ODIT e Guimarães Jazz: projetos estratégicos construíram âncoras culturais
Francisco Teixeira foi o convidado da última edição de “Conversas”. Desde as memórias de infância e do tempo em que “jogava à bola na rua”, da atividade associativa na escola secundária, os primeiros passos na luta partidária e os anos em que foi Vereador da Câmara Municipal de Guimarães, tudo procurámos recordar.
A totalidade da conversa pode ser seguida em: https://jornaldeguimaraes.pt/noticias/conversas-n%C2%BA-21-francisco-teixeira/
Na sua infância, a rua D. João I era uma espécie de microcosmos, um mundo especial que lhe marcou a infância?
Absolutamente! O grosso das pessoas que têm hoje 25, 30 anos, não imaginam como era a cidade de Guimarães no início dos anos 70. Não imaginam como era a cidade baixa, aquilo que é hoje a zona prestes a ser classificada, entre a rua D. João I e a rua da Liberdade, avenida D. João IV, rua de Camões, a zona de Couros.
As pessoas não imaginam como aquela zona estava híper povoada! Tinha imensa gente e no meio da imensa gente tinha imensas crianças. As crianças eram a paisagem mais conspícua de todas. As crianças viviam na rua e eu era um dessas, que andava na rua no início dos anos 70.
Ao entrar na atividade partidária, adere ao Partido Socialista. Porquê?
Por ser de esquerda, por ser defensor da igualdade, dos pobres, dos descamisados; por essas razões simples. Era absolutamente normal que eu entrasse no PS; não podia ser de outra maneira. Não poderia entrar no Partido Comunista porque era, e é, por definição, dogmático, quase religioso. Não poderia entrar no PSD porque era um partido conservador, na altura e hoje, embora hoje de outra maneira.
No final dos anos 80 e início dos 90, a sua intervenção política é forte. Nessa altura a sociedade vimaranense sofre um forte confronto entre política e futebol; foram tempos bastante conturbados.
Os conflitos entre a política e futebol não são de hoje. Sempre existiram. O futebol sempre foi uma grande força política, e o Vitória foi-o em particular. O Vitória é uma fonte e um dos principais marcadores identitários de Guimarães. Já o era na altura. O Vitória, na altura presidido por Pimenta Machado, tinha uma enorme força política e condicionava a vida política vimaranense. Mas condicionava mesmo!
É assim que pelos finais dos anos 80, António Magalhães e Pimenta Machado selam o acordo PS - Vitória. Há uma fotografia que o documenta.
É uma fotografia da Foto Simão que o Simão me ofereceu pessoalmente e que faz parte da pequena história local. Documenta o momento em que foi assinado um protocolo de intenções entre o PS, o PSD e o Vitória, pré-eleitoral, para um compromisso com o Vitória, nomeadamente o compromisso de vender o estádio ao Vitória por um valor simbólico e fazer umas obras de recuperação infraestrutural, muito significativas para a época.
Na época, e podemos sabê-lo pelas notícias de jornais locais, esteve no centro dessas negociações.
O que aconteceu foi muito simples: havia que fazer um negócio político com o Vitória para ganhar as eleições, para que o Partido Socialista ganhasse as eleições. António Magalhães tinha enorme dificuldade de relacionamento com Pimenta Machado. Pimenta Machado tinha um feitio difícil, para ser eufemístico, António Magalhães tinha uma personalidade também muito forte e, portanto, não se falavam, não tinham relações, mas havia que criar um encontro de vontades. Até porque era absolutamente correto e justo, do ponto de vista político, que se tornasse de direito aquilo que já era de facto. Quer dizer, o estádio do Vitória era o estádio municipal, mas na verdade era o Vitória que o geria integralmente, embora fosse a Câmara que o pagasse e não metesse lá “nem prego, nem estopa”. E havia que fazer o óbvio. E o óbvio era dar, ou mais exatamente, vender por um preço simbólico o estádio municipal ao Vitória. Depois, a maneira política de compor isto, foi que não fosse só o PS, mas também o PSD, a aparecer neste “negócio”.
No cargo de Vereador da Cultura criou a ODIT e o que viria a ser o Guimarães Jazz.
A ODIT e o Guimarães Jazz foram projetos estratégicos que visavam construir âncoras culturais. Fui eu que fiz as propostas à Câmara e que financiei o Guimarães Jazz através da Zona de Turismo para que o Guimarães Jazz se fizesse, já que o subsídio direto da Câmara não chegava. Fui eu que convidei o Convívio, enquanto representante e Vereador da Câmara de Guimarães, para que o Convívio, com a Câmara, como se pode documentar pelos jornais da época, fizesse o Guimarães Jazz. Aliás, contra muita gente dentro do Partido Socialista e dentro da Câmara. Se eu não tivesse lutado fortemente pelo Guimarães Jazz, se não tivesse investido política e financeiramente, nomeadamente através da Comissão Municipal de Turismo da altura, o Guimarães Jazz simplesmente não se tinha feito.