Deplorável
A crise política que o país viveu nestes últimos dias resulta exclusivamente da irresponsabilidade das duas principais figuras do Estado. O presidente da República e o primeiro-ministro andaram vários dias a criar polémicas vazias, de costas voltadas para as pessoas. O único objetivo é alimentar a bolha mediática que tanto criticam.
Por um lado, temos Marcelo Rebelo de Sousa a agitar a bandeira da dissolução da Assembleia da República durante semanas. Como tinha pouco fundamento, acabou por engolir o sapo e nada fazer. O grande problema do presidente é falar do que não deve e não falar do que realmente devia falar. Sobre o aumento das pensões abaixo da inflação, não disse nada e promulgou o diploma. Sobre a nomeação de três homens para o Tribunal Constitucional, que resulta de uma subrepresentação de mulheres (4 em 13), não fez qualquer comentário. Sobre a vida partidária, tem sempre muito a dizer, seja da política de alianças do PSD ou da composição do governo do PS.
Do outro lado, António Costa lidera um governo que normaliza a mentira. A ministra do Trabalho e Segurança Social mentiu sobre a sustentabilidade do sistema de pensões para recusar o aumento em linha com a inflação. O ex-ministro das Infraestruturas mentiu sobre a indemnização à administradora, que não conhecia, mas afinal tinha aprovado. O atual ministro das Infraestruturas mentiu sobre a reunião preparatória da audição da diretora executiva, que foi ele quem organizou e convidou. Não são lapsos nem esquecimentos, são mentiras sistemáticas que anulam a credibilidade deste governo. É a prepotência da maioria absoluta.
O mais grave de toda esta novela escrita por João Galamba é ter estas duas figuras do estado a falar de computadores e alegadas agressões e nunca sobre as mentiras do ministro. Falar ao país em horário nobre exige comunicação sobre problemas realmente importantes para o país. Ninguém quer saber o que se passa no gabinete do ministro. Mas é muito grave ter o primeiro-ministro a acusar um cidadão de roubo e agressão na praça pública, em direto para todas as televisões. A celebre frase “à justiça o que é da justiça”, usada para não comentar vários casos judiciais de governantes socialistas, foi deixada na gaveta. António Costa não teve qualquer pudor em culpar o adjunto, enquanto deveria presumir a inocência, pelo menos até ouvirmos a defesa do próprio. Seria este o momento para os jornalistas lhe perguntarem sobre as negociatas do Sócrates quando foi ministro do seu governo. Desta vez, já não pode recusar responder.
O país não precisa de guerras entre palácios. As pessoas querem repostas para os problemas da sua vida. Querem escolas com professores motivados, consultas atempadas nos hospitais, transportes públicos, salários justos e casas para morar. Querem um país digno para terem uma vida boa.