar o mapa de resultados provisionais num histórico de três anos (como fizeram em 2014), usaram apenas os dados de 2022, numa opção injustificável e pouco séria. Injustificável porque os dados históricos de 2023 já são públicos e os de 2024 certamente já são conhecidos internamente pela Vitrus. E pouco séria porque com essa opção estão a manipular intencionalmente os resultados provisionais. O estudo chega ao ponto de considerar um aumento de gastos para 2023, mas “esqueceu” que nesse ano os proveitos aumentaram 200 mil euros, podendo dessa forma concluir que a Vitrus, a partir de agora, não deve pagar qualquer contrapartida pela gestão do estacionamento público.

Não se pode aceitar a continuidade desta subserviência pouco ética da academia, que sob a capa de estudos de apoio à decisão, mais não fazem do que apresentar justificações e conclusões encomendadas para suportar narrativas e decisões já tomadas. Estranha-se o silêncio corporativista numa comunidade que tanto preza a avaliação entre pares.

Também não se percebe, nem pode ser aceitável, que se renove a confiança na entidade que gere os estacionamentos públicos tendo por base um estudo manifestamente manipulado e sem se realizar e divulgar uma avaliação do desempenho anterior. Assim como não se percebe que face a esta omissão a oposição não o exija, como é seu direito e dever.

Não é só ao nível da fundamentação técnica que esta nova concessão merece reparos. A opção que está subjacente nos termos e argumentos do novo contrato programa é notoriamente contrária à estratégia da política de mobilidade sustentável. E quando ouço o nosso Eco-Presidente a afirmar, com orgulho, que Guimarães tem das tarifas mais baixas do país, e que a “câmara impõe preços, e são preços muito baixos porque entende que aparcamento é um serviço público”, não posso deixar de me interrogar para que serve o tão famoso e galardoado Ecossistema de Governança que devia assegurar a integração e convergência das políticas públicas para o desenvolvimento sustentável. Onde está a Estrutura de Missão e o Laboratório da Paisagem? Ninguém consegue explicar ao senhor Eco-Presidente que esta política de estacionamento não é coerente com a cidade que ambicionamos e anunciamos ao mundo?

É obvio que este novo contrato programa com a Vitrus é um subsídio encapuçado que serve de almofada financeira para os devaneios megalómanos da sua administração. Mas a versão que nos é impingida é que a Vitrus é uma empresa de “excelência” apesar da sua gestão do estacionamento público passar a render menos 230 mil euros por ano.

A audácia e desfaçatez deste tipo de decisões só é possível pelo conforto de uma maioria absoluta, e na certeza, quer de um misto de indiferença e inépcia da minoria, quer no servilismo da academia.

Vamos ver o que o vento nos traz, “afinal, amanhã é outro dia”.

Nota: apesar da obrigação legal da sua disponibilização pública e dos esforços encetados para ter acesso ao novo Contrato Programa, tal ainda não foi possível, pelo que este artigo foi escrito no pressuposto de que o Contrato Programa incorporou as conclusões “encomendadas” ao IPCA.

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