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As alterações climáticas e a agricultura

Nuno de Vieira e Brito
Opinião \ sexta-feira, março 29, 2024
© Direitos reservados
Comparando estratégias, Espanha utilizou cinco mil milhões do PRR na agricultura, em particular na água. Portugal pôs 200 milhões no Pisão, o que ainda reduz mais a nossa competitividade.

Muito pouco se falou em agricultura e agroalimentar neste período de campanha eleitoral, mesmo quando, por toda a Europa, manifestações dos agricultores contestam algumas medidas da recente Política Agrícola Comum. Na verdade, estes movimentos vieram demonstrar a necessidade de repensar políticas feitas com muito otimismo e generosidade, mas que impactam setores vitais da nossa economia e afetam, negativamente, o quotidiano de muitos europeus, comprometendo o seu futuro.

Ora, retirando a burocracia, um drama que nos envolve cada vez mais em todas as nossas atividades, mesmo quando estamos na época da digitalização e da inteligência artificial, O outro tema são as metas incluídas na estratégia “Green Deal” e “Farm to Fork”, relacionadas com praticas agrícolas e ambientais, que, por serem consideradas demasiados ambiciosas, para o tempo a executar, comprometiam a viabilidade de muitas explorações.

Para entendermos bem o impacto de qualquer política agrícola, nomeadamente as mais exigentes, convém recordar que, entre 2010 e 2020, desapareceram na União Europeia cerca de três milhões de explorações agrícolas, o que dá, aproximadamente, cerca de 35 explorações/hora. Temos hoje cerca de nove milhões de explorações que são determinantes não só para a nossa soberania alimentar, mas igualmente para a preservação do ambiente e a coesão do território. Ora, a nova PAC que retirou aos agricultores a possibilidade de um acréscimo de 30% das ajudas, no caso de cumprimento de certas medidas agroambientais, mas que as torna obrigatórias, sem qualquer apoio complementar.

Mas, retomando as metas exigidas das medidas com um carater ambiental, é importante que se repensem e exista alguma flexibilidade. Alias, apos estas manifestações, a Presidente da Comissão Europeia já veio considerar as metas exigentes e radicais, considerando necessário maior avaliação e estudo, assim como a sua dilatação no tempo. Na verdade, os agricultores devem ser vistos como dos maiores guardiões do ambiente, em todo o seu espaço territorial, sendo responsáveis pela conservação da biodiversidade no território e permitindo que uma sociedade cada vez mais urbana possa disfrutar de um espaço rural cuidado e produtivo.

Dentro destas metas, uma das mais relevantes é a redução de 50% do uso de pesticidas. E alguma confusão, pois não foi claro se esta meta era baseada num determinado ano de referência, se quanto a efeitos de toxicidade ou de perigosidade. Ainda estas medidas devem ser acompanhadas de alternativas pois, para alem da redução da produção de alimentos de qualidade e sujeitos a normas e regras europeias, vamos importar outros de países terceiros que não têm, nem de longe nem de perto, as mesmas preocupações ambientais e regras de qualidade existentes na União Europeia.

Mas uma outra preocupação é a água. Na verdade, para alem da problemática da escassez da água, de uma forte componente sazonal e regional (por exemplo o Alto Minho apresentada uma Superfície Agrícola Útil totalmente regada, comparativamente aos 34% do Ave ou os 51% do Cávado), temos um problema de gestão e de investimento, para uma melhor eficácia de utilização. Comparando estratégias, Espanha utilizou cinco mil milhões do PRR na agricultura, em particular na água. Portugal pôs 200 milhões no Pisão, o que ainda reduz mais a nossa competitividade.

Ora o investimento em Alqueva, antecipado e terminado no Governo PSD/CDS com os Fundos de Coesão, modificou a paisagem. A retenção de água, em diferentes níveis é importante, promovendo o uso de reservatórios, charcos e pequenas barragens, ou mesmo valorizando ainda a captação de água em afluentes de rios ou mesmo nos principais rios. Não será de repensar que, num momento em que as mudanças de pluviosidade são uma realidade, apenas 7% da água do rio Douro, 20% do Tejo e 71% do Guadiana têm um aproveitamento multifuncional (onde se inclui a agricultura). Captar e gerir são pontos determinantes nesta atitude proactiva de combate à seca e às alterações climáticas.

Mais do que chavões é preciso uma estratégia e ação. E, quanto a gestão da água, tem sido uma chuva de jargões e uma seca de intervenções.

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