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Crime sem condenação

Rui Antunes
Opinião \ terça-feira, novembro 23, 2021
© Direitos reservados
Insultos racistas acontecem em vários eventos desportivos sem exemplos de sanção. A prática desportiva é uma ferramenta de solidariedade, inclusão e igualdade.

Em fevereiro de 2020, o jogador Moussa Marega abandonou o jogo entre o Vitória Sport Clube e o Futebol Clube do Porto, que decorria no Estádio D. Afonso Henriques, em Guimarães, depois de ser humilhado por alguns adeptos por causa da cor da sua pele. O caso teve repercussões mediáticas e o debate sobre o racismo no desporto, em particular no futebol, estava lançado na sociedade portuguesa. Depois a pandemia tomou as atenções e o tema nada evoluiu. A humilhação e desumanização provocada pelo comportamento racista daqueles adeptos ficou quase dois anos à espera de justiça e ficou tudo na mesma.

Os adeptos fazem um pedido de desculpas e o clube responsável pelo recinto não sofre qualquer sanção. O Ministério Público propôs a suspensão do processo porque os adeptos em causa "não atuaram com um grau de culpa elevado", propondo o pagamento de uma multa e um pedido de desculpas público. Ou seja, como escrevia o “Jornal de Notícias”, os insultos racistas ficam sem culpados, não há acusações nem condenações. O Tribunal Arbitral do Desporto anulou o castigo imposto pelo Conselho de Disciplina da Federação Portuguesa de Futebol de três jogos à porta fechada e do pagamento de multa, por não ter ficado demonstrado que o VSC tenha “promovido, ou sequer consentido ou tolerado” os cânticos racistas. No entanto, o artigo 187.º do Regulamento Disciplinar da Liga Portuguesa de Futebol refere que há responsabilidade objetiva do “clube cujos sócios ou simpatizantes adotem comportamento social ou desportivamente incorreto”.

As estruturas representativas do futebol profissional, nomeadamente a FPF e a Liga de Clubes têm promovido iniciativas em defesa do fair play desportivo e contra o racismo. A Assembleia da República aprovou um diploma com instrumentos de combate à violência no desporto, nomeadamente ao racismo nos recintos. Apesar desse esforço, parece ser insuficiente face à realidade. Pedro Almeida, investigador da Universidade de Coimbra, na tese de doutoramento “Futebol, Raça e Nação em Portugal”, explica que “o modo como as culturas do futebol em Portugal naturalizam a ideia de que o 'outro' não cabe nas fronteiras da portugalidade, confirma que a nação não é percecionada como sendo multirracial”.

Em Portugal, insultos racistas acontecem em vários eventos desportivos sem grandes exemplos de sanção exemplar. Precisamos de censurar, clara e inequivocamente, comportamentos lamentáveis dos adeptos e garantir que a prática desportiva é uma ferramenta de solidariedade, inclusão e igualdade. Assim como temos de combater, em todas as esferas da nossa sociedade, o racismo estrutural, que leva a que 55% dos portugueses considere que existem raças superiores, segundo o European Social Survey, aplicado em Portugal, em 2020, e o racismo institucional, impedindo decisões judiciais, como a do jovem Danijoy Pontes, que foi condenado a seis anos de prisão por cometer, pela primeira vez, furto de telemóveis no metro (morreu na prisão e a família não sabe as verdadeiras causas).

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