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As Mulheres do Norte deveriam mandar neste país

Sara Martins Silva
Opinião \ quinta-feira, janeiro 20, 2022
© Direitos reservados
Arrisco a dizer que, não fosse o mal necessário da lei da paridade, que obriga a uma representação mínima de 33% de cada um dos sexos, e as mulheres seriam uma miragem nas listas de candidatos.

Numa crónica publicada em 2008, Miguel Esteves Cardoso homenageia as mulheres do Norte, em particular as minhotas. Nas suas palavras, sempre magistralmente trabalhadas, diz que “as mulheres do Norte deveriam mandar neste país. Têm o ar de que sabem o que estão a fazer. Em Viana, durante as festas, são as senhoras em toda a parte. Numa procissão, numa barraca de feira, numa taberna, são elas que decidem silenciosamente. Trabalham três vezes mais que os homens e não lhes dão importância especial".

Curiosamente e, apesar da realidade expressa na prosa de Miguel Esteves Cardoso, o distrito da Maria da Fonte é, a par de Aveiro, o único do país em que nenhum dos oito partidos com assento parlamentar escolheu uma mulher para cabeça de lista às próximas Eleições Legislativas. Este facto deve levantar ainda mais estranheza se tivermos em consideração que a população feminina representa, no distrito de Braga, cerca de 53% da população.

Se a qualidade do trabalho desempenhado pelas mulheres minhotas é inquestionável e se estas são em maior número, esta ausência no topo das listas de candidatos à Assembleia da República não pode ser vista apenas como uma (infeliz) coincidência. Arrisco a dizer que, não fosse o mal necessário da lei da paridade, que obriga a que haja uma representação mínima de 33% de cada um dos sexos, e as mulheres seriam uma miragem nas listas de candidatos.

Mais do que um conservadorismo bacoco, e um sexismo ignominioso, esta tendência revela um retrato do que é a desadequação da composição das listas à Assembleia da República e a heterogeneidade do país. Tomemos como exemplo a escolha do Partido Socialista para cabeça de lista. José Luís Carneiro é natural de Baião, onde fez carreira autárquica. Baião pertence ao distrito do Porto que elege 40 deputados, enquanto Braga “apenas” elege 19.

 

"Os presidentes de Câmara reclamam da centralização e falta de investimento nas zonas fora das duas áreas metropolitanas Lisboa e Porto, mas aceitam e fazem campanha por candidatos que não têm qualquer ligação afetiva à sua região"

 

Ainda assim, a escolha do partido do governo, para encabeçar o nosso distrito, recaiu sobre alguém que não tem qualquer ligação ao território, que não conhece as especificidades desta terra e das suas gentes, que não sabe quais as nossas necessidades e que, tirando estes 15 dias de campanha em que andará a passear-se por aqui, depois de eleito não deverá voltar a pôr aqui os pés, já que o Minho não fica no caminho Porto - Lisboa.

Esta subversão do princípio dos círculos eleitorais, com a colocação de figuras do partido como cabeças de lista por distritos com os quais não têm qualquer ligação é ilustrativa quanto às prioridades dos partidos:  importa é eleger as pessoas da máquina partidária, perpetuando assim o sistema de castas característico do partidarismo nacional.

Não obstante a Constituição ressalvar o facto de os deputados serem da nação e não do círculo eleitoral, estas circunstâncias têm ainda mais relevância num país onde não existe coesão territorial, e as desigualdades entre regiões são gritantes. Onde os presidentes de Câmara reclamam da centralização e falta de investimento nas zonas fora das duas áreas metropolitanas Lisboa e Porto, mas aceitam e fazem campanha por candidatos que não têm qualquer ligação afetiva à sua região.

Não é sobre feminismo ou regionalismo, é sobre zelar pelo que é o melhor para a nossa terra, as nossas gentes e isso só é possível com pessoas emocionalmente comprometidas com a nossa cultura e identidade.

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