Ética Republicana
Mais que o historicismo em volta do que foi a primeira e a segunda República em Portugal talvez – porque já temos substância para tal - devêssemos fazer um diagnóstico aprofundado da terceira, de molde a suster os populismos “proclamativos” da quarta.
Embora não seja este o espaço para o efeito, pelas evidentes circunstâncias constritivas, deve, pelo menos, quando se ensaia uma sindicância a este nível, dar-se um conjunto de pistas úteis à análise posterior. Deixarei algumas.
A primeira das quais tem que ver com o alicerce fundacional do Republicanismo enquanto visão da sociedade. A democracia plena. A todos, os assuntos que a todos dizem respeito, na inspiração que nos legou Rosseau, sem remissão dos privilégios comuns a uns quantos. É – se profundamente lhe quisermos polvilhar um preceito moral – uma demanda cristã, na medida em que todos os Homens são filhos de Deus, devendo participar no bem comum para uma correta administração do “Destino Universal dos Bens”.
A segunda com a centralidade do neorrepublicanismo de Phillip Pettit que nos traz a “liberdade como não dominação” recuperando conceitos pretéritos, mas sempre atuais, como a liberdade positiva e negativa, associadas a Isaiah Berlin e Benjamin Constant. Ou seja, como hodiernamente estamos, “o povo”, aptos a poder participar, por exemplo, na eleição e representação no fórum global da Assembleia da República, local onde se fazem as leis da comunidade. E, por outro lado, em que medida o “Estado” na sua orgânica macro se faz cerceador do personalismo individual, vigiando de sobremaneira o cidadão.
Por fim, a dimensão da designada “Ética Republicana”, que aliás titula este artigo, traz à liça um velho debate sobre a abrangência e os limites da “ética” que – como sabemos – diverge no tempo, no modo e nas geografias. Pina Moura, antigo Ministro das Finanças da terceira República, não se deixava a enigmas: “a ética republicana é a lei”. Já Pacheco Pereira aponta para a fragilidade limitadora desta asserção indicando que a ética, mais do que aquilo que é (ou aquilo que inscreve a lei) está, naquilo que deveria ser, isto é, numa espécie de moral social equilibrada que – por exemplo – embora não exista lei para o enriquecimento ilícito, possa existir uma dimensão ética que impenda sobre o cidadão e que o limite nesta ação em benefício próprio no prejuízo de todos, como assistimos nos recentes exemplos de banqueiros foragidos.
Tenderia, pois, a estar com a ideia de Pacheco Pereira sobre a dita Ética Republicana, mas a sua materialização, levar-nos-ia a uma definição da sociedade em que queremos viver. E se tenho por boa a referência da Constituição vigente, a verdade é que a sua aplicação denota espasmos que levam os políticos da circunstância a quere-la mudar, num processo que sabemos como começa, mas nunca como acaba.
Para segurança do sistema, antes da comemoração dos 50 anos de Abril, no esteio de Madison, Jefferson, Hamilton e John Jay, com os seus “Federalist Papers” um ensaio equilibrado mais do que dos valores – que me parecem seguros – mas sobre a garantia da sua aplicabilidade – para suster oportunismos – faria sentido, sem pôr em causa a liberdade como “não dominação”.
Em Guimarães, bom grado o envolvimento popular, temos a centenária Associação Artística Vimaranense que habitualmente nos brinda com a Marcha Republicana tendo oferecido à cidade o busto da República que a autarquia brindou – tardiamente, mas bem – com realce na toponímia da cidade. E assim sendo: Viva a República!