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A estética e a cosmética…

Filipe Fontes
Opinião \ terça-feira, março 25, 2025
© Direitos reservados
Quando se verifica que tudo isto é suporte e alimento para humor e quando se regista que este mesmo humor tem sucesso e desperta interesse, triste é pensar como chegamos aqui…

Independentemente da natureza, dimensão, complexidade e impacto, a sucessão de acontecimentos constrói a história de todos nós e vai corporizando aquela inevitabilidade tão certa quanto imparável: o presente que antes de ser passado, deixou de ser futuro! Tal ainda mais sentido faz num momento em que o tempo parece mais acelerado do que tantas outras percepções já ocorridas, mais instável do que tantos temores já experimentados, mais desafiador do que tantas oportunidades já criadas e disponibilizadas. Na verdade, hoje, o tempo parece não importar, tamanha é a sua voracidade. Na verdade, hoje, o tempo continua a condicionar e limitar, tamanha é a sua capacidade de compassar e ritmar a transformação do presente em passado, do futuro em presente.

O país vive um momento de sobressalto fruto deste tempo tão predador e imprevisível. Uma notícia gerou uma percepção, um silêncio criou um indício, um processo alimentou o empolamento, a (má) gestão da palavra construiu a dúvida e, sem perceber ou se aperceber, o país abraça uma dita “crise governativa” e novo processo eleitoral, num resultado ainda desconhecido na sua complexidade e dimensão, mas que (julga-se) a todos surpreenderá… porque, na verdade, seja qual for o mesmo, sejam quais forem os “rostos repetidos” ou os ”novos rostos”, a sensação que fica(rá)… é que tudo fica(rá) igual!

Ao longo deste último período temporal, dominado por uma empresa familiar e especializada, por uma inquirição errante e uma resposta titubeante, fica a constatação da falta de estética e do excesso de cosmética na prática política nacional. Falta a “essência da coisa” e a arte e prazer no “saber e saber fazer”. Sobra o “disfarce da coisa” e a construção de uma aparência, para tudo parecer e esconder, para salvar o momento, apenas este!

(entre uma e outra, fica também o exagero do egoísmo e da assunção do ego cuja expressão “ainda está para vir alguém… mais do que eu!” é exemplo maior)

Neste tempo, afinal, o que fica e resulta?

Uma notícia que, na sua génese, pode ter sido resultado da pertinência do assunto e do seu significado, como também da maledicência para alimentar desvio e percepção. Depois, uma resposta ora silenciosa, ora espartana em palavras e explicações, dominada pela conveniência e “presciência” de que tudo não passará de “espuma dos dias”. A esta, fixou-se persistência, transformando-se a notícia em tema recorrente dia após dia, dando corpo a um confronto entre a obediência (daqueles que seguem sem questionar ou criticar, como se a verdade com perguntas não seja saudável) e a (falta de) pertinência (daqueles que confrontam ou para saber, ou para condicionar, prejudicar ou aproveitar).

Perante uma consciência emergente e progressiva de que tudo poderia crescer, mais se poderia saber (porque maior a desconfiança de que tudo poderia ferir e impactar, porque cada vez mais incómodo e difícil gerir), encontramos a palavra decência e nela nos detemos para lhe lamentar a falta, para alimentar uma esperança cada vez mais ténue de que, apesar de tudo, amanhã poderá ser um dia mais decente e esclarecido.

Decência – no sentido lato, rigoroso e assertivo da palavra, conjugando sinceridade sem interesse, preocupação sem cálculo, verdade sem juízo, capacidade sem esperteza, genuinidade sem egoísmo – foi algo afastado deste tempo que nada motiva a sorrir.

Não se trata de decência na perspectiva mais pejorativa do termo, daquele tom calunioso e ofensivo, antes da decência ética, da probidade, daquele olhar para a realidade baseado na imparcialidade e sobreposição do bem maior, recorrendo à verdade e à ciência, ou seja, ao serviço público!
Assistimos à transformação do parlamento em plataforma negocial, à transformação de instrumentos institucionais relevantes – moções e comissões – em ferramentas de combate táctico, à gestão de informação e disponibilização de documentos como se a verdade fosse construção por interesse ou conveniência, resultado da gestão temporal e leitura individual, e não fruto de factos impactados, na realidade, à transformação da comunicação e linguagem em armas de arremesso e criação de percepções e indícios, com um recrudescimento de exageros.

Quando se verifica que tudo isto é suporte e alimento para humor e quando se regista que este mesmo humor tem sucesso e desperta interesse, triste é pensar como chegamos aqui…

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