Caminho, as motivações de um peregrino
No espaço em que vivemos, falando de peregrinos, os caminhos convergem para três localidades: Fátima, Terras de Bouro (São Bento da Porta Aberta) e Santiago de Compostela.
Já foram tempos em que “peregrinar” – viajar até a um lugar santo ou de devoção - se realizava por questões exclusivamente religiosas. Nos tempos atuais, vai assumindo a sua outra definição: viajar por terras distantes, sem especificar as razões para tal.
Os três lugares de devoção acima referidos podem exemplificar isso mesmo. As pessoas não vão em caminhada a esses locais somente por uma questão de “fé e devoção”, ou para “agradecer uma dádiva ou graça divina” ou para “obter a expiação das suas falhas ou pecados”. Mais recentemente, assiste-se a uma realidade em que os peregrinos se deslocam para um local em que o destino final (sendo naturalmente o culminar de um percurso) não esgota o propósito dessa peregrinação. Se o destino final é o corolário da viagem, o mais importante para esse peregrino é o que vai construindo ao longo dos vários dias da sua jornada. Poderemos dizer que a parte mais espiritual cimentada ao longo do trajeto se sobrepõe ao culminar da chegada ao seu destino. Fátima é o expoente máximo de uma peregrinação que vive muito das duas primeiras razões: por um lado, a “fé e devoção” e, por outro, o reconhecer de “uma graça divina”. Serão estas as principais razões que levam milhões de pessoas a visitar o Santuário. Em 2017, por ocasião do centenário, lemos na página oficial do santuário de Fátima que foram mais de 9 milhões de peregrinos, de 109 países, que participaram nas celebrações organizadas neste espaço fundado na Cova da Iria.
O segundo lugar religioso mais visitado do país (também o é em termos de esmolas e dádivas), São Bento da Porta Aberta, acrescenta uma forte componente de festa popular à devoção. Aqui, assiste-se à aliança de um “pagamento de uma promessa” ou de “um pedido”, à romaria popular, que também se reconhece no número elevado de “acompanhantes” que se juntam ao peregrino.
Finalmente, os Caminhos de Santiago serão aqueles em que os “meios” - o caminho, a paisagem e as pessoas que partilham o “Buen Camino” – ultrapassam, claramente, o fim em si, que é a chegada à catedral de Santiago. Os peregrinos que percorrem os Caminhos de Santiago não se limitam ao aspeto religioso. A componente espiritual, cultural e ambiental é relevante e ajuda a perceber o aumento das pessoas que confluem a Santiago de Compostela. Consultando o site oficial da Oficina do Peregrino, para o ano de 2019, o Caminho Francês é o mais percorrido (54%), 18% dos peregrinos são estudantes e, quanto aos motivos, 49% refe - rem os religiosos e outros e 11% referem motivos não religiosos.
Boas leituras e bons caminhos.
Editorial do Jornal de Guimarães em Revista, edição 04, julho de 2021