Um ano repleto de escolhas
Inicia-se um ano de eleições, em que os Estados Unidos e a Europa terão a possibilidade de definir o seu rumo para o resto da década. O mundo encontra-se numa encruzilhada, onde as respostas e sistemas criados após a Segunda Guerra Mundial aparentam estar demasiado cansados para assegurar o futuro de um mundo multipolar onde a democracia não mais parece imbatível ou inevitável. O fim da história de Fukuyama chegou e passou, deixando para trás uma realidade onde a hegemonia dos EUA é colocada em causa, onde o Sul Global reclama por um lugar à mesa e onde os terrores do autoritarismo e fascismo ressurgem, ecoando a calma antes da tempestade que consubstanciou a segunda década do século passado. Para iniciar este ano repleto de escolhas, gostaria de relevar as três eleições mais importantes que enfrentaremos: as Legislativas de março, as Europeias de junho e as americanas de novembro.
Em Portugal assistimos ao fim de um ciclo de governação, abrindo as portas para uma nova fase da nossa vida política. Com a sombra de um partido que finalmente se assume abertamente fascista a cair sobre a eleição, Portugal escolherá uma nova geração de parlamentares e governantes. Após oito anos navegando de crise em crise, teremos diante de nós a oportunidade de dar um passo na direção correta... e também de deitar tudo a perder. Com a celebração dos 50 anos de Abril, chegam também dúvidas quanto à maturidade da nossa democracia, cujo fado será em breve depositado nas mãos de uma população que vê com desconfiança a política e aqueles que a exercem. Caberá aos eleitos renovar a confiança de que o sistema precisa, sob a pena de verem ruir os sucessos dos nossos egrégios avós em caso de falhanço.
Pouco tempo depois, teremos também um momento onde o Velho Mundo irá às urnas em uníssono, procurando definir o ideal de Europa que queremos. A desvalorização de que os sufrágios da União Europeia são alvo não diminui a sua importância, num momento onde é cada vez mais óbvio que apenas unidas poderão as nações europeias resistir a pressões internas e externas que as desejam dilacerar. É improvável que a UE seja capaz de fazer as reformas que necessita para aumentar a sua legitimidade democrática, ganhar a guerra nas suas fronteiras e afirmar-se como potência geopolítica, se no seu Parlamento tiver assento uma maioria de deputados opostos aos valores humanistas que a guiam desde a sua conceção. Seremos uma União de Estados? Qual é o estado da nossa União? As respostas a estas perguntas poderão ser desagradáveis se não as chegarmos a colocar, fingindo que o que acontece em Bruxelas não tem consequências em Lisboa.
Seremos também sujeitos a um importantíssimo momento eleitoral, no qual não teremos voz nem opção. As eleições presidenciais dos EUA, que muito provavelmente irão repetir o choque de septuagenários de 2020, definirão o papel futuro daquela que é ainda a maior potência do mundo. Apesar de toda a sua disfuncionalidade e hipocrisia, uma América desligada do seu papel de guardiã do modelo de democracia ocidental implica um mundo mais hostil, onde a lei do mais forte será cada vez mais recorrente. Não podendo o cidadão português votar nas eleições americanas, é seguro afirmar que o seu resultado será terrivelmente impactante para o nosso país. A “Pax Americana” não só não é eterna como é altamente volátil, e a absurda polarização do eleitorado americano não augura nada de bom.
Um ano tão crítico como 2024 exige de cada um nós interesse, cuidado e dedicação, independentemente de credo, crença ou ocupação. Acredito num Portugal para todos, que apenas poderá ser construído com a participação de todos. Maturidade implica decidir, tomando responsabilidade pelas nossas escolhas. Espero apenas que cheguemos ao final do ano sorrindo, orgulhosos das escolhas que fizemos pelo caminho.