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Guimarães
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As vistas do teleférico

Álvaro Manuel Nunes
Opinião \ terça-feira, julho 29, 2025
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Apesar do governo anunciar mais 200 salas e lançar para contratualização 6700 vagas em contratos de associação, apenas 69 entidades , em 27 concelhos,  viram as suas pré-candidaturas validadas.

Belas vistas estas da Montanha da Penha, nos 30 anos da ascensão cósmica sobre o espaço físico e social da cidade, apercebido no sobe e desce do teleférico, que neste mês de Julho nos projeta a novos horizontes espaciais com a adjudicação da Escola de Engenharia Aeroespacial da Universidade do Minho, a instalar na antiga Fábrica do Arquinho.  Empreitadas de requalificação que outrossim se estenderão para além dos limites urbanos, às Unidade de Saúde Familiar (USF) de S. Torcato, Serzedelo e Ronfe, que neste com muitos outros campos de batalha, para além de S Mamede, comemorada há dias, permitem (re)afirmar Guimarães nestes últimos 50 anos de Poder Local (e não apenas 40 anos!), novamente colocados a sufrágio nas próximas eleições autárquicas de 12 de Outubro.

Aliás a vila torcatense, que lá do alto da Penha se avista, está duplamente em festa. Não só pela adjudicação da requalificação da USF, mas também pela reabilitação recente da sua Escola Básica do Agrupamento do Vale de S. Torcato. Outrossim, como é óbvio, por mais uma Romaria Grande, que mantém viva a tradição. Além disso, perfazem mais de 850 anos da Carta de Foral do Couto do Mosteiro de 26 de Abril de 1173, outorgada por D. Afonso Henriques e mais de 750 anos da primeira referência histórica à sua Irmandade, em 1273, outrora designada por confraria. É obra! ...

S. Torcato, porém, faz-nos também abrir o baú do tempo e trazer à memória impressiva as páginas do médico e escritor vimaranense João de Meira (1881-1913), também nascido em Julho, o insigne mestre do pastiche e admirador camiliano, que nos legou a narrativa com tons passionais “Eusébio Macário em Guimarães” (a reler), cuja ação decorre entre a cidade-berço e S. Torcato, ao que se crê no decurso da primeira Romaria Grande:

“Eram três horas da tarde de um domingo de Julho. Enorme multidão enchia os terreiros, em frente da capela do Santo (...)

Fazia um calor sufocante, e todo aquele gentio numa grande alegria expansivamente pagã, esperava a transladação do mártir S. Torcato, feita com pompa solene e vistosa assistência, da Igreja Paroquial para capela primitiva, recentemente construída ali, nos Penedos de Maria do Monte de Maio”.

Um santo muito disputado que resistiria a três tentativas frustradas de transladação. Em 1501, quando o rei D. Manuel I ordenou a concentração nas sedes do concelho das relíquias dispersas e consequente transladação do corpo do santo para a Colegiada de Guimarães; a segunda, em 1597, quando o arcebispo D. Agostinho de Jesus e Castro ordenou a sua transferência para a Sé de Braga, tendo povo resistido à ordem com o toque dos sinos a rebate e armado com massarocas; a terceira, em 1637, por parte do arcebispo Sebastião de Matos e Noronha, que levou o povo a proclamar:

 

São Torcato, corpo santo

Trancai as portas por dentro

Que o Arcebispo de Braga

Quer o vosso rendimento.”

 

De facto, Guimarães continua a crescer entre um passado de memória, devidamente salvaguardado, apesar de, no seu passado recente, concretamente na segunda metade da década 60, ter sido demolido o belíssimo Café Oriental, inaugurado precisamente há 100 anos, em 1925, num crime de lesa património que nos indigna. 

Mas, para além das festas e arraiais, ainda com os Santos Populares a salivar na boca o sabor da sardinha na brasa (pois elas só são boas nos meses sem “r”), Julho regressou quente, a prenunciar férias, em especial por parte da estudantada que aguarda as notas finais dos exames nacionais, decisórios das suas novas vidas. Resultados que posteriormente os lançarão à louca corrida do alojamento, que como todos sabemos está pela hora da morte.

Aliás, em matéria de ensino, também não são positivos os dados do abandono escolar no ensino superior que continuam a subir, cifrando-se em 13,2% a percentagem de novos alunos que deixaram de estudar. Um caso a que certamente não será alheio o custo dos estudos fora de casa e carência de alojamento em residências universitárias. Uma situação que é ainda mais preocupante nos cursos técnicos superiores, com 28,1% de abandonos dos estudos no primeiro ano, o que representa 1,2 pontos percentuais relativamente ao ano anterior.

Porém, como não bastasse, problemas educativos que se estendem ainda a outros graus de ensino.

Com efeito, ao longo do ano, constatou-se que inúmeros alunos ficaram privados de aulas no ensino secundário (que o próprio Ministério da Educação não consegue quantificar, chumbando a Matemática!)

Na realidade e de acordo com o último relatório “Estatísticas de Educação”, apesar do aumento de docentes nas escolas, sobretudo nas privadas do pré-escolar e 1º. ciclo, registou-se uma diminuição de docentes nos ciclos seguintes e no secundário, um dos problemas mais graves do sistema educativo, que obviamente causam embaraços nas aulas normais e apoios e recuperação de aprendizagens.

Por isso, talvez seja “compressível” uma generalizada subida das taxas de retenção nos últimos anos, em especial no final do 3º. ciclo, que praticamente duplicaram, fatores a que certamente também não seria despicienda a pandemia o ensino à distância.

Mas novo ano letivo está já à porta, com muitos desafios (ainda) por enfrentar.  Na realidade, no pré-escolar, a exemplo de anos antecedentes, já se esboçam bastantes dificuldades, ainda (e já) a procissão vai no adro.

Realmente, ao que consta na imprensa, milhares de crianças estariam em lista de espera para de vagas no pré-escolar, procura que aumentou à boleia do programa Creche Feliz e que infelizmente para o pais correspondem a um período de ansiedade permanente, ano após ano.

De facto, apesar do governo anunciar mais 200 salas e lançar para contratualização 6700 vagas a concurso em contratos de associação, apenas 69 entidades , em 27 concelhos,  viram as suas pré-candidaturas validadas , que correspondem apenas a 22 novas salas e cerca de 1600 lugares, situação a que não será alheia as reservas dos candidatos aos  valores de apoio  atribuídos ( 208 euros mensais por criança e  15 mil euros por cada nova sala), que considerados exíguos e se agravam por não contemplarem  a alimentação e prolongamento de horário.

Deste modo, apesar da lei 22/2025 datar de Março deste ano, estabelecendo a universalidade da educação pré-escolar para as crianças a partir dos 3 anos de idade, subsistem vários constrangimentos a resolver num prazo muito apertado, com Setembro já à vista.

Sabemos, todavia, já neste mês de Julho, que o governo meteu mãos à consciência e ao saco do erário público e propõe agora passar para 12485 as vagas a concurso, nos contratos de associação.  Um aumento de vagas que no concelho de Guimarães permitiria um acréscimo das 45 previstas para 125 lugares.

Porém, uma emenda algo tardia (embora mais valha tarde do que nunca!). mas que continua a “pecar” pelo facto de o governo não ter mexido nas condições de apoio citadas e continuar a não assumir a alimentação e o prolongamento de horário, embora passe a ser possível a privados candidatarem-se a outros financiamentos, não só nas freguesias onde há carência de rede pública como também nas que lhes sejam confinantes. 

Veremos a curto-prazo se estes incentivos serão motivadores e quais as reações das freguesias ...

Assim, mais uma vez, ano após ano, uma situação em que manifesta claramente a falta de planeamento e trabalhos prévios a jusante, e a falta de investimento, ou a sua gestão a conta gotas. Na realidade, de acordo com as estatísticas divulgadas pela DGEEC, em 2023-2024, a rede pública e privada, a oferta encolheu sobretudo no pré-escolar:

Deste modo e além de uma melhor articulação com o sector social e solidário, atempadamente regulado, carece-se sobretudo de aumentar a oferta no setor público.

Em súmula, um país que apesar dos passos dados (ainda) é incipiente e não é para crianças, na educação e na saúde, quando a demografia o exigiria. Aliás, ainda recentemente, o país ficaria marcado por mais dois falecimentos de bebés por constrangimentos de acesso aos serviços de saúde.   Situações que levam o bastonário da Ordem dos Médicos, a diagnosticar uma “grande desorganização” e a Federação Nacional de Médicos a falar num “ponto de rotura”.

No fundo e como sempre, navegações de cabotagem e quiçá um anátema que pesa sobre o povo lusitano, sobre o qual o general romano

Sérvio Sulpício Galba escreveria em carta dirigida ao imperador: “há na parte ocidental da Ibéria um povo muito estranho que não se governa nem se deixa governar” ... Ou, segundo outras visões, governa (estranhamente) para outros impérios ...

Provavelmente e mais tarde, voltaremos ao tema, após o pó assentar, centrados nos dados e ponto da situação do concelho vima

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