Vitivinicultura - estratégias de adaptação à crise climática
Portugal está a vivenciar uma das piores situações de seca hidrológica de que há registo. Aproximadamente 96% do território encontra-se em seca severa e extrema. Os níveis da seca medem-se pelo índice PDSI (Palmer Drought Severity Índex), que considera a quantidade de precipitação, a temperatura do ar e a capacidade de água disponível no solo. Classifica-a de fraca, moderada, severa e extrema.
Em junho, de acordo com o Instituto Português do Mar e da Atmosfera (IPMA), 67,9% do território estava em seca severa, 28,4% em seca extrema e 3,7% em seca moderada, considerando 2022 o ano mais seco de que há registo. O efeito das alterações climáticas faz-se sentir de diversas maneiras, aumento da frequência de fenómenos climáticos extremos, perda de biodiversidade, incêndios florestais de maior gravidade e diminuição da produção agrícola.
O setor agrícola, em particular a fileira vitivinícola, enfrenta importantes desafios nas próximas décadas. O último relatório do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC, 2021) alerta para um aumento da temperatura e para uma diminuição das precipitações, o que nalgumas regiões poderá traduzir-se numa perda de aptidão vitivinícola e em mudanças na tipicidade dos vinhos.
Pretende-se ainda, no âmbito do Pacto Ecológico Europeu (European Green Deal) e das principais estratégias associadas, atingir a neutralidade carbónica até ao ano 2030, sendo necessário implementar medidas como a redução da aplicação de fitofármacos, mas sem diminuir a competitividade do setor. Deste modo, torna-se necessário desenvolver e implementar planos de adaptação às alterações climáticas que contribuam para a mitigação destes efeitos, garantindo a produtividade e a qualidade dos vinhos num clima em mudança.
As estratégias para mitigar os impactos das alterações climáticas devem considerar uma aplicação a curto prazo, assente em eficiência na utilização dos recursos naturais, na alteração das operações culturais e na implementação de soluções mais tecnológicas no setor. As técnicas e métodos de viticultura de precisão são excelentes aliados na gestão eficiente dos recursos hídricos, na proteção e manutenção da fertilidade do solo, na gestão de aplicação de fitofármacos. O recurso à diversidade genética da vinha constitui também uma boa estratégia de adaptação às mudanças climáticas. A recuperação de castas autóctones, a utilização de clones e porta-enxertos melhor adaptados a estas alterações potenciam a resiliência da cultura, e podem aportar novos perfis de vinhos.
Conciliar as estratégias supramencionadas com a adoção de diferentes modelos de gestão da vinha como os biológicos, biodinâmicos e mais recentemente regenerativos, pode ajudar a conter a crise climática. Estes modelos assentam no restauro e manutenção da vida nas vinhas, olhando-as como agroecossistemas funcionais com diversidade abaixo e acima do solo, tornando-as resistentes.
A biodiversidade que envolve o ecossistema vitícola não beneficia apenas a planta, como também contribui para maior fixação de CO2 atmosférico e contenção do aumento das temperaturas. Por sua vez, a concentração de carbono orgânico nos solos poderá melhorar a sua resistência, incrementar a resiliência à erosão, aumentar a sua capacidade de retenção hídrica, estimulando a biodiversidade, tornando-o um ecossistema equilibrado benéfico para a vinha e para o planeta.
Na vitivinicultura os planos e estratégias de mitigação das alterações climáticas devem considerar os diferentes cenários projetados para as regiões vitícolas, a capacidade de adaptação dos viticultores e a sua aplicabilidade.