A dor das perdas prematuras: comoção, silêncio e compromisso coletivo
A morte prematura de Diogo Jota e André Silva abalou profundamente o país. Jovens, saudáveis, admirados por milhares como acontecia particularmente no caso do Diogo, partiram inesperadamente, deixando um vazio impossível de preencher. A tragédia é maior do que a perda desportiva — é humana, familiar, íntima. Pensamos nos pais, nos filhos, nas esposas e nos companheiros que agora enfrentam o abismo da ausência. E, por um momento, toda a sociedade para, comove-se, presta homenagem.
Mas ao lado dessas mortes que ocupam as manchetes, há outras, tantas, anónimas. Jovens que partem todos os dias — em acidentes, por doenças não detetadas a tempo, por depressões escondidas, por violência, por negligência — e cujos nomes surgem, quando muito, numa breve nota de rodapé ou num obituário. A vida deles vale tanto quanto a dos famosos, dos ídolos, mas a sua perda não mobiliza o mesmo aparato coletivo. Este contraste, que nos deve inquietar, obriga-nos a refletir sobre o modo como reagimos à morte e, mais importante, o que fazemos — ou deixamos de fazer — para a evitar.
É certo que não podemos eliminar todas as tragédias, mas podemos – e devemos – reduzir os riscos. No caso dos atletas, importa repensar e reforçar os rastreios médicos regulares, indo além do mínimo exigido pelas normas. Muitos problemas cardíacos ou neurológicos só são detetáveis com exames especializados, e nem sempre os clubes estão dispostos a investir nisso. Também a saúde mental, frequentemente ignorada no meio desportivo, merece atenção: há pressões, angústias e desequilíbrios que, se não forem acompanhados, podem ter consequências fatais.
Fora do desporto, o combate às mortes prematuras de jovens passa por políticas públicas mais eficazes. Educação para a saúde nas escolas, acesso gratuito a cuidados médicos de qualidade, vigilância nos contextos de risco (como a violência doméstica, os consumos ou os ambientes de exclusão social), são pilares que não podem ser negligenciados. A segurança rodoviária, a prevenção do suicídio e o investimento em comunidades saudáveis são, também, formas de salvar vidas – muitas vezes, discretamente.
Ao mesmo tempo, precisamos de cuidar de quem fica. O luto é um processo individual, mas o apoio deve ser coletivo. Famílias destroçadas por perdas inesperadas não podem ser deixadas ao abandono. Apoio psicológico gratuito e prolongado, redes de suporte comunitário, espaços de escuta e respeito, são essenciais. E aqui, a sociedade civil, os clubes, as autarquias, as famílias alargadas, os amigos e até os vizinhos têm um papel. O luto exige tempo, dignidade e privacidade — e é nosso dever protegê-los.
A morte de Diogo Jota e André Silva deve ser mais do que uma comoção momentânea. Deve tornar-se um apelo a sermos uma sociedade mais vigilante, mais cuidadora e mais sensível à fragilidade da vida. Porque cada perda injusta nos convoca à responsabilidade. E porque, no fundo, a melhor homenagem que podemos fazer aos que partiram é cuidar melhor dos que ainda cá estão.