Os árbitros são mudos mas não são cegos nem surdos
A arbitragem e os árbitros, em concreto, estão sempre na primeira linha de fogo quando se debate futebol em Portugal. É a classe mais visada, a menos protegida e a que maior poder tem para poder definir o rumo de um jogo. Diariamente os nomes dos árbitros são lançados para a fogueira da inquisição pública, ardendo num lume que de brando tem muito pouco. Põem-se em causa todas as facetas, desde a pessoal, à profissional, enche-se a boca para ofender, denegrir e achincalhar homens que, depois dos 90 minutos da bola a rolar são pais, filhos, maridos, têm vida privada e social.
Estão à mercê da clubite dos adeptos, das descargas emocionais de treinadores e jogadores e são, amiúde, o escudo que os dirigentes usam para desculpar fracassos.
Destes homens, lançados às feras quais romanos nas arenas, pouco conhecemos a voz, o que pensam da atividade que exercem, o que entendem do jogo que arbitram, como explicam as decisões que tomam, o que viram no relvado que os levou a uma ou outra tomada de posição.
São homens que têm de ser mudos, mas não podem ser cegos nem surdos. Homens que, do meu ponto de vista, não têm dos dirigentes de arbitragem da Federação Portuguesa de Futebol a proteção que mereciam. Dirigentes calados, que deixam o circo arder, e que vão tomando decisões que, ao olhar dos adeptos, não fazem grande sentido. E não as explicam, não tentam convencer que aquilo que defendem é o melhor.
Têm apenas na APAF, muitas vezes errática, a única voz ativa em defesa dos seus interesses. Mas deixam numa associação de classe, que não passa disso mesmo, a função de ir fazendo uma queixinha aqui e outra acolá, para marcar posição.
Se estes homens, e quem os dirige, não têm nada a esconder era bom que lhes pudessem soltar a língua e deixá-los explicar o fundamento das suas decisões. Até um juiz em tribunal explica as posições que toma, fundamenta-as, sustenta-as, e os árbitros, nos casos mais polémicos de cada jogo deveriam fazer o mesmo. Talvez essa situação pudesse mitigar o ambiente de suspeição que reina no seio da arbitragem e, ouvindo da própria voz dos árbitros a explicação, os adeptos pudessem ser mais compreensivos. Se já os relatórios são públicos e sabemos que o treinador X ou Y foi expulso porque disse isto ou aquilo, todos ganharíamos se outras decisões fossem explicadas.
Sei bem que este soltar da língua dos árbitros não depende exclusivamente da Federação Portuguesa de Futebol, mas se este organismo tem a influência internacional que se apregoa então que a faça valer para alterar o estado das coisas.
O futebol com certeza que agradecerá.