A reconstrução da praça de toiros em 1947
Na madrugada de 28 Julho de 1947, já lá vão 75 anos, a escassos dias do início das Festas Gualterianas, a Praça de Toiros construída ao longo dos últimos meses junto ao cemitério da Atouguia, ardia completamente.
A Praça de Toiros que ia ser inaugurada no domingo seguinte, ficaria assim reduzida a cinzas, com exceção dos alicerces em pedra e a trincheira. Na altura, Guimarães mergulhou em profunda tristeza e o desânimo apoderou-se dos vimaranenses nas primeiras horas do alegado desastre. Com efeito, a tourada era um número fundamental do programa das Gualterianas, pelo que a falta de recinto inviabilizaria as duas corridas previstas para domingo e segunda-feira na qual marcavam presença nomes sonantes da tauromaquia. De facto, o cartaz tauromáquico anunciava o espada Diamantino Viseu, o novilheiro mexicano Pepe Luiz Vasques e os Forcados Amadores de Montemor-o-Novo e os cavaleiros Simão da Veiga e Conchita Cintron, entre outros, num elenco considerado promitente.
Porém, do desânimo à ação foi um ápice e uma outra chama, a da esperança, já começa a arder! Assim, seguem-se as manifestações mobilizadoras ao som dos acordes das bandas musicais dos Bombeiros Voluntários e da Oficinas de S. José e o Hino da Cidade cantado emocionalmente `”ó Guimarães, teu progresso e tua vida, é toda a nossa aspiração”, incita a meter mãos à obra.
Assim, quase de imediato, ocorre também uma primeira reunião na casa de Camilo Laranjeiro dos Reis. Depois surge a oferta de A. Salgado de fornecimento de madeira, e logo a seguir convoca-se uma reunião no Grémio do Comércio, com a presença da Comissão de Festas, com mestres construtores concelhios e do empresário tauromáquico José Rodrigues Trindade. E a conclusão seria: havia madeira, havia mestres, havia vontade … logo toca a avançar.
Deste modo, criaram-se os grupos de trabalho para meter mãos à obra, mobilizando-se empreiteiros, técnicos, e obreiros.
Entretanto a “Cabine de Som” instalada no Toural, dirigida por José Abílio Gouveia, apelava à colaboração bairrista dos vimaranenses. Como tal, nos escassos três a cinco dias que mediavam o início das festas, a Praça de Touros ressurgiria das cinzas, como fénix renascida, com o apoio de mais de 500 operários trabalhando dia e noite, colaboração dos empresários em materiais e meios logísticos e adesão dos estudantes, que em férias se ajuntariam voluntariamente ao empreendimento.
Simultaneamente, organiza-se um Cortejo de Oferendas que rende dezenas de contos e reúne uma grande abundância de géneros alimentícios, que iriam proporcionar as refeições aos voluntários, confecionadas e servidas por senhoras e meninas voluntariadas.
Um acontecimento e esforço titânico que a imprensa local e nacional referenciariam, como o título e subtítulo do Jornal de Notícias de 30 de julho deixa transparecer: “Toda a cidade de Guimarães trabalhava para a reconstrução da Praça de Touros /E a obra, dentro de cinco dias, ressurgirá das próprias cinzas”.
De facto, uma jornada épica que seria ainda recordada no poema “A nossa gente é assim”, publicado no Notícias de Guimarães, em 1947, há 75 anos, de autoria do vimaranense Delfim de Guimarães (1885-1962), que curiosamente, como em consonância, nasceria e faleceria nos finais de Julho:
“É gente que se move e não quer peias …
Da fidalguia aos rudes cutileiros
Há sangue a referver nas suas veias
De impávidos e célebres guerreiros …
Não adormece ao canto das sereias …
Gente que não atende a mesureiros
Que abominou, de sempre, as verborreias
Que arengadores de feira aventureiros
A nossa gente é assim … É orgulhosa.
Se lhe ferem a alma, é assombrosa
Na sua desafronta (sem defesa …)
É a raça que perdura inalterável
Do Rei Conquistador e formidável
Que nos doou a Pátria Portuguesa”.
Com efeito, “ a nossa gente é assim” …