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A ideologia enquanto ditadora comportamental

Diogo Nuno Mesquita
Opinião \ sábado, setembro 14, 2024
© Direitos reservados
A ideologia, política ou qualquer outra, tem a tendência de afunilar a visão do seu convicto.

 

De forma geral, acaba por ser comum e bem aceite socialmente ser-se de um partido ou, pelo menos, de um flanco político, de uma religião, de um clube de futebol, ou de qualquer outra coisa que permita uma (pelo menos ocasional) dose extraordinária de fanatismo. As pessoas arranjam sistematicamente forma de saciar a necessidade de se sentirem parte de algo, e de sofrer por isso, apesar de castradas por uma falta de criatividade crónica, que não lhes permite visualizar alternativas ao ímpeto de colmatar assim essa necessidade. Vivem fechadas, sem horizontes; resistentes à mudança, e por isso se tornam intolerantes como a geração que as antecedeu. Por isso o mundo é cheio de conflitos mal informados entre convencidos da sua (a maioria das vezes errada ou insuficiente) informação.

A ideologia é a doença que faz do ser humano o pior que conhecemos do ser humano. Não só pelos casos em que a seguem irrefletidamente, mas pelo que nos revela a traição dessas convicções por conveniência – a relatividade da ideologia quando se trata de obter algum benefício com a sua contradição. É o de esquerda que coloca o filho no colégio privado mas apregoa a valorização do público em seu detrimento; que se dá ao luxo de ir de carro para o trabalho quando defende o incentivo e investimento em transportes públicos. O de direita que se faz valer do seu número de utente de saúde quando até defende a extinção do Serviço Nacional de Saúde, e já que sente que tantos impostos pagou para seu funcionamento, até se faz valer da escola pública para a educação dos seus filhos quando se assume apologista do ensino privado.

Na realidade, a ideologia não define incondicionalmente o comportamento da maioria, e não tem necessariamente de ser por hipocrisia (apesar de muitas vezes existir) que alguém se comporta em contradição com aquilo que defende para a sociedade. Dirão tratar-se de jogar o jogo com as regras que lhes são impostas, mesmo achando que as regras deveriam ser outras por uma questão ideológica. E a verdade é que as regras do jogo fazem o jogador, por muito que até discorde delas.

Ao mesmo tempo, e esquecendo por um instante a frieza dos que vivem em prol do próprio benefício, deve, pelo menos, ser admirada a pessoa que age em consonância com as suas convicções (desde que não ultrapasse o limite da lei), mesmo quando não favorecem a sua causa pessoal. Apesar de tudo, é de louvar que, numa sociedade tão individualista, alguém prescinda de alguma aparente vantagem, sua por direito, apesar de se ter entregado a uma ideologia tóxica.

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