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"Le Jeune", Rui de Serpa Pinto e as gravuras de Sabroso

Gonçalo Cruz
Opinião \ quarta-feira, outubro 11, 2023
© Direitos reservados
No mês de agosto de 1928, Serpa Pinto esteve no Castro de Sabroso, na companhia de duas destacadas figuras da cultura galega de então: Florentino López Cuevillas e Fermín Bouza-Brey.

Assim chamavam a Rui de Serpa Pinto os colegas arqueólogos, devido à tenra idade com que se dedicou a diferentes áreas do saber, que iam da Pré-história à Geologia, da Numismática à Antropologia, da Matemática à Engenharia Civil. Serpa Pinto foi sócio e colaborador das várias coletividades que então promoviam a investigação e a comunicação científica, como assinala a nota biográfica da Universidade do Porto. Entre estas instituições se conta a Sociedade Martins Sarmento, em cujo órgão, a Revista de Guimarães, Serpa Pinto publicou uma série de artigos sobre espólio variado do Museu da SMS.

No mês de agosto de 1928, numa das muitas excursões arqueológicas que realizou, Serpa Pinto esteve no Castro de Sabroso, na companhia de duas destacadas figuras da cultura galega de então, membros do grupo Nós, que dirigia a revista ourensana com o mesmo nome: Florentino López Cuevillas e Fermín Bouza-Brey. Talvez da companhia dos dois eruditos nesta visita tenha surgido o convite para escrever, na revista Nós, um interessante trabalho de síntese sobre a Arte Rupestre em Portugal, em fevereiro de 1929.

É neste trabalho – que, recentemente, incluímos na documentação da exposição Redescobrindo o Castro de Sabroso – que Serpa Pinto descreve a visita de campo feita com os colegas galegos. Talvez fruto da sua especial apetência pela arte pré-histórica, são as gravuras rupestres que mais parecem chamar-lhe a atenção em Sabroso, registando motivos então inéditos. Talvez isto se explique porque o registo se fez depois das grandes destruições de 1919, que desmontaram penedos inteiros de Sabroso... Destruídas várias gravuras, talvez outras tenham ficado à vista.

Gravuras de antropomorfos registados em Sabroso por Rui de Serpa Pinto

É o caso da rocha onde atualmente se encontra o marco geodésico, onde apenas se conheciam os círculos concêntricos e covinhas, mas não as figuras antropomórficas, esquematicamente representadas: "Debruçados sobre elas e tendo limpo o musgo que cobria os seus traços delidos, apareceu uma composição inédita. (...) Num traço longo, que figura o pescoço, insere-se perpendicularmente outro, rematado por covinhas e orientado N S, representando os braços (...) Os membros inferiores aparecem sob a forma de dois traços paralelos, recurvados na extremidade para indicar os pés. (...) Juntamente com a figura humana (...) e logo acima dela, aparecem agrupadas duas estilizações extremas em forma de U ou de ferradura, que, representarão a associação dos dois sexos."*

Os trabalhos de campo realizados por Daniela Cardoso e Giorgos Iliadis, em 2018, proporcionaram um registo mais pormenorizado desta rocha, onde, além das duas composições descritas por Serpa Pinto – que deverão ser duas figuras humanas estilizadas – existe ainda um terceiro antropomorfo que as técnicas de registo atuais permitiram ver. Contrariamente aos conjuntos de círculos concêntricos, que podem ser anteriores à ocupação do Castro de Sabroso, as figuras antropomórficas aparentam ser contemporâneas do mesmo, ou seja, poderão tratar-se de adições, feitas na Idade do Ferro, numa rocha já anteriormente gravada. Isto pode indiciar uma longa diacronia e continuidade na forma como certos locais eram vistos pelas comunidades que por aqui andaram na Antiguidade**.

Rui de Serpa Pinto, "le Jeune", tem assim o seu nome ligado ao estudo de Sabroso. Um facto que deve ser sempre recordado. Jovem ficou, para sempre, o investigador portuense, falecido com apenas 25 anos de idade, em 1933.

* Rui de Serpa Pinto, "Petróglifos de Sabroso e a Arte Rupestre em Portugal", Revista Nós, 62, 1929 (citação das páginas 19 e 20).

** Daniela Cardoso et alii, "Montes sacros na Pré-história e na Proto-história. O caso do Monte do Côto de Sabroso, Guimarães, Noroeste de Portugal", Caderno de Artigos do V Congresso Santuários, 2020.

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