O desporto e a economia
A economia, contrariando as ideologias que se debatem entre a sua condenação e a sua exaltação, é um fenómeno maior na vivência e na cultura humana, pessoal e comunitária. O seu impacto nunca poderá ser desprezado, mas também nunca deveria ser endeusado. Hoje julgo que o problema que se põe é este, o endeusamento do impacto económico (que lembro que não deve ser menorizado) em todas as realidades em que nos movemos e existimos. Talvez, por isso mesmo, o desprezo e o descuido pelas humanidades, a arte, a história, a literatura, a filosofia, etc, em rigor por tudo o que não dá lucro, a economia seja a caraterística mais marcante dos tempos hodiernos. Ora, se seguirmos esta mentalidade extrema (tal como a que despreza pura e simplesmente este fenómeno) no desporto caímos no mercantilismo, onde o dinheiro parece ser a razão maior do desporto (profissional e amador) e os casos de especulação financeira se repetem (no caso português muito bem exposto no futebol) que geram um ambiente antidesportivo e que derruba os valores basilares do jogo, do desporto e da atividade física.
Foi há dez anos (2013) que Guimarães foi Cidade Europeia do Desporto, algo de que me orgulho como vimaranense que se diz fã e praticante do de atividade física, e que em 2018 foi analisado no seu impacto económico – Impacto Económico do Desporto em Guimarães. Estudo sobre a importância do setor do desporto na economia e imagem do Município de Guimarães, pelos académicos Fernando Perna (coord.), Maria João Custódio, Elsa Pereira e Vanessa Oliveira, edição da Câmara Municipal de Guimarães. Este estudo mostra a importância da prática desportiva no município vimaranense, e cuja a taxa de participação aproxima Guimarães da média europeia. Esta dinâmica, segundo os estudiosos, é correspondida pelo município que atribui prioridade política na evolução do concelho no desporto e na atividade física. Mas, e muito bem, o texto afirma na p. 7, pela pena do presidente da Câmara Municipal, Domingos Bragança: “Mais de que uma simples competição, a vertente desportiva é uma forma salutar de convívio entre as pessoas. Ideais como a amizade, o companheirismo e o fair-play são essenciais para o sucesso de qualquer associação. E a modalidade em que Guimarães pretende ser campeã é no índice da prática desportiva”. Mas que a prática desportiva não se esgote em si e em números, mas no encontro de pessoas que assentam a sua relação nos valores pelos quais devem competir.
Afirma este mesmo texto que o ecletismo distingue o nosso município vimaranense, mas julgo que se pode dizer o mesmo de todos os grandes concelhos portugueses. Como é igualmente verdade, e de sobremaneira para Guimarães, que as coletividades e associações, e os clubes de futebol são os maiores promotores do desporto e atividade física em todo o país. Contudo, uns e outros, têm a maior preocupação nos orçamentos (sendo o futebol o maior sugador de dinheiro), pois o dinheiro domina como nunca o fenómeno desportivo. As câmaras municipais são preciosos parceiros para as instituições desportivas, e promotoras de atividades e eventos desportivos, mas não gostaria de ver as mesmas a suplantarem as associações, as coletividades e os clubes. Como no prefácio do trabalho supracitado, Amadeu Portilha escreveu: os “clubes desportivos, que, mesmo exauridos de recursos financeiros significativos, demonstram ser capazes de desenvolver um trabalho de enorme qualidade”. Portanto, valorizando estas forças motoras do jogo e o desporto que tantos por iniciativa própria realizam, reforçam as necessárias parcerias como mais relevantes e promotoras de uma autêntica cidadania e corresponsabilidade de todos e de todas. Em Guimarães, como em muitas outras partes deste país, e isto nos grandes concelhos, a parceria exprime-se em subsídios, construção e manutenção de espaços desportivos, públicos e privados, promovendo para uma melhor cidadania e bem-estar das populações. Este estudo apresentava em 2018 o valor de 79% dos vimaranenses a praticar regularmente atividade física. Mas este é um número, ou espelha a realidade de cidadãs e cidadãos a valorizarem-se pessoal e comunitariamente!? Eis a questão…
A economia e os números nunca são desprezíveis. Só os ingénuos não percebem isso! Mas uma coisa é a economia e os números, e outra é a redução absoluta ao propósito único de obter lucros a todo o custo e de ganhar a qualquer custo. Seja no desporto, ou na política, ou outra realidade que seja. E os valores do jogo, desporto ou atividade física, onde ficam!? Como diz o presidente do município no estudo supracitado – “mais de que uma simples competição, a vertente desportiva é uma forma salutar de convívio entre as pessoas” –, e isto é e devia ser o mais importante do jogo. Mas o mercantilismo do dinheiro e do prestígio meteu-se pelo meio, correndo o sério risco de desvirtuar o desporto e a atividade física. Continua…