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Imposto, para que te quero!

André Teixeira
Opinião \ domingo, junho 20, 2021
© Direitos reservados
Sem impostos não existiria o estado social, não existiriam serviços públicos e não existiria a Democracia.

O poder de criar e estabelecer impostos é considerado por muitos um dos principais pilares do estado-nação, a par do monopólio da violência legítima. Os registos mais antigos de tributação fiscal advêm de 4000 a.C., indicando que a ideia de que os habitantes de um determinado território deveriam ceder parte dos seus rendimentos em nome da satisfação de necessidades coletivas, ou simplesmente da vontade dos seus governantes, é já anciã. A capacidade de cobrar impostos está intimamente ligada à qualidade e profundidade dos esforços censitários de um país, sendo esta a principal razão para o desenvolvimento de inúmeras técnicas e modelos administrativos. Após a introdução de troca e comércio entre nações e territórios, impostos assumiram uma função de equilíbrio de forças entre grupos, permitindo combater os desequilíbrios financeiros entre eles e fazer guerra sem mobilizar exércitos.

Com a Revolução Industrial, o surgimento da sociedade de consumo e a proliferação do capitalismo moderno surgiram também as conceções políticas de “direita” e “esquerda”, cujas posições sobre a natureza dos impostos constituem uma importante linha de separação ideológica. Tudo isto para dizer que impostos são essenciais para o funcionamento de uma nação, quer consideremos que estão adequadamente implementados ou não. Em 2020, os impostos representaram cerca de 34,8% do PIB português, sendo a principal fonte de receita do nosso Estado. Sem impostos não existiria o estado social, não existiriam serviços públicos e não existiria a Democracia.

É portanto espantoso como as maiores empresas multinacionais se têm conseguido manter longe da tributação explorando as desigualdades e falta de cooperação entre países. Paraísos fiscais nascem da vontade de atrair capital estrangeiro, prometendo taxas reduzidas ou inexistentes para empresas ou indivíduos que neles depositarem o seu dinheiro. Acontece que a natureza transfronteiriça de entidades como gigantes tecnológicos lhes permite gerar receita num país e declará-la noutro, evitando contribuir para os cofres das nações cujos cidadãos lhes valeram essa receita e privando essas nações dos fundos com que neles investir. O jogo de fuga ao fisco, já de si preocupante no cidadão comum pela falta de consciência cívica demonstrada, tem com as grandes empresas graves impactos na capacidade de ação dos nossos estados. Se acreditarmos que quem contribui para a criação de riqueza deverá beneficiar dela, então é essencial que quem a detém seja forçado a contribuir.

É, portanto, com cuidadoso otimismo que vejo o compromisso do G7, o grupo das sete maiores economias democráticas liberais, em instituir uma taxa de imposto global mínimo para multinacionais de quinze por cento. Podemos argumentar que a percentagem é baixa, que a medida ainda está na sua infância, que este clube de nações ricas ainda terá de enfrentar os seus parentes mais iliberais, mas não podemos negar que este é um acordo de importância histórica. Sendo certo que os gastos com a pandemia reforçaram a urgência de aumentar a receita fiscal, a ideia de que talvez seja possível aos diferentes países concordar com uma taxa e sistema para evitar paraísos fiscais e, portanto, a perda de contribuições de grandes empresas, é uma lufada de ar fresco numa ordem financeira global que precisava desesperadamente dela.

Será que finalmente assumiremos a solidariedade internacional como uma necessidade, abrindo portas para cooperação futura em matérias de organização bancária, energia, ambiente e direitos humanos, em vez de tentar defender interesses bairristas atraindo corporações ricas em lucros e pobres em escrúpulos? Não faço ideia, mas há que aplaudir passos na direção correta quando os vemos.

 

Nota: artigo de opinião publicado originalmente na edição #03 de Jornal de Guimarães, a 18 de junho de 2021

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