A cobardia do Governo
Atravessamos mais uma crise de fogos florestais, que dizimou uma área considerável, principalmente no centro do país. No fim de semana de maior incidência, a ministra da Administração Interna desapareceu. Segundo os autarcas dos concelhos mais afetados, esteve incontactável. Ao contrário de há uns anos, o Presidente da República não demitiu a ministra e presidiu ao Conselho de Ministros. No final, o Primeiro Ministro dá uma conferência de imprensa sem direito a perguntas.
Nessa declaração, Luis Montenegro aponta o dedo aos “interesses que sobrevoam os incêndios”, mas nunca especifica nem esclarece. Como os jornalistas foram impedidos de fazer o seu trabalho, ficam as dúvidas sobre quem ou quais. Vai ainda mais longe, veste a camisola que não é dele e sim do Ministério Público, prometendo “ir atrás” dos incendiários. Acontece que os especialistas desmentem esta tese, e o que o Primeiro Ministro faz é competir com a extrema-direita no discurso populista. Aponta o dedo a um inimigo, apresenta uma solução simples para o problema complexo, e ao mesmo tempo não se sujeita a qualquer escrutínio sobre as políticas públicas florestais.
As causas para estes fenómenos extremos são muitas. As alterações climáticas fazem com que haja um clima de altas temperaturas, baixa humidade e ventos fortes. Estas condições são propícias para a propagação rápida do fogo, em particular em locais onde o eucalipto é praticamente a única espécie. A liberalização do eucalipto começa no governo do PSD/CDS e continua com os governos PS e, agora, novamente com o PSD/CDS. Atualmente, 10% do território nacional é eucalipto. É impossível ter uma floresta sustentável e resiliente com esta mancha eucaliptal.
Por outro lado, a excessiva litoralização do país levou ao abandono dos territórios do interior. Os outrora pastores e agricultores sabiam como cuidar dos terrenos e protege-los de fenómenos climáticos extremos. Sem incentivos e com uma atividade pouco lucrativa, paulatinamente, foram deslocando-se para as cidades do litoral. Elevada dispersão da propriedade e abandono são, por isso, fatores que também contribuem para uma floresta que acumula ignições e combustível para alimentar fogos de maiores dimensões.
No entanto, apesar destes fatores estarem identificados como os maiores causadores de incêndios, Luis Montenegro é cobarde e opta por adotar o discurso simplista da extrema-direita em vez de apresentar soluções para os problemas estruturais do país. Além de uma gestão política desastrosa, percebeu-se o vazio programático.
Entretanto, tivemos também a confirmação por parte do Ministro dos Negócios Estrangeiros que o navio com bandeira portuguesa leva, efetivamente, explosivos para Israel. Apesar disso, o Governo não tem coragem de retirar a bandeira nacional e condenar esta atividade. Sabemos que estes explosivos vão ser utilizados para matar mulheres e crianças, destruir casas, escolas e hospitais, mas as manchas de sangue nas mãos não incomodam Paulo Rangel. A cobardia para enfrentar um estado terrorista, que trata os princípios democráticos como lixo, seja a vida humana ou a liberdade de imprensa, é imensurável. Portugal deve estar comprometido com o direito internacional e jamais devemos ser cúmplices do genocídio na Palestina.