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25 de Abril em Guimarães

Álvaro Manuel Nunes
Opinião \ sexta-feira, abril 26, 2024
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Uma manifestação espontânea que saída do Liceu e desceria à Alameda percorreria várias artérias citadinas e dirigir-se-ia à Escola Secundária Francisco de Holanda, engrossando as suas fileiras.

Três manifestações marcaram efusivamente a aclamação do 25 de Abril em Guimarães, após as primeiras informações via rádio e televisão que chegavam a casa dos portugueses.

De facto, “E depois do Adeus” de Paulo de Carvalho”, transmitido cerca das 23 horas pelos Emissores Associados e após a segunda senha emitida pela Rádio de Renascença através de “Grândola, vila Morena” de José Afonso, a cidade berço despertaria como as demais cidades, vilas e aldeias portuguesas com o comunicado do MFA, lido por Luís Filipe Rocha, pelas 7h30 horas da manhã, no dia 25 de Abril:

”As Forças Armadas desencadearam, na madrugada de hoje, uma série de ações com vista à libertação do País do regime que há longo tempo o domina.”

Como é óbvio, Guimarães acompanharia, como as restantes terras deste país, o desenrolar dos acontecimentos de ouvidos colados à rádio e olhos presos à TV. Porém, a primeira manifestação de apoio ao 25 de Abril, ocorreria apenas na manhã do dia 26 de Abril de 1974, por iniciativa dos estudantes do Liceu Nacional de Guimarães, que nessa manhã decidiram boicotar as aulas, contra a vontade do vice-reitor em exercício.

Uma manifestação espontânea que saída do Liceu e desceria à Alameda percorreria várias artérias citadinas e dirigir-se-ia à Escola Secundária Francisco de Holanda, engrossando as suas fileiras ao longo do percurso com estudantes de outras escolas.

Sob o título “Manifestações de regozijo pela vitória das Forças Armadas”, o Notícias de Guimarães de 4 de Maio de 1974, reporta a ocorrência:

 

“Na sexta-feira passada, dia 26, nesta cidade, realizaram-se várias manifestações de regozijo pelo êxito do movimento militar.

Numa das manifestações da parte da manhã milhares de estudantes dos estabelecimentos de ensino aclamaram as Forças Armadas, dando vivas a Portugal e à liberdade, entoando em coro o hino nacional.”

 

(…)

Todavia, não é de todo de estranhar que haja sido uma manifestação estudantil a primeira a sair para a rua. Com efeito, nos anos antecedentes ao 25 de Abril, muitos eram os indícios juvenis contra a guerra colonial, que amargurados ansiavam também mudanças na educação e política juvenil, certamente influenciados pelos movimentos de Maio 68 em França e a Crise Académica de 1969, em Coimbra, a cujo leme esteve o vimaranense Alberto Martins, nascido a 25 de Abril. Por outro lado, não se pode sonegar o papel de algumas organizações juvenis, quer associativas quer religiosas e partidárias. Realmente, a cidade, irradiava uma certa pujança cultural por parte do seu Cineclube e Teatro de Ensaio Raul Brandão, bem como por parte do grupo de jovens ligados à Assembleia de Guimarães que abanariam um pouco a comunidade local com alguns colóquios e atividades culturais de canto e poesia, consideradas “proibitivas” para os padrões da época. Ademais, a estudantada conhecia bem as imposições da censura aos cartazes do Pinheiro e ao texto do Pregão no decurso das Nicolinas e passara inclusive por uma récita liceal polémica parcialmente censurada,  em 1971, a última realizada no Teatro Jordão.

 Com efeito, lutas que a nível político contariam também com a ação relevante de vários democratas, nomeadamente J. Santos Simões, que na ação cultural vimaranense e na reforma e democratização do ensino pugnariam, como a obra “Engrenagens do Ensino” testemunha perentoriamente “na defesa da educação geral humanista e de uma educação para a cidadania democrática.”

No entanto, na tarde deste mesmo dia, pelas 19 horas, uma outra manifestação ocorreria, organizada pela Comissão Concelhia de Guimarães do Movimento Democrático do Distrito de Braga, que reuniria milhares de pessoas.

O mesmo jornal, acima citado, relata o evento:

“Ao fim da tarde e promovido pela Comissão Concelhia do Movimento Democrático do distrito, efetuou-se no Largo do Toural, uma manifestação, na qual tomaram parte milhares de titulares.

Da varanda do Hotel Toural discursaram o Dr. José Augusto da Silva e Santos Simões; e ainda o Sr. Eduardo Ribeiro, encontrando-se presente o capitão Machado Ferreira de Infantaria 8, que agradeceu as manifestações dirigidas às Forças Armadas”

A multidão aplaudiu os oradores e soltou novamente vivas a Portugal e à liberdade, entoando em coro o hino nacional”.

Efetivamente, o 25 de Abril deve-se a muitos resistentes que nas décadas anteriores lutaram contra a ditadura salazarista, entre os quais se destacam Emídio Guerreiro e Santos Simões, J. Casimiro Ribeiro, na altura preso em Caxias, e muitos outros vimaranenses como Hélder Rocha, Lurdes Mesquita, bem como vários outros, cujos depoimentos constam da obra “25 – Guimarães, daqui houve resistência”, obra singular de recolha e organização de textos de César Machado sobre essas vivências, alguns dos quais frequentadores assíduos do Café Toural, conhecidos como o grupo do reviralho.

No entanto, nova manifestação eufórica em prol da Revolução dos Cravos ocorreria ainda no dia 29 de Abril, redigida no citado semanário:

“Na segunda-feira, ao fim da tarde a população vimaranense aglomerada nas ruas e praças da cidade vitoriou as Forças Armadas, durante a passagem de elementos do Regimento de Infantaria 8 que, vindos do Porto se dirigiam à sede do distrito.

Das varandas que se viam repletas de pessoas foram lançadas flores e nuvens de papelinhos com as cores nacionais. Na Praça do Toural saudou as Forças Armadas o Dr. António Mota Prego, agradecendo aquela calorosa manifestação o capitão Rui Guimarães, e Infantaria 8”

Com efeito, um comício em que usariam da palavra Eduardo Ribeiro, Santos Simões, José Augusto da Silva, o primeiro Presidente da Comissão Administrativa da Câmara Municipal, pós-25 de Abril, e o capitão vimaranense Rui Guimarães, em nome dos militares.

Posteriormente, nos dias imediatos, surgem as primeiras controvérsias, como é o caso da transferência de poder na Câmara Municipal de Guimarães, parcialmente despoletado pelo telegrama assinado pelo Presidente da Câmara da altura, Bernardino Abreu:

“A Câmara Municipal de Guimarães na sua reunião após o vitorioso Movimento Militar do 25 de Abril apresenta a V. Exª. e todos os membros da Junta de Salvação Nacional, os seus respeitosos cumprimentos e oferece a sua colaboração, para tudo o que for feito a bem de Portugal”.

Ora, a resposta não se faria esperar. Assim, na edição de 11 de Maio do Comércio de Guimarães, um expressivo texto de primeira página, intitulado “Fora com eles”, replicava:

A Câmara Municipal de Guimarães em telegrama assinado pelo presidente Bernardino Abreu, ofereceram colaboração.

Pretendem “amarrar-se” como os náufragos ao rochedo …

Fora com eles! … Fora com eles! …

Exige-o a população vimaranense na sua maioria esmagadora.”

Nesta mesma edição são ainda publicados dois comunicados da Comissão Concelhia de Guimarães do Movimento Democrático: um que “deliberou substituir o nome de duas artérias centrais da cidade, como símbolos de bastiões fascistas”, como aconteceria ao Largo 28 de Maio e atual Largo 25 de Abril, bem como à Alameda Salazar, que passaria a denominar-se Alameda da Resistência ao Fascismo. Outrossim, um comunicado em que se dá conta da eleição de uma Comissão Administrativa Provisória para gerir a Câmara Municipal de Guimarães “em virtude da vereação municipal e do seu presidente não ofereceram confiança na prossecução da nova política determinada pelo programa do MFA”

O mesmo comunicado adianta ainda que “do facto foi dado conhecimento ao atual Presidente da Câmara (…) pelo Dr. António Mota Prego, às 13 horas de hoje, dia 8 de Maio, eu lhe propôs tomasse a iniciativa de reunir toda a Câmara, a fim de se demitir (…)

A resposta do Presidente da Câmara foi que não se demitia.

Esta atitude, inexplicável, à luz da profunda renovação da vida nacional, só poderia ter uma resposta: diligenciar tenazmente pela demissão de toda a Câmara Municipal de Guimarães.”

Porém, de facto, a alteração do poder executivo camarário seria consumada, como expressa o Comércio de Guimarães na sua edição de 18 de Maio de 1974 (sábado):

“Conforme se esperava a Câmara Municipal de Guimarães foi exonerada. Na quarta-feira tomou posse no Governo Civil de Braga, uma Comissão Administrativa, que ficou constituída pelos senhores:

- Presidente, Dr. José Augusto da Silva, advogado;

- Emílio de Abreu Ribeiro, comerciante;

- António Ribeiro Martins, construtor civil:

- José Ferreira Lopes, empregado de escritório:

- Carlos Alberto Nave, bancário;

-Aristóteles do Nascimento, professor;

- José Faria Martins Bastos, comerciante.

A transmissão de poderes efetuou-se no mesmo dia na Câmara Municipal-em ato que causou o maior regozijo na população vimaranense.”

Iniciava-se a transferência de poder e o caminho de um novo desenvolvimento da cidade, que o Poder Local democrático haveria de construir.

Obviamente, uma caminhada com altos e baixos ao longo destes últimos 50 anos em que seguramente muito foi feito, mas que muito está ainda para fazer …

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